Artigo

Mudança e impermanência

Atualizada em 11/10/2022 às 12h22

A redução severa do tempo gasto na realização de uma tarefa é o que promete o computador quântico que, ao contrário dos que conhecemos na atualidade, opera com a física quântica, terreno que ainda é pouco conhecido, quanto às revoluções que pode empreender no nosso cotidiano.

Essa é apenas uma das mais recentes discussões em voga nestes tempos de revolução tecnológica que nos obriga a estar constantemente atualizados, conectados, interligados. A velocidade com que a mudança se instala requer de nós uma postura atenta, cooperativa, sob o risco de ficarmos à margem da história.

O permanente é figura de retórica, para lembrar a famosa frase de Marx quando afirmou, no século passado ainda, que tudo o que é sólido se desmancha no ar. As conquistas são passageiras e a notícia de hoje já nem espera mais o amanhã para caducar. Outra informação no mesmo dia, quase que em tempo real de seu acontecimento, suplanta a novidade a que mal nos acostumávamos.

Um dos teóricos que melhor definiu esse estado foi o sociólogo Zigmunt Bauman, falecido em 2017. É dele a constatação de que na sociedade atual, nada é feito para durar, e as expressões tempos líquidos, amores líquidos e modernidade líquida explicam, cada uma à sua maneira, esses conceitos que apontam para a transitoriedade, para a incerteza latente, para a mudança galopante.

E como nós ficamos, em meio a esse turbilhão de informações que se seguem, uma após a outra, antes mesmo que tenhamos condições de averiguar, refletir e apreender o significado de cada uma delas? O escritor Yuval Harari chama a atenção para o fato de que “hoje, muitos de nós já abrimos mão de nossa privacidade e individualidade” e que “dispomos de mais opções do que nunca, porém perdemos a habilidade de realmente prestar atenção no que escolhemos”.

Essas são, no meu entender, trágicas consequências desta era que abomina textos profundos e tem enraizada resistência ao verbo esperar. Tal qual num grande fastfood intelectual, as pessoas querem que suas expectativas e anseios sejam atendidos aqui e agora; somado a isso, a baixa tolerância à frustração reina no império narcisista que ordena que todos sejam protagonistas.

Acredito que devemos aprender a (re)significar o mundo em que estamos vivendo. Capacidade de adaptar-se às circunstâncias, elaborar estratégias e focar no essencial são algumas ferramentas das quais podemos lançar mão.

O escritor e psicanalista Viktor Frankl, sobrevivente do campo de concentração e criador da logoterapia, recomenda, num de seus livros, que “quando a circunstância é boa, devemos desfrutá-la; quando não é favorável devemos transformá-la e quando não pode ser transformada, devemos transformar a nós mesmos”.

O ser humano possui a incrível capacidade de (re) inventar (-se) e encontrar novas formas de sobrevivência. Ouso dizer que mesmo em tanta parafernália tecnológica, os princípios que regem as relações humanas são válidos, ainda que intermediados por aplicativos e aparelhos conectados à internet.

Se a mudança é nosso estado permanente, se as coisas se modificam antes mesmo que nos adaptemos, devemos incorporar esse desafio e prosseguir com o que temos de intocável, de imodificável. A essência é eterna, a despeito do cenário flexível.

Natalino Salgado Filho

Médico, doutor em Nefrologia, ex-reitor da UFMA, membro da ANM, da AML, da AMM, Sobrames e do IHGMA


Leia outras notícias em Imirante.com. Siga, também, o Imirante nas redes sociais Twitter, Instagram, TikTok e canal no Whatsapp. Curta nossa página no Facebook e Youtube. Envie informações à Redação do Portal por meio do Whatsapp pelo telefone (98) 99209-2383.