Tensão

Maranhão poderá receber Força Nacional após mortes de dois índios em BR

Ministério da Justiça estuda o envio da tropa após o ataque que vitimou os caciques Firmino Silvino Guajajara e Raimundo Bernice Guajajara

Nelson Melo / O Estado

- Atualizada em 11/10/2022 às 12h22
Raimundo Guajajara foi um dos índios mortos no ataque ao território indígena na BR-226
Raimundo Guajajara foi um dos índios mortos no ataque ao território indígena na BR-226 (Indígena atacado)

O clima continua tenso na região de Jenipapo dos Vieiras, após a morte de dois índios no último sábado, 7, entre as aldeias Boa Vista e El Betel, às margens da BR-226. Morreram no ataque os caciques Firmino Silvino Guajajara e Raimundo Bernice Guajajara. A Polícia Federal (PF) assumiu as investigações. O Ministério da Justiça e Segurança Pública está estudando a possibilidade de enviar a Força Nacional de Segurança Pública (FNSP) à região. O atentado aconteceu pouco mais de um mês depois de um confronto que deixou um indígena e um madeireiro mortos em Bom Jesus das Selvas.

Em suas redes sociais, o ministro da Justiça e Segurança Pública, Sérgio Moro, anunciou que já enviou à reserva indígena uma equipe da PF, que investigará o crime, para elucidá-lo e identificar os autores do ataque. "Lamento o atentado, ocorrido hoje no Maranhão, que terminou com dois índios guajajaras mortos e outros feridos. Assim que soube dos tiros, a Funai foi até a aldeia tomar providências, junto com as autoridades do governo do Maranhão. A Polícia Federal já enviou uma equipe ao local e irá investigar o crime e a sua motivação”, disse ele.

Além disso, o ministro frisou que vai analisar a viabilidade do envio de equipe da Força Nacional à região, que continua sob tensão. Juntamente com a PF, também estão em Jenipapo dos Vieiras efetivos das polícias Civil e Militar, bem como agentes da Fundação Nacional do Índio (Funai).

O ataque

De acordo com a Funai, os índios estavam às margens da BR-226, logo depois de saírem da Aldeia Coquinho, onde lideranças indígenas participaram de uma reunião com representantes da Eletronorte, por volta das 12h30. O grupo tratou da compensação aos índios pela passagem do linhão de energia elétrica dentro dos territórios indígenas. Firmino Silvino Guajajara morreu no local. Já Raimundo Bernice Guajajara morreu ao chegar à Unidade de Pronto Atendimento (UPA) de Jenipapo dos Vieiras.

Em um vídeo que circula nas redes sociais, um indígena identificado como “Nelsi” contou que foi surpreendido por um veículo de cor branca, cujo ocupante disparou diversas vezes contra a motocicleta onde ele e Firmino Guajajara estavam. Outros dois índios foram atingidos pelos disparos e continuam internados na UPA sob proteção policial. A Secretaria dos Direitos Humanos e Participação Popular do Maranhão (SEDIHPOP) comunicou que uma das vítimas está com hemorragia interna, aguardando um representante da família para seguir a transferência para o Hospital Municipal de Presidente Dutra.

Um dos índios foi atingido em uma das pernas. A motivação para o ataque continua desconhecida. No entanto, a Funai não descarta que o atentado possa ter relação com os assaltos que acontecem naquela região, na extensão da BR-226.

Interdição da rodovia

Em resposta ao atentado, os índios interditaram três pontos da BR-226, na tarde de sábado, entre os municípios de Barra do Corda e Grajaú, dentro do perímetro da Reserva Indígena Guajajara. Durante os protestos, ao menos dois caminhões foram tomados de assalto e colocados atravessados na rodovia, de acordo com informações divulgadas pela Polícia Rodoviária Federal (PRF).

Os habitantes das aldeias também bloquearam os trechos com galhos de árvores, para impedir o tráfego de veículos. “As cargas dos dois caminhões foram saqueadas. Uma fila de aproximadamente um quilômetro e meio se formou para cada lado. Equipes da PRF e da Polícia Militar encontram-se no local, mas não estimaram o horário de liberação da rodovia, uma vez que a concentração de índios é grande, vindos das aldeias vizinhas”, comunicaram os inspetores.

Os trechos interditados só foram liberados na tarde de domingo, 8, por volta das 16h30, como a PRF informou.

Confronto anterior

No dia 1º de novembro deste ano, ocorreu a morte do líder indígena Paulo Paulino Guajajara, conhecido como “Lobo Mau”, em uma emboscada na Terra Indígena Arariboia, em Bom Jesus das Selvas. Ele era membro dos “Guardiões da Floresta”, grupo que faz a vigilância dentro da vegetação por contra própria. No confronto, também morreu o madeireiro Márcio Greykue Moreira Pereira. O primo de Paulo, Laércio Guajajara, saiu ferido do combate.

