A vida começa aos 60

A vida começa aos 60: idosos que descobriram os "prazeres da idade"

Com a elevação da expectativa de vida dos brasileiros, há quem diga que, na verdade, a vida não começa mais aos 40 anos e sim aos 60; com boa conversa e muita disposição, idosos mostram que ainda têm muito o que viver

Thiago Bastos / O Estado

Atualizada em 11/10/2022 às 12h22

[e-s001]Começar um curso no ensino superior, realizar trabalho voluntário ou ainda iniciar a prática de atividade física e fazer disso um objetivo de vida. Ações como essas são mais comuns do que se pensa e envolvem o público que inicia uma nova etapa após os 60 anos de ida­de. Com a elevação da expectativa de vida dos brasileiros apontada pelo Relatório de Desenvolvimento Humano do Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento (Pnud) - de 62,7 anos em 1980 para 73,9 anos em 2013 -, há quem diga que na verdade a vida não começa mais aos 40 anos e sim aos 60.

Em São Luís, são vários os casos de pessoas que rejeitaram o esteriótipo de que a velhice representa somente “sentar-se em uma cadeira esperando a morte chegar”. Há desde o contador centenário de histórias ao senhor de 80 anos que, pela disposição, causa inveja em vários jovens.

Um jovem senhor
No dia 16 do próximo mês, um jo­vem senhor completará 100 anos de idade. As lembranças da época da baixada, das décadas de 50 e 60 - quando estava no auge do vigor físico segundo o próprio -, ainda estão frescas na lembrança de quem
já viveu tanto e ainda quer acompanhar a evolução da cidade nos próximos anos.

Seu Bento Serra, de 99 anos, considera-se um quase adolescente. Com bom humor, alimentação regrada e costumes (como evitar a bebida alcoólica e o cigarro por todo esse período), ele - que nasceu no dia 16 de novembro de 1919, antes de fatos considerados históricos como a 2ª Guerra Mundial, a final de 1950 no Maracanã, dentre outros - tem saudade dos amigos, familiares e outras pessoas que, por diferentes motivos, se distanciaram e/ou faleceram.

O que impressiona os colegas e outros que o acompanham no dia a dia, é a capacidade, apesar da idade, de Bento Serra - filho de São Bento (MA) -, memorizar cada data. Ele se lembra, inclusive, do dia em que chegou à Ilha. “Foi quando tinha 19 anos. Cheguei para trabalhar como comerciante e fui pulando de emprego em emprego”, contou.

Ele mostra com orgulho a carteira de 1959, em que é oficializada a sua filiação na entidade que administrava o Mercado Central da cidade. “Tive meus filhos e minha esposa e, aos poucos, fui ficando so­zinho, por opção, sendo assistindo pelos meus netos”, afirmou.

Atualmente, a família de seu Bento é a comunidade do Asilo de Mendicidade, onde vive há alguns anos. “Nasci obeso e fui perdendo peso. Trabalhei desde os 5 anos, ajudando a minha mãe na produção artesanal de farinha. Tenho muito orgulho da vida que tive”, afirmou.

[e-s001]O superatleta
Até os 65 anos de vida, a rotina de Elizeu Freire era dedicada apenas ao trabalho, ofício que contou com sua dedicação por mais de quatro décadas. O personagem, que atuou na estrutura portuária por todo este período, sempre teve de contar com forte esforço físico e psicológico, o que o afastou de qualquer possibilidade de prática de exercício pós-trabalho.

Foi uma visita a uma academia da capital maranhense que mudou esta realidade, ao se aposentar. “Quando vi um vizinho por aqui e eu, amante de palavra cruzada, sem fazer nada, tive de tomar uma providência. Comecei a andar sozinho no meu bairro e, depois dis­so, não parei mais”, disse.

Aos 66 anos, Elizeu se matriculou em uma instituição especializada na orientação física. Desde então, não saiu mais, e hoje, aos 80 anos, sua disposição chama a atenção dos mais novos. Ele consegue carregar até 80 kg e faz exercícios de barra com peso de 8 kg preso ao corpo.

O fato rendeu uma história curiosa. “Estava aqui na academia e uma senhora se aproximou. Pediu para fazer um vídeo no celular. Quando perguntei o porquê, ela disse que era para mostrar ao esposo dela que, aos 40 anos, só queria saber de beber. Achei o máximo aquilo”, afirmou.

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Orientações são importantes
Para quaisquer exercícios, idosos devem procurar auxílio especializado. “Na nossa academia, todos os idosos são monitorados, com a verificação, por exemplo, da pressão arterial na entrada e saída de cada exercício”, disse Eduardo Roberto, instrutor e orientador físico.

Segundo ele, a atividade física nessa idade é de suma importância para a otimização de valências ligadas à força e à coordenação motora. “Muita gente entende que o idoso é frágil, mas é adequar sua experiência e