Ricardo Carreira - consultor de negócios, professor e empresário

"Pandemia ressaltou necessidade de trabalhar estratégias de logística"

Consultor de negócios Ricardo André Carreira, professor da UFMA e diretor geral da Faene, faz uma rápida análise sobre o atual cenário

Evandro Junior / O Estado MA

Atualizada em 11/10/2022 às 12h19
Consultor de negócios Ricardo André Carreira
Consultor de negócios Ricardo André Carreira (Ricardo Carreira)

SÃO LUÍS - A crise sanitária decorrente da pandemia do novo coronavírus mostrou que o Brasil tem problemas de planejamento no setor de logística, área que se revelou crucial e determinante nos últimos meses, quando a vida dos brasileiros mudou drasticamente e as empresas precisaram adotar novas posturas e estratégias para continuar a manter suas atividades. Nesta entrevista exclusiva a O Estado, o consultor de negócios Ricardo André Carreira, professor da Universidade Federal do Maranhão e diretor geral da Faculdade de Negócios Faene, faz uma rápida análise sobre o atual cenário, revelando os pontos negativos que precisam ser trabalhados.

De que maneira a crise sanitária pode contribuir para que o Brasil avance nas questões de logística?
Diante do cenário de incertezas e restrições, as organizações precisam buscar alternativas para estarem mais próximas de seus clientes. Ou seja, muitas delas, que não atuavam no sistema “delivery” ou que não participavam do comércio eletrônico, por exemplo, agora enxergam a necessidade imprescindível de encontrar alternativas visando conseguir se manter competitivas. Do contrário, correrão sérios riscos de desaparecer, mais cedo ou mais tarde. A logística acaba assumindo um papel de impulsionadora disso tudo, porque oferece essa possibilidade de se estar mais perto do cliente, sem que ele precise, necessariamente, ir até a empresa.

Quais seriam os pontos fracos do Brasil com relação a essa temática que ficaram mais evidentes nesta crise?

Nós já tínhamos problemas antes e estes ficaram mais explícitos com a pandemia do novo coronavírus. Primeiro, porque o Brasil não apresenta uma conexão logística muito eficiente. Nós usamos mal as estratégias de entrega de produtos, pois nos concentramos muito no setor rodoviário, quando poderíamos utilizar mais e de maneira mais inteligente os canais aquaviários e ferroviários, por exemplo. Afinal, nós temos uma costa extensa e maravilhosa, mas que é pouco explorada. Falta estrutura para que essa multimodalidade seja explorada com mais inteligência, para que tenhamos um ganho em agilidade, a um custo menor.

Em quais exemplos positivos mundiais o Brasil poderia se espelhar para melhorar em termos de logística daqui para frente?
Há vários países que se destacam no setor de logística, a exemplo da Alemanha, que é a primeira no ranking do Banco Mundial, e a Holanda, que vem em segundo lugar. Esses países trabalham basicamente a partir de uma divisão dos modais de transporte, ou seja, rodoviário, aquaviário, ferroviário e aeroviário, distribuídos em uma concentração evidente. Há uma integração muito forte entre esses modais e você consegue movimentar cargas, pessoas, de uma maneira muito mais rápida e eficiente, com conexões, entre outras estratégias. Há várias possibilidades e tudo é operado com planejamento contínuo.

Pode-se considerar a crise do coronavírus um divisor de águas em relação à postura das empresas nessa área?
Sem dúvida! Quem tinha alguma dúvida em relação à importância da logística, agora tem absoluta certeza de que ela é imprescindível. Uma nova era está sendo desenhada. Nada será como antes. As formas de relação, tanto pessoal quanto empresarial, mudarão sobremaneira e isto está se consolidando. Dificilmente voltaremos aos modelos anteriores. A logística, mais do que nunca, passa a ser compreendida como um mecanismo importante para se fazer essas conexões. Você consegue integrar empresas e clientes de uma maneira mais rápida, mais eficiente, com mais produtividade e reduzindo custos.


