Coronavírus

O que pensar? Como se comportar em uma "cidade fantasma"?

Nesta semana, devido ao perigo de contágio, o governo recomendou o isolamento social preventivo, para que as pessoas fiquem "em casa"

Thiago Bastos / O Estado

Atualizada em 11/10/2022 às 12h20

[e-s001]Se por um lado, o pensamento popular determina que “o futuro a Deus pertence”, por outro, para os mais céticos, o destino dos próximos dias da população mundial está atrelada ao desenvolvimento das pesquisas e novo cenário a ser desenhado no mercado, com os efeitos negativos do coronavírus na saúde das pessoas e no andamento social. Por ora, nossa rotina futura ainda é incerta e a falta de convicção sobre o que acontecerá na população mundial aflige, cria “pesadelos” e torna-se mais um obstáculo diante desta crise de proporções únicas no atual século.

Enquanto o inimigo ainda é desconhecido por sua complexidade, a cidade tenta se ajustar aos métodos e medidas adotadas em outros territórios mundiais. A capital maranhense, em pleno meio de semana e em uma data útil qualquer nos contemplaria com a imagem de uma metrópole, com cidadãos no corre-corre incessante por ruas e avenidas, gerando recursos e mantendo a rotina de todos. Nesta semana, devido ao isolamento social sugerido pelas autoridades públicas causadas pela pandemia de Covid-19 em outras partes do mundo, São Luís – de forma preventiva – decidiu recomendar que as pessoas ficassem “em casa”.

Por isso, o que se observava durante a primeira semana cheia de reclusão das pessoas em casa na capital maranhense era um emaranhado viário sem qualquer circulação de transeuntes ou veículos. A referência “pelos azulejos” e casarões fora transformada em uma “verdadeira cidade fantasma” e, para evitar a circulação social, o poder público – ainda que na contramão dos termos sugeridos pelo Governo Federal – decidiu manter as medidas restritivas e, com a proibição da abertura de estabelecimentos comerciais, limitou a passagem de pessoas por ruas e avenidas.

Além de vias e praças, o Centro também sentiu os efeitos da restrição social. Clientes sumiram das lojas e moradores desta região da cidade precisaram modificar suas rotinas de forma imediata. Nem mesmo os tradicionais vendedores ambulantes, tão comuns no dia a dia, apareceram para revender os seus produtos.

Na Via Expressa, um dos acessos mais movimentados da cidade, no sentido Vinhais/São Francisco, foi registrado em uma tarde de dia comum um fluxo médio de pouco mais de cinco carros por minuto. Em dias “normais”, este dado costuma ser, pelo menos, vinte vezes maior.

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Impactos do isolamento social nos moradores de São Luís

Na Rua do Sol, outro ponto de grande concentração comercial na cidade, praticamente nenhum transeunte fora visto em pouco mais de uma hora de permanência da equipe de reportagem de O Estado no local durante a semana. Apenas alguns responsáveis pelas lojas fixadas no trecho aproveitaram para renovar seus estoques, em período de baixa “forçada” de clientes.

A mesma cena se observou no Complexo Deodoro, outro ponto de intensa concentração popular. Em uma quinta-feira, devido à “quarentena” - termo mais comum ao que se denomina formalmente de isolamento social – a área de uso único em frente a Biblioteca Pública Benedito Leite não observou pedestres. Uma cena somente possível a partir do “rigor” das medidas necessárias do governo estadual.

Na Rua de Santana – via histórica e referência para reportagem especial publicada por O Estado em julho de 2018 – lojas fechadas (por tempo indeterminado) com a obediência de comerciantes e clientes para as medidas de reclusão social determinadas pelas autoridades públicas. São registros marcantes e que serão lembrados, por décadas, na história da cidade.

[e-s001]Impactos ainda imensuráveis
Mas o registro de “cidade fantasma” mais marcante foi feito na Rua Portugal. Com seu acervo arquitetônico e registro de ateliês, lojas de artesanato e serviços públicos, a imagem visível apenas de pombos se alimentando dos restos de comida e migalhas no chão de paralelepípedos é de um impacto para quem se acostumou a perceber o acesso histórico como polo atrativo de inúmeros turistas por dia.

Até o momento, o Governo do Maranhão – questionado por O Estado – informa por meio da Secretaria Estadual de Fazenda (Sefaz) que ainda “não é possível avaliar”, com precisão, o real impacto da crise provocada pela pandemia no estado e nas finanças. A pasta estadual não especificou os prejuízos para o setor específico do turismo.

Nenhum comerciante fora observado para falar sobre o tema. Com base em decreto governamental, apenas serviços considerados essenciais (como farmácias e supermercados, por exemplo) estão autorizados a funcionar na capital maranhense e em outros municípios do estado.

Estresse e ansiedade
Estudos apontam que, além da potencialização de distúrbios psicológicos, como estresse e mesmo depressão, o distanciamento social por um período superior a 10 dias pode alterar radicalmente funções vitais para as pessoas. Em alguns casos, o risco é de ativação de substâncias que, porventura, gerem situações de estresse e ansiedade.

Um destes hormônios é o cortisol, presente em situações de medo. “Neste momento, o cérebro humano ativa um sentimento que é similar ao de estar em uma guerra”, disse a psicóloga Norma Bittencourt. Controlar o tempo e não se deixar levar pelas angústias e, principalmente, pela indefinição de um mundo que não sabe onde ele mesmo vai parar é um desafio para o público em geral. O obstáculo maior é viver de uma maneira, sem ter minimamente se preparado para isso. Ludovicenses contam um pouco sobre como estão passando por estes dias.

