Artigo

"Mortos, não, desaparecidos"

Luiz Thadeu Nunes e Silva, Engenheiro agrônomo e viajante, visitou 143 países em todos os continentes

Atualizada em 11/10/2022 às 12h19

Nos últimos dias tenho ocupado espaços dos jornais com crônicas, para me despedir e homenagear amigos e conhecidos que partiram, a maioria por causa da Covid-19, que segue célere ceifando vidas sem distinção de sexo, idade, posição social, cor da pele, conta bancária, escolaridade ou ideologia.

Ao ler a entrevista do poeta gaúcho Fabrício Carpinejar na coluna de Mônica Bergamo, na Folha de São Paulo, no último final de semana, em que ele coloca de forma objetiva algumas coisas sobre esses momentos que estamos vivendo e vivenciando nesta pandemia, são de uma clareza ímpar. Ele se refere aos 65 mil mortos, essa cifra escandalosa de óbitos, como desaparecidos, “Esses 6 5 mil mortos, pela Covid-19, não foram mortos. Foram desaparecidos. Você não iniciou o luto, não viu ele ser enterrado. Não tem a experiência visual para fechar a dor. Se você não enterra quem você ama, terá a sensação de que ele pode tocar a campainha a qualquer momento. Não tem nem a fase da aceitação pra depois negar”. Perfeito.

A morte segue firme e forte interrompendo sonhos, subtraindo vidas, destroçando futuros, dizimando famílias, sem solução à vista.

Ao ver as cenas de pessoas nas ruas, no comércio, nos bares e restaurantes, aglomeradas, como se não houvesse amanhã, como se o vírus em seu rastro de morte e destruição tivesse se cansado, batesse asas e voado, indo embora para sempre. Acho que muitos chegam a pensar, “oba escapei, tenho sorte, continuo vivo, vida que segue, vamos comemorar”. Quanto engano, o coronavírus segue a amedrontar, matar, sem dó e piedade. Ele continua nas esquinas, pronto para o bote.

Estou acompanhando o drama de duas famílias muito próximas: uma querida amiga, colega de trabalho, que está em uma UTI de um hospital particular em nossa cidade. Estavam internados ela e o marido, ele escapou e está em casa. O outro, a de um jovem, da idade dos meus filhos, na casa dos 30 anos, residente em Aracaju, filho de amigos queridos de tempo do Colégio Batista, que se contaminou trabalhando em um hospital. Uma luta árdua pela vida, cada dia com sua agonia, uma gangorra, dia melhor, outro nem tanto. Angústia e esperança se revezando.

A falta de consciência de muitos de que estamos em uma guerra desleal contra um inimigo invisível, traiçoeiro, e altamente letal dificulta seu controle, e coloca a vida de todos em perigo.

Carpinejar compara a pandemia ao mito de Sísifo. “A flexibilização [da quarentena] é a nossa pedra. A gente levanta a pedra, leva ela até o topo e ela cai de novo, aí volta o lockdown, o comércio fechado”, diz. “A gente está sempre reiniciando a quarentena. E isso é realmente um desestímulo.”

Como ainda não há vacina contra esse vírus, o distanciamento social, e os protocolos básicos, são as armas mais eficazes nesta guerra sanitária. Para todo aquele que acha incômodo usar máscara, os aparelhos respiratórios lhe esperam nos hospitais. A escolha é de cada um.

Em uma entrevista em um telejornal, um sepultador, de um cemitério em São Paulo, sem arrodeio, disse: “Vejo baladas com 50 pessoas aglomeradas, todas comemorando não sei o quê, amanhã espero todos aqui”. Cruel e verdadeiro.

A globalização não trouxe somente coisas boas, mas também a morte e o pranto. O bem mais valioso que temos é a vida, mas muitos teimam em colocar em risco a sua e a nossa.

Está provado que decreto governamental e ameaças não resolvem; a solução é tirar dinheiro do bolso através de multas pesadas. O bolso continua sendo a parte mais sensível do corpo.

Talvez corda resolva. Vai faltar corda no mercado.

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