Os índios daquela região já haviam denunciado as ameaças de madeireiros, que se intensificaram após a apreensão de veículos utilizados na extração ilegal de madeira dentro do território das aldeias.

Operações nas aldeias

Neste ano, a Polícia Federal, o Exército e outros órgãos realizaram várias operações em aldeias do Maranhão. Em outubro, durante quatro dias, ocorreu uma incursão na Terra Indígena Awá, dentro do município de Zé Doca, nas proximidades da divisa entre Maranhão e Pará. As equipes estiveram no local para combater a prática de crimes ambientais, como desmatamento (retirada de madeira) e as queimadas, bem como ameaças aos índios.

A ação aconteceu dentro do contexto da “Operação Verde Brasil”, que foi deflagrada pelo 24º Batalhão de Infantaria de Selva (24º BIS) desde agosto para proteger a Amazônia Legal das queimadas. As equipes visitaram toda a extensão da terra indígena e conversaram com os índios. Eles relataram que estão sofrendo ameaças de posseiros, que pretendem se restabelecer no local. Fazendeiros ocupavam ilegalmente aquelas terras, mas foram retirados em 2014.

Além do Exército e da PF, participaram da operação equipes da Fundação Nacional do Índio e do Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e Recursos Naturais Renováveis (Ibama).

Denúncias de ameaças

Em janeiro deste ano, a Funai informou à PF sobre a ocorrência de ameaças aos habitantes da terra indígena Awá, pois fazendeiros estariam pretendendo retornar ao local, uma vez que haviam saído em 2014 em cumprimento da decisão judicial. A tensão estaria acontecendo desde 2015. Os índios denunciaram a retirada de madeira e a criação de gado. A fundação, na época, informou que a Polícia Federal havia enviado uma equipe à região.

Um inquérito foi aberto pela PF. para apurar as denúncias de ameaças dos posseiros aos indígenas. O cacique Massaranduba, daquela tribo, declarou, na ocasião, que os índios estavam se organizando para lutar e fazer vigilância em conjunto, que é denominada na aldeia como “Guardiões da Floresta”. Esse grupo se camufla na vegetação e detecta qualquer presença humana estranha.

Outra operação

Em agosto, Polícia Federal, Exército, Funai e Ibama estiveram na Terra Indígena Alto Turiaçu, no Maranhão, onde combateram o desmatamento, a extração ilegal de madeira e os garimpos ilegais. Durante a operação, as equipes fecharam três serrarias e apreenderam caminhões, assim como cerca de 500 metros cúbicos de madeira. O 24º BIS realizou, naquele momento, a “Operação Verde Brasil”, enquanto a PF deflagrou a “Operação Ka’apor”.

Após ações na terra indígena, considerada a maior do Maranhão, a PF colheu provas testemunhais e materiais em um local conhecido popularmente como “Garimpo do Alex”, a fim de instaurar um inquérito de usurpação de produtos minerais. Durante as abordagens, o Ibama, em conjunto com a Fundação Nacional do Índio, aplicou multas na área e embargou o local. Com relação à extração ilegal de madeira, foram fechadas três serrarias e dois caminhões utilizados pelos madeireiros foram apreendidos pelas equipes. Além de diversos equipamentos e aproximadamente 500 metros cúbicos de madeira, em forma serrada e em toras.

Força Nacional

Vinculada ao Ministério da Justiça e Segurança Pública, a FNSP é composta por policiais militares, policiais civis, bombeiros militares e peritos dos estados e do Distrito Federal. Atua na preservação da ordem pública, segurança das pessoas e patrimônio, além de calamidades. Trata-se de um programa de cooperação entre os estados-membros e a União, a fim de executar, por meio de convênio, atividades e serviços imprescindíveis à preservação da ordem pública.

A Força Nacional foi criada a partir do Decreto nº 5.289, de 29 de novembro de 2004, sendo inicialmente instituída para atuação nos estados e executar atividades de policiamento ostensivo, em casos de perturbação da ordem pública, segurança das pessoas e do patrimônio. Em 2007, com a Lei nº 11.437, o DF foi incluído no projeto. Em 2008, por meio da Portaria do Ministério da Justiça nº 0394/08, as atribuições da FNSP foram ampliadas, abrangendo, também, a cooperação com os órgãos de segurança federais.

O Decreto nº 7.318/2010 permitiu à Força Nacional contar com integrantes da Polícia Civil e peritos criminais.

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