Ciência

A geometria fractal

Neste artigo, faremos uma descrição das Geometrias Fractais (do latim fractus = fracção, quebrado), que são formas em que as partes são semelhantes ao todo

Antonio José Silva Oliveira, físico, doutor em Física Atômica e Molecular, pós-doutor em Jornalismo Científico. Professor da UFMA

- Atualizada em 11/10/2022 às 12h21
Geometria Fractal gerada por meio de um movimento de um caleidoscópio
Geometria Fractal gerada por meio de um movimento de um caleidoscópio

Fractais são formas complexas que não podem ser medidas apenas por dimensão topológica. A dimensão fractal surge então como uma alternativa de medição já que pode assumir valores fracionários, obtendo assim o grau de complexidade de uma forma. Pode-se afirmar que a dimensão fractal de um conjunto é um valor que informa quão densamente um conjunto ocupa o espaço métrico em que ele existe.

A geometria fractal é o ramo da matemática que estuda as propriedades e o comportamento dos fractais. Descreve muitas situações que não podem ser explicadas facilmente pela geometria clássica, e foram aplicadas em ciência, tecnologia e arte gerada por computador. As raízes conceituais dos fractais remontam as tentativas de medir o tamanho de objetos para os quais as definições tradicionais baseadas na geometria euclidiana falham

Em geral, a dimensão de uma figura geométrica euclidiana é dada por um número inteiro, como por exemplo: uma linha reta tem dimensão igual a 1; um plano, dimensão igual a 2; e um sólido, dimensão 3. A geometria euclidiana levou a humanidade a perceber que existiam muitas regularidades na natureza, e que essas regularidades poderiam ser entendidas e descritas por modelos matemáticos. No século XVII, as contribuições de Newton no desenvolvimento do cálculo diferencial e integral, as suas três leis do movimento e a dedução da lei universal gravitacional fortaleceram a ideia de que o universo era composto por sistemas bem-organizados. As grandes descobertas na astronomia, como a previsão do retorno do cometa Halley, feito em 1682 por Edmund Halley, influíram para a consolidação da concepção determinística.

No inicio do século XIX, a ciência já tinha feito tantos avanços que um trecho escrito por Pierre Simon Laplace mostra a crença na previsão da ciência naquela época. “Uma inteligência que, para um instante dado, conhecesse todas as forças que animam a natureza, e a situação respectiva dos seres que a compõem, e, além disso, essa inteligência fosse ampla o suficiente para submeter esses dados à análise, ela seria capaz de condensar numa única fórmula o movimento dos maiores corpos do universo e o do menor dos átomos: nada seria incerto para ela, e tanto o futuro como o passado estariam presentes aos seus olhos”.

Acreditava-se que os fenômenos da natureza eram regidos por fórmulas e leis imutáveis, ou seja, conhecendo-se as condições iniciais de um sistema, todo o sistema estaria bem-determinado. Seria possível fazer previsões em longo prazo.

No começo do século XX, o desenvolvimento da mecânica quântica mostrou que seria impossível medir grandezas com precisão infinita. Essas medidas imprecisas, quando tomadas como condições iniciais para certos sistemas de equações não lineares, poderiam gerar grandes erros em longo prazo.

Benoit Mandelbrot, matemático que, em 1975, criou a teoria dos fractais, mostrou ser a geometria fractal, por conta de suas características — extensão infinita dos limites, permeabilidade dos limites, autossimilaridade das formas e das características —, que reflete a geometria dos objetos e da configuração dos processos do mundo real. Mandelbrot insiste e mostra que é a geometria fractal, e não a geometria clássica euclidiana, a que realmente reflete a geometria dos objetos e dos processos do mundo real.

Um fractal é um objeto geométrico que pode ser dividido em partes, cada uma das quais semelhantes ao objeto original. Diz-se que os fractais têm infinitos detalhes, são geralmente autossimilares e de escalas iguais. Em muitos casos, um fractal pode ser gerado por um padrão repetido, tipicamente um processo recorrente ou iterativo.