Como vivem os que são “obrigados” a se isolar
Dados oficiais do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) apontam uma estimativa de que a capital maranhense registra até 1,5 milhão de pessoas em seu território. Em sua maioria, desconsiderando os trabalhadores de serviços considerados essenciais (saúde, transporte e segurança pública), além de profissionais da imprensa e outras categorias estão reclusos sem saber quando sairão de “suas prisões”.

Como em toda sociedade democrática, há sempre os chamados “fujões”, ou seja, aqueles que perambulam pela cidade vazia, ignorando as recomendações sanitárias e lidam com a situação como se nada estivesse acontecendo. Nos últimos dias, O Estado observou que este público é minoria.

Considerando, portanto, uma massa populacional de quase 1 milhão de pessoas dentro de suas casas, sem movimentar a economia e sem aquecer o cotidiano de uma cidade mais crescente, pessoas tiveram que se “acostumar” com uma nova rotina. Entre os adeptos do home office, há os trabalhadores públicos e, principalmente, os aposentados que reclamam da ausência de liberdade e da impossibilidade do “ir e vir”.

Dentre estas pessoas, está Janira Barros, de 80 anos. Moradora da região central da capital maranhense há mais de 50 anos, todas as tardes, ela se debruça de forma bucólica sob uma das janelas de sua residência com fachada e pintura tradicionais da Rua de São Pantaleão, no Centro.

Ainda que acredite na resolução pandêmica da situação, dona Janira sempre se previne: qualquer aparição na rua (ou mesmo na janela que seja) somente com máscara. “Vai que a gente pega esse negócio, não é?”, resumiu.
À distância, O Estado conversou mais com a aposentada. Ela revelou que, apesar da idade, costumava ter uma vida social ativa. “Sempre que podia, dava uma passada no Centro para fazer as minhas compras. Atualmente, não posso mais”, disse.
Isolada até dos familiares

O cuidado é redobrado com a aposentada, enquadrada no chamado grupo de risco de Covid-19. Além de evitar contato externo, a moradora revelou que tem evitado contato com os familiares. “Opto por ligar ou mesmo mandar mensagem. Mas tem hora que é difícil, bate a saudade”, afirmou.

A distância é necessária, pois qualquer contato com a doença pode vir a ser fatal. Ela, ciente disso, fez recomendação aos familiares. “Que a gente se reúna depois que isso acabar. Por enquanto, é melhor não”, disse a aposentada.

[e-s001]Distância familiar é adotada
A auxiliar de serviços gerais, Maria Francilma Silva, moradora do bairro Alemanha, em São Luís, teve que abrir mão, dos últimos dias, da presença dos filhos e outros familiares. Com receio de infeccioná-los, ela evita qualquer contato mais afetivo com as crianças. “Infelizmente é assim que precisamos fazer para proteger nossa família”, alertou.
Até para sair de casa, a profissional usa as máscaras. E quando retorna, faz uso do álcool gel e outros itens. “Não abro mão do bom sabão com água. Eu já vi na televisão que é a melhor forma de prevenção. E deve ser mesmo”, afirmou.

ABRINDO O JOGO

“O distanciamento pode causar elevações no nível de estresse”, diz psicóloga

A O Estado, Norma Bittencourt, psicóloga e profissional da área da saúde da rede pública municipal - (Psicóloga da equipe do Hospital da Mulher, da Unidade Mista Itaqui-Bacanga e do Centro de Saúde Mental Clodomir Pinheiro Costa)- , fez sua análise acerca dos impactos na parte mental das pessoas, com o confinamento forçado diante de Covid-19. Para ela, certos distanciamentos, dependendo do nível e formação das pessoas, podem causar elevações exorbitantes nos níveis de estresse. Alguns destes picos podem trazer sequelas permanentes.

Por que esse período pode ser tão nocivo às pessoas, no que diz respeito aos aspectos psicológicos?
A necessidade de confinamento é terrível para nós, e se torna inevitável nos sentirmos inquietos, irritados, pela permanência excessiva dentro de casa. Os idosos que se mantém em casa, também apresentam ou ainda apresentaram esses mesmos comportamentos devido ao envelhecimento e/ou doença. Para eles também, e para aqueles ainda ativos, que ainda trabalha, a situação é terrível.

O que pode vir a ser desencadeado neste período, em termos de problemas psicológicos?
Nesses casos de confinamento, há uma clara reação nas emoções, levando a pessoa a não agir e até a não se comportar racionalmente. O medo irracional que acomete as pessoas é algo muito danoso, precisamos ter cuidado com isso. Até porque o tédio, o “nada a fazer”, provoca um vazio que se inicia em nós, e aí as compulsões se apresentam nessa situação que estamos vivendo.

E quanto ao estresse? Por quais razões se torna comum nestes períodos atípicos?
Devido ao fato das pessoas, ao contrário de outras épocas, não poderem se deslocar livremente pela sua cidade. Isso causa uma sensação, em especial para as pessoas mais frágeis, de total aprisionamento. O estresse em demasia pode levar a desencadear sintomas e quadros mais severos, como ansiedade e a terrível depressão.

O que fazer para minimizar essas possibilidades, em um contexto único na história da humanidade neste século?
É fundamental tentarmos manter a calma, buscando uma renovação interna, com uma implementação de uma nova rotina, que nos poderá proporcionar mais segurança e daqueles com que convivemos, nossa família. As sugestões para driblar o tédio e mesmice são usar aplicativos que possam nos acrescentar utilidade, fazer pesquisas online, e obviamente estimular o contato telefônico, por chamada de vídeo, além de aproveitar para fazer cursos online.

E quando passará o efeito do contágio, o que restará a fazer?
Sabemos que essa epidemia vai passar, daqui a aproximadamente seis meses, mas até lá temos que recorrer a estratégias. A aprendizagem que essa situação nos impõe nos leva a concluir que somente após essa avalanche passar, teremos noção destas consequências a todos.

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