Artigo

A nova Lei de Abuso de Autoridade

Atualizada em 11/10/2022 às 12h21

Sancionada pelo presidente da República, a Lei nº 13.869, de 5 de setembro de 2019, gerou algumas especulações quanto a eventuais excessos em seu texto a propósito de inibir atuação de autoridades no exercício de suas funções à persecução penal, notadamente quanto à atuação da Policia, do Ministério Público e do Judiciário

Não é desarrazoada discussão dessa natureza diante da repercussão que normalmente provocam leis desse nível. Todavia parece ter havido alguns exageros interpretativos daqueles que logo na primeira hora taxaram a lei ou de inconstitucional, ou de ofensiva ao regular exercício das funções dos integrantes das instituições acima. Até porque grande parte dos seus regramentos já constavam da lei anterior e o seu texto encontra-se em total consonância com a Constituição Federal.

De fato, quando diz a lei que é crime prender ou decretar a prisão de alguém sem qualquer previsão legal para tais atos, ou deixar de relaxar uma prisão manifestamente ilegal como diz o Parágrafo Único, inciso I, do artigo 9º da citada lei, para prejudicar alguém, inclusive para benefício próprio ou de terceiro ou por mero capricho, como define o § 1º do artigo 1º, também da referida lei, evidente que trata-se de prática criminosa.

Assim, não me aprece ter andado mal o legislador ao fazer, na verdade, alguns detalhamentos na referida lei. É claro, inserindo algumas poucas inovações não tão boas, e que no meu entendimento seria oportuno alguma reflexão e, no futuro, uma melhor adequação, mas que, contudo, não comprometem o espírito da nova lei.

Refiro-me a dois pontos que mais me chamaram atenção. No caso os incisos II e III do Parágrafo único do artigo 9º, e o parágrafo único do artigo 19, da lei. Nestes dispositivos vem constando imposição a que o magistrado em prazo razoável substitua a prisão preventiva por outra medida cautelar ou que conceda liberdade provisoria ao preso, ou ainda que conceda liminar em habeas corpus, quando manifestamente cabível, sob pena de ser responsabilizado penalmente. Consta ainda nesses dispositivos que será o magistrado responsabilizado penalmente caso não tome medidas para sanar a demora na tramitação de pleito de pessoa presa nos setores de custódia, inclusive deixando de encaminhar ao juízo competente, caso não o seja.

Acontece que tanto a análise do tempo quanto da conveniência dessa substituição ou liberação, não decorrem de análise apenas objetiva e facilmente mensurável. A esse prazo razoável pode-se dar várias interpretações. Devendo se considerar, contudo, que os prazos razoáveis em matéria processual nunca é o mesmo prazo razoável ao senso comum e a quem não leva em consideração ou desconhece os meandros das inúmeras injunções burocráticas na tramitação processual forense.

Por outro lado, os dispositivos agridem e desconhecem totalmente o que se chama de livre convencimento do juiz. Com essas obrigações impostas para tal substituição ou concessão de liberdade, apenas sob o pálio de ser manifestamente cabível, esquece-se que para o paciente essas alternativas sempre são manifestamente cabíveis. Já com referência a atrasos na tramitação de autos em setores de custódia de preso, o difícil será identificar se o juiz tem ou não ciência dessa ou daquela eventual desídia, que não seja sua.

No mais, entendo salutar a lei, já que poderá prevenir, de fato, alguns excessos que temos assistido, a exemplo de decretação ou manutenção de prisões prematuras e desnecessárias, tanto quanto o lançamento de ordens de constrição de bens além do necessário. É preciso também que se respeito ao devido processo legal e a presunção da não culpabilidade, especialmente esta última, que ainda se encontra em vigor na nossa Constituição.

Tyrone Silva

Desembargador do Tribunal de Justiça do Maranhão

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