A extensa Costa Norte Brasileira, que abrange desde o extremo setentrional do Estado do Amapá até São Luís do Maranhão, apresenta diferentes tipos de ambientes, como várzeas, campos, planaltos costeiros e manguezais, abrangendo três macrossistema: “Litoral do Amapá” (LA), “Golfão Amazônico” (GA) e “Litoral das Reentrâncias Pará-Maranhão” (PM). Tal fato sugere a existência de diferentes configurações para o limite entre terra e água, que podem ser caracterizadas por meio da geometria fractal para indicar a complexidade da linha de costa onde ocorrem os manguezais, assim como os níveis de energia a ela associados.

As fractais estão ligados a áreas da Física Estatística e são chamados de Sistemas Dinâmicos e Teoria do Caos. Suas equações são usadas para descrever fenômenos que, apesar de parecerem aleatórios, obedecem a certas regras, em especial, a de repetição.

Reentrância Maranhense, que tem um comportamento de uma geometria fractal
Reentrância Maranhense, que tem um comportamento de uma geometria fractal


Para exemplificar, tomemos um ramo de uma folha da família das samambaias. Observamos um padrão de repetição após o tronco principal que se ramifica obedecendo ao inicial. E cada folhinha desses dois elementos vai ser uma cópia de todo o tronco.

Isso significa que os padrões da figura inteira são repetidos em cada parte, só que numa escala de tamanho menor. Os flocos de neve são exemplos de fractais: cada ramo do floco parece com o floco inteiro. É como se cada ramificação do ramo, por menor que seja, gerasse um padrão de interferência, como ocorre em um holograma.

Ramo de uma folha da família das samambaias
Ramo de uma folha da família das samambaias
Flocos de Neve
Flocos de Neve

É como se você examinasse uma pessoa, inicialmente no todo e depois examinasse uma célula. Examinando com cuidado e detalhe, veremos lá a cor dos olhos; veremos se o cabelo é louro, se é preto, se é enrolado ou estirado. Veremos lá uma característica que o nosso avô teve, que não se manifestou em nós, mas vai se manifestar no nosso neto. Uma célula tem a nossa história, a história dos nossos ascendentes e dos nossos descendentes.

Se você for observar outros recursos da geometria, também perceberá o traço do elemento fractal. É o caso de um triângulo. Quando você o divide em triângulos menores, logo terá figurinhas semelhantes ao original.

Triângulo equilátero quando dividido em triângulos menores
Triângulo equilátero quando dividido em triângulos menores

Um grande uso do fractal, dentro da medicina, está relacionado aos pulmões e neurônios. As estruturas dos pulmões e todo o processo de ramificação dos neurônios estão relacionados às repetições das partes gerais.

Geometria Fractal em um pulmão humano
Geometria Fractal em um pulmão humano

Com essa formatação, os estudiosos da medicina conquistaram importantes benefícios. Quando eles estudaram os fractais, puderam agir na prevenção de várias doenças, como, por exemplo, o câncer. O objetivo é combater a evolução desse mal, com base em diagnósticos mais precoces.
Uma maneira inovadora de obtermos fractais geométricos são por meio de espelhos de bases caleidoscópicas, o que enseja um grande estudo sobre espelhos e caleidoscópios e traz em si a oportunidade de se estudarem muitos conceitos geométricos (reflexão, simetrias, transformações geométricas, bissetriz, mediatriz, sequências).

Concluímos este artigo com um pensamento de Mandelbrot sobre seus estudos de geometria fractal:

Nuvens não são esferas, montanhas não são cones, continentes não são círculos, o som do latido não é contínuo, e nem o raio viaja em linha reta” (Benoît Mandelbrot, em seu livro "The Fractal Geometry of Nature", 1983)

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