Qual seria a posição do Brasil no ranking de logística atualmente?
Conforme a última pesquisa do Banco Mundial, que leva em consideração uma série de aspectos importantes, tais como infraestrutura, a parte alfandegária, tecnologia, capacitação, entre outros pontos importantes e relevantes na hora de classificar, o Brasil subiu dez posições. O nosso país ocupava a sexagésima quinta posição e passou para a qüinquagésima quinta. No entanto, nós temos ainda um longo caminho a percorrer, pois ainda temos 54 países na nossa frente e precisamos evoluir bastante. Nosso alento é que de mais longe viemos. É preciso trabalhar com mais seriedade, capacitar mais pessoas e investir sabiamente.


O Maranhão está deixando a desejar em relação aos outros estados nesse ponto em específico durante a pandemia?
De um modo geral, o Brasil está trabalhando muito mal a sua postura em relação à pandemia. Não se trata de uma questão pontual, do Maranhão. Outros estados também estão trabalhando mal. Há falta de planejamento absoluto, contratações atabalhoadas, decisões fora do contexto ou sem qualquer tipo de avaliação efetiva. O Governo Federal está trazendo à tona decisões fora de contexto, sem qualquer tipo de avaliação efetiva. Tudo isto significa que nós, brasileiros, estamos escolhendo muito mal os nossos gestores públicos. Agora, ficou bem clara a fragilidade desses gestores, em razão do agravamento dessa situação. Nós precisamos de um gestor que nos apresente uma resposta efetiva. Lembro de uma situação, embora tenha ocorrido em outro contexto e numa proporção muito menor, que é a crise de 1929, nos Estados Unidos, quando houve a quebra da Bolsa de Valores. Naquela época, o presidente dos Estados Unidos era Franklin Delano Roosevelt e o New Deal, ou seja, suas medidas, planejamento e execuções tiveram resultados efetivos, com um retorno muito forte e rápido incremento da economia. A explicação é simples: o gestor precisa ser alguém com preparo. Embora seja difícil planejar no contexto em que vivemos, acredito que falta um pouco de capacidade técnica. Mesmo tendo condições de logística, o Brasil não a emprega de maneira correta.


Qual raio-x você faz desse momento?
Nós vivemos um cenário muito complexo e está sendo muito difícil para todos. Há um binômio muito forte de discussão entre saúde e economia. São dois eixos que acabam se integrando e é preciso encontrar alternativas para que não se mate a economia, pois já temos sinais de colapso absoluto. É um efeito cascata: em um primeiro momento, as empresas reduzem drasticamente as suas receitas. Elas buscam alternativas internas, capitais de giro, algum tipo de reserva, entre outras coisas. No entanto, à proporção que o tempo passa, as pessoas ficam mais assustadas, mesmo que não tenham perdido sua condição de trabalho, e reduzem seus gastos, por mera questão de planejamento. As empresas, por sua vez, começam a não ter de onde tirar seu sustento. É aí que começa o efeito cascata, ou seja, demissões, a falta de pagamento de fornecedores, de impostos, etc.


O que você acha do “lockdown”?
São medidas extremamente necessárias do ponto de vista da saúde, claro. No entanto, na hora que determino um isolamento absoluto, acabo impedindo as empresas de conseguirem honrar seus compromissos, inclusive com o estado. E isto acaba prejudicando também o governo. O ministro da Economia já disse que se continuar dessa maneira, o governo vai quebrar. É preciso que se faça uma avaliação mais equilibrada e estruturada, para que se consiga juntar esses dois pontos. Saúde é importante, mas é preciso entender que se não há emprego, as pessoas não têm condições de sobreviver. São reflexões que precisamos fazer. A iniciativa privada e o poder público precisam estar imbuídos de uma solução não tão drástica, mas que seja mais equilibrada. É preciso diálogo, competência e vontade.

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