Artigo

Os (muitos) presentes que a vida me deu

Atualizada em 11/10/2022 às 12h22

Tarde fria em Lisboa, chego ao Café Martinho da Arcada, centro da cidade, sou conduzido pelo garçom para mesa cativa de Fernando Pessoa (1888-1935), temperatura em torno de 10°C, ideal pra mim, um nordestino mal feito, que não gosta de calor. Acomodo-me, e passo a observar o frenesi das pessoas, absortas em seus pensamentos, muitas a falar em seus “telemóveis”.

O Velho Mundo sempre me encantou, desde quando conheci o continente pelos livros. Sempre que posso, atravesso o Atlântico, por aqui aporto e, mais apaixonado fico.

Desta vez vim para celebrar mais um ano de vida. Tenho a impressão que o tempo por essas bandas passa mais devagar, sem a correria de outros lugares. Gosto da calmaria desse lugar.

Oh! Coisa que passa rápido é o tempo, não há como segurá-lo, escorre pelos dedos das mãos, e como escreveu o poeta gaúcho Mário Quintana (30/06/1906-05/05/1994) no poema “Seiscentos e sessenta e seis”, que se popularizou como “O tempo”, no livro “Esconderijo do tempo”:

- “O tempo não pode ser segurado; a vida é uma tarefa a ser feita ....

Quando vemos já são 18 horas,

Quando vemos já sexta-feira.

Quando vemos terminou o mês.

Quando vemos terminou o ano.

Quando vemos já se passaram 50 ou 60 anos

Agora, é tarde demais para ser reprovado…

E se me dessem - um dia - uma outra oportunidade,

eu nem olhava o relógio

seguia sempre em frente…

E iria jogando pelo caminho a casca dourada e inútil das horas”.

Já é noite, a temperatura cai um pouco mais, peço um novo café, mais um dia se foi, com suas histórias e seus segredos, estou um ano mais velho, tentando aprender um pouco mais sobre essa coisa surpreendente, dinâmica e inacabada chamada vida, com suas nuances e idiossincrasias.

O desafio é saber administrar da melhor forma possível o tempo que tenho pela frente. A sensação enganosa que temos o controle das coisas é pura perda de tempo; passamos pelos segundos, minutos, horas como se fôssemos proprietários deles, mas somos apenas reféns.

Tempo não é patrimônio, é empréstimo. O que eu fiz com o meu tempo, ou você com o seu, nos define se foi investimento ou desperdício.

Dentre os diferentes conceitos de riqueza, com o avançar dos anos, aprendi que ser rico é ter tempo para realizar desejos; quanto mais simples, melhor. Sentar em um café no final do dia, pleno em agradecer pela concessão da vida, ao bom e maravilhoso DEUS, pela saúde: física, mental e espiritual; pelo amor e respeito da família e dos amigos, do carinho de meus cachorros, pelas conquistas, e sonhos realizados.

Tempo para ler, aprender, escrever, saber ouvir, ouvir música, fazer sexo, ir ao cinema, fotografar entardeceres, conversar em torno da mesa, viajar, conhecer pessoas diferentes nesse mundão. E, ainda citando Mário Quintana, o “poeta das coisas simples”, “Não faça de sua vida um rascunho, poderás não ter tempo de passá-la a limpo”.

Envelhecer sem ficar velho e chato, dono da verdade (qual verdade?), um exortador inflexível, é um desafio permanente. “Feliz daquele que desistiu de mudar os outros, e começou a gastar seu tempo lapidando a se mesmo”, li recentemente no para-choque de um caminhão. Filosofia simples que serve pra mim.

Para quem se reinventou após o advento da internet, enquanto tiver fome e sede de conhecimentos, aberto ao novo, continuo dizendo, “Esse é o meu tempo, vale a pena continuar vivo”.

Para quem veio a esse mundo a fórceps, em um parto complicado de minha inesquecível e saudosa mãe, em uma manhã chuvosa do dia 7 de dezembro de 1958; ficar órfão de mãe muito cedo, sofrer um grave acidente de carro, quatro anos hospitalizado, 43 cirurgias por causa osteomielite(infecção óssea), suspeita de que nunca mais iria andar, chegar aos 61 anos, e ter pisado, com minhas muletas em 140 países, e ter entrado para o Livro dos Recordes Brasil, como o brasileiro mais viajado do mundo com mobilidade reduzida, são presentes divinos. Além de ser homenageado com um selo comemorativo dos Correios, na Biblioteca Pública Benedito Leite.

Gratidão é a palavra que resume tudo isso, obrigado Sr. Deus por tudo.

Um brinde à vida.

Luiz Thadeu Nunes e Silva

Engenheiro agrônomo e palestrante

Leia outras notícias em Imirante.com. Siga, também, o Imirante nas redes sociais Twitter, Instagram, TikTok e canal no Whatsapp. Curta nossa página no Facebook e Youtube. Envie informações à Redação do Portal por meio do Whatsapp pelo telefone (98) 99209-2383.