Artigo

O Homo Deus envergonhado

Lourival Serejo, Desembargador e membro da Academia Maranhense de Letras

Atualizada em 11/10/2022 às 12h20

De tanto se falar em distopia, nos últimos anos, acabamos atirados numa aldeia global distópica, perplexos como tudo aconteceu tão rápido e ameaçador.

Para os fundamentalistas cristãos, a propagação do coronavírus é um prato cheio para chicotearem os “pecadores” com alusões de que tudo isso é um castigo de Deus pela devassidão do mundo atual.

Entretanto, desconfio que o choque que a humanidade tomou com o Covid -19 serviu para alertar o pretensioso Homo Deus de que ele ainda não é tão sábio e poderoso como se imagina. A ideia divulgada por Yuval Harari de que o homem não precisa mais de Deus porque todos os milagres antigos, atribuídos às divindades, são feitos hoje pela ciência, inclusive com a perspectiva de uma longevidade para muito além dos cem anos, foi contestada agora pelo coronavírus. Com apoio na situação presente, pode-se avaliar que a humanidade está passível de ser dizimada por vírus desconhecidos a qualquer momento, não obstante a arrogância dos cientistas.

Pelos jornais, já li vários comentários e crônicas sobre o momento em que estamos vivendo invocando a similitude com o romance de Albert Camus, A peste. Realmente, não há como negar essa comparação que o gênio do escritor francês soube descrever tão bem. A leitura dessa romance, escrito em 1947, nos coloca em Oran, na Argélia, a cidade possuída pela peste, na descrição do autor, e tudo nos parece igual ao que estamos experimentando.

No meio daquele estado de absurdo, tão bem ao gênero de Camus, desponta o médico Bernard Rieux como personagem principal (autor da história), cuja dedicação exclusiva aos pacientes é a personificação da vocação médica. Aliás, tanto no Brasil como no mundo inteiro, essa pandemia tem nos mostrado a importância do médico em nossas vidas. É um profissional em quem depositamos toda a nossa esperança, em momentos de aflição.

Lembrei-me, também, do romance Ensaio sobre a cegueira, de José Saramago, em que relata o drama de uma cidade tomada pela cegueira. Esse estado anormal das coisas obriga as pessoas a viverem solidariamente, unidas pelo mesmo mal.

As cenas retratadas nas ruas da Espanha e da Itália, com soldados nas ruas, impedindo as pessoas de saírem de casa são típicas de uma distopia.

As mais diversas discussões têm surgido, na tentativa de compreender o Covid-19 e analisar suas conseqüências. Até Darwin já foi invocado para lembrar a teoria da seleção natural. Lembrei-me também de Malthus, quando estudei Economia Política.

Dentre esses debates, surge a questão da economia. Vale a pena parar a economia em detrimento da vida? Para alguns, sem economia sadia surgirá o caos e a fome. Para outros, sem vida não adianta uma economia forte.

De nada vale essas discussões diante do inimigo que nos ameaça. A postura mais sensata é a união de todos em defesa da vida – inclusive da aldeia global – para, juntos, vencer essa ameaça que espalha o medo e a morte por onde passa.

No mais, é não perdermos a esperança de que essa pandemia passará e a vida continuará seu fluxo normal.

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