Editorial

A incerteza do amanhã

Atualizada em 11/10/2022 às 12h20

Não deixa de ser assustadora a declaração do ex-ministro da Saúde, Luiz Henrique Mandetta - demitido pelo presidente Jair Bolsonaro no meio de um trabalho de combate ao novo coronavírus - de que o Brasil ainda está no início da parte mais difícil que vai enfrentar na luta contra a Covid-19. Em entrevista para a rede de TV CNN americana, Mandetta alertou que sua preocupação atingiu o nível máximo, 10 em uma escala de zero a 10.

Enquanto o governo não se define por uma política de medidas sérias e contundentes de combate ao vírus, deixando de lado a defesa intransigente de liberar atividades comerciais, como salões de beleza e academias de ginástica, milhares de pessoas estão morrendo todos os dias e os hospitais já sem capacidade para receber os doentes.

Mandetta disse o núcleo presidencial, que lhe destinava artilharia diária ostensiva, previa um cenário de mil mortes, mas o número atual disparou para mais de 12 mil óbitos pela Covid-19. Para ele, a história dirá “quem estava certo e quem estava errado”, referindo-se às críticas feitas pelo presidente - que se manifestou publicamente, em diversas ocasiões, contra as orientações científicas da OMS e que eram seguidas à risca pelo Ministério da Saúde, quando estava sob o seu comando.

Sem poupar detalhes da pressão que sofreu de Bolsonaro, o ex-ministro acredita que o pico da Covid-19 pode já ter sido atingido em Manaus, mas que continua a crescer em outras capitais e que no Sul do país ainda não começou. Na entrevista, Mandetta diz que a população não sabe para que lado ela vai, já que é orientada por diferentes entidades políticas no país - leia-se presidente Jair Bolsonaro, que não aceita contradições.

Mandetta se manifesta também contrário às críticas, por meio de redes sociais, que vem sendo desferidas contra a China pelo chanceler Ernesto Araújo, pelos filhos do presidente e deputados aliados ao governo. Ele acha que o momento não é de briga, pois as relações ficam difíceis e refletem, até mesmo, na compra de materiais de saúde destinados ao combate do coronavírus.

Para ele, o Brasil já "paga o preço" de um comportamento agressivo contra Pequim. "Cadê as máscaras? Estamos perdendo enfermeiros", disse. "Respiradores não chegam", lamentou. Mandetta também deixou claro que a atual estrutura da OMS não permite à entidade ter os instrumentos necessários para lidar com crises como a atual. Segundo ele, a pandemia do coronavírus pode ser determinante para o futuro da instituição.

Tentando tapar o sol com a peneira, ontem, 14, o presidente Bolsonaro editou Medida Provisória que livra qualquer agente público de processos civis ou administrativos por erros relacionados à pandemia provocada pelo novo coronavírus. O texto estabelece que as autoridades só poderão ser responsabilizadas se ficar comprovado o dolo (ação intencional) ou "erro grosseiro". A MP estabelece que o chamado "erro grosseiro" só estará configurado levando-se em conta cinco variáveis que, na prática, tornariam muito restritivo o enquadramento de autoridade por essa conduta.

Segundo o texto publicado ontem no Diário Oficial, para avaliar se houve erro, devem ser considerados "os obstáculos e as dificuldades reais do agente público; a complexidade da matéria e das atribuições exercidas pelo agente público; a circunstância de incompletude de informações na situação de urgência ou emergência; as circunstâncias práticas que houverem imposto, limitado ou condicionado a ação ou a omissão do agente público; e o contexto de incerteza acerca das medidas mais adequadas para enfrentamento da pandemia da Covid-19.”

Ainda de acordo com o texto, mesmo que haja comprovação de que o ato do agente público causou algum dano não seria suficiente para que ele seja responsabilidade administrativa e civilmente. No caso de processos administrativos, a punição poderia ser até a perda do cargo público para servidores de carreira ou em cargo de confiança. Na esfera civil, os agentes públicos poderiam ser obrigados a ressarcir o erário pelos danos causados.


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