Território

Quilombolas vão ao Incra reivindicar titulação de terras no Maranhão

Membros de 37 quilombos chegaram à sede do Incra-Ma na terça-feira; ativistas participaram de reunião com representantes do órgão; desde 2011, reivindicações vêm sendo cobradas pelos grupos atuantes na causa

- Atualizada em 11/10/2022 às 12h22

Em reivindicação à regularização de territórios em diversas regiões do estado, ativistas vinculados ao Movimento Quilombola no Maranhão (Moquibom) estiveram, na manhã de ontem, 6, na superintendência estadual do Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária (Incra-MA), em São Luís, onde reuniram-se com representantes do órgão para discutir o tema. A titulação, que vem sendo requerida desde 2015, deveria ter ocorrido até o ano passado, mas cortes orçamentários e de pessoal inviabilizaram a conclusão do processo, de acordo com o órgão.
Os representantes de 37 quilombos localizados em sete municípios maranhenses ocuparam a entrada do prédio onde, atualmente, funciona o Incra-MA para cobrar medidas acordadas há quatro anos, que determinavam a elaboração Relatório Técnico de Identificação e Delimitação (RTID) - documento que respalda a ocupação dos territórios quilombolas. Os manifestantes chegaram ao prédio na noite de terça-feira, 5, e permaneceram até a manhã de ontem (6), quando foram recebidos pelo superintendente interino do órgão.

As reivindicações não são novas e, desde 2011, vêm sendo cobradas pelos grupos atuantes na causa. Em 2015, um acordo foi firmado entre representantes de quilombos e o Incra-MA para que, até 2018, fossem concluídas as titulações de, pelo menos, 22 dos 72 territórios pertencentes a quilombos que ainda não foram regularizados no estado. De acordo com Rafael Silva, advogado da Comissão Pastoral da Terra, entidade que apoia os quilombolas, as exigências são baseadas em disposições da Constituição e, por isso, legítimas.

“Esta é uma pauta que envolve dezenas de comunidades quilombolas do Maranhão, articuladas pelo Moquibom, com articulações que se iniciaram em 2011, para que o Incra cumpra a fase administrativa dos estudos que vão fazer a identificação dos territórios quilombolas. Isso é um dever da União, definido pela Constituição Federal e pelo Decreto 4.887, de 2003, que regulamenta esse processo e garante a titulação dos territórios quilombolas”, esclareceu.

Área remanescentes
A titulação das terras e o reconhecimento legal dos territórios atesta que as comunidades quilombolas ocupam áreas remanescentes de escravos, medidas capazes de minimizar conflitos com fazendeiros, empresários, grileiros e latifundiários. Para os quilombolas esta é uma forma de garantir a própria subsistência e livrar-se de invasões, ameaças e, até mesmo, mortes, como destacou a quilombola Emília Costa, do quilombo Santo Antônio do Costa, localizado em São Luís Gonzaga do Maranhão.

“A ineficiência do Incra tem gerado vários conflitos em áreas de quilombos, ameaças de morte e até morte nos territórios, porque temos de brigar com fazendeiros, com grandes empresas de mineração porque não temos a titulação de nossos territórios. Isso afeta bruscamente nossa maneira de viver, pois precisamos das águas, das florestas que, muitas vezes, estão em poder de outras pessoas que se dizem proprietários e nos impedem de andar nesses territórios e a gente não pode plantar, não pode colher e acabamos dependendo de políticas públicas como o Bolsa Família”, contou.

Apesar do acordo, a titulação não foi concluída pois, de acordo com o superintendente interino do Incra-MA, Rui Alcides dos Santos, outros 400 processos do tipo tramitam no órgão que não conta com equipes nem orçamento financeiro suficiente para cobrir os gastos demandados pela regularização dos territórios. Ainda segundo o representante, a instituição vem fazendo o possível para concluir as demandas, mas, devido às dificuldades administrativas, não pode definir um prazo para a conclusão do processo.

“Essa pauta é de 2015 e ela contemplou um número muito grande de territórios, mas o Incra não tem pessoal e ficou muito tempo sem recursos para conduzir essas demandas. Infelizmente foi um acordo que não poderia ser cumprido em três anos. Nós fizemos uma repactuação e, ainda assim, ficou difícil para o órgão honrar seus compromissos por conta das restrições orçamentárias. Mas nós estamos com equipes em campo, estamos trabalhando nesses territórios e infelizmente não podemos concluí-los dentro do prazo que eles querem nem precisar um prazo de cumprimento”, explicou.

Além de São Luís, as manifestações ocorreram em outros dois estados do país - Bahia e Rio Grande do Norte -, integrando uma articulação nacional de luta e em defesa dos quilombos brasileiros.

SAIBA MAIS

Quilombos maranhenses

As comunidades quilombolas surgiram a partir da formação de quilombos, considerados um local de refúgio dos africanos e seus descendentes escravizados, bem como de sua reorganização com a abolição da escravidão. No Maranhão, a história da formação das comunidades quilombolas está relacionada a expansão da lavoura de algodão e de arroz no final do século XVIII, com a criação da Companhia Geral do Comércio do Grão-Pará e Maranhão, bem como ao abandono de terras por proprietários rurais, com a decadência econômica no final do século XIX.No ano de 2018, existiam 713 comunidades quilombolas reconhecidas no Maranhão, com 518 certidões fornecidas pela Fundação Cultural Palmares, concentradas especialmente na Baixada Maranhense e nos vales do Itapecuru e do Mearim.No entanto, tais comunidades enfrentam diversas dificuldades, como conflitos rurais por disputa de terras com fazendeiros, divisão da produção agrícola com donos de terras, vulnerabilidade socioeconômica, dificuldade de acesso a serviços básicos.

Movimento quilombola
Tantos os moradores de terras formadas por antigos quilombos como de comunidades negras formadas a partir do fim da escravidão buscaram se organizar, com o surgimento de movimentos negros a partir dos anos 1970. Com a Constituição de 1988, e seu art. 68 do Ato das Disposições Constitucionais Transitórias (ADCT), garantindo a propriedade definitiva das terras aos remanescentes de quilombos que as estejam ocupando, as comunidades negras ganharam uma atenção maior em seu processo de luta por reconhecimento para titulação das terras e acesso a serviços como educação e saúde .

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