Editorial

O bate-cabeça do governo federal

Atualizada em 11/10/2022 às 12h20

Enquanto o presidente Jair Bolsonaro bate-cabeça com o ministro da Saúde, Nelson Teich - de quem cobra “afinidade” para que determine o uso do medicamento cloroquina no tratamento da Covid-19 -, o Brasil caminha para chegar, infelizmente, na segunda posição entre os países com o maior número de casos confirmados e óbitos da doença, atrás apenas dos Estados Unidos.

O alerta do presidente do comitê científico da Sociedade Brasileira de Imunologia, João Viola, é preocupante ao tomar como base a subnotificação, que, segundo ele, esconde o atual panorama do país, ou seja, diversas estatísticas mostram que o número de casos é dez a 15 vezes maior do que as ocorrências confirmadas até agora.

Portanto, mais de um milhão de brasileiros já contraíram o vírus. Oitenta por cento não demonstram sintomas, mas podem infectar outras pessoas. Segundo Viola, apenas 40 a 50% da população do país têm respeitado o isolamento social. O ideal seria que esse percentual fosse de, no mínimo, 70%. Ele acredita que se a população respeitar as medidas, o Brasil chegará ao pico de casos em até dez dias. E, 30 ou 40 dias depois, poderão começar a serem discutidas medidas de flexibilização para circulação de pessoas.

O que sido constatado nos últimos dias, conforme números do Ministério da Saúde, é que a epidemia segue em plena velocidade no país, principalmente no Rio e em São Paulo - cidades com maior intercâmbio populacional. Já a população de outros estados tem ensaiado um movimento precipitado para deixar o isolamento social. O setor econômico pressiona, e os gestores estão cedendo à reabertura do comércio em locais que não estão preparados para o fim do distanciamento social. Então, a epidemia ainda está caminhando para o pior.

No entendimento da virologista Giliane de Souza Trindade, se o Brasil continuar a disseminação da doença, vai ultrapassar, em número de casos, os países que tomaram providências tardias contra o coronavírus, como Itália e França. Isso prova que no caso brasileiro falta uma liderança no governo federal que se manifeste sobre a Covid-19. Até o momento, o ministro Teich não divulgou diretrizes que o país deve adotar.

O que se sabe nesta semana é que o Ministério da Saúde identificou 39 casos suspeitos que teriam surgido no Brasil antes do dia 26 de fevereiro, quando foi confirmada a primeira ocorrência no país: um homem de 61 anos, diagnosticado em São Paulo. O ministério enviou ofícios aos estados para investigar esses casos. Esta é a segunda vez que o governo federal admite que a Covid-19 pode ter chegado ao Brasil antes do divulgado.

Ainda sobre o uso da cloroquina, defendido amplamente pelo presidente Bolsonaro, o próprio ministro Teich já alertou sobre os riscos no tratamento com a Covid-19. Ele escreveu em sua conta no Twitter na terça-feira, 12, que o remédio apresenta efeitos colaterais e que a prescrição deve ser feita em comum acordo entre paciente e médico. Um dos principais efeitos colaterais do remédio são complicações cardíacas. Pelo visto, Bolsonaro aposta no tudo ou nada.

Um alerta importante: a cloroquina é um medicamento com efeitos colaterais. Então, qualquer prescrição deve ser feita com base em avaliação médica. O paciente deve entender os riscos e assinar o “Termo de Consentimento” antes de iniciar o uso da cloroquina, segundo o ministro. O remédio é usado comumente para tratamento de malária.

Ainda não há evidências científicas comprovadas que apontem a eficácia em casos de infecções por coronavírus. Duas pesquisas internacionais realizadas com mais de 1.300 pacientes mostraram que a cloroquina e a hidroxicloroquina não são eficientes. Um estudo dos EUA revelou que a taxa de mortalidade dos tratados com cloroquina foi semelhante à dos que não tomaram a droga, assim como à das pessoas que receberam hidroxicloroquina combinada com o antibiótico azitromicina - este segundo grupo, ainda, teve duas vezes mais risco de sofrer parada cardíaca. Outro estudo americano concluiu que pacientes com e sem o tratamento com hidroxicloroquina apresentaram o mesmo risco de uma piora do quadro, de necessidade de entubação e de morte.

A cloroquina ganhou projeção como possível solução para o coronavírus após a publicação de um estudo na França, em meados de março. Mas pesquisadores criticaram a metodologia e também o grupo reduzido de pacientes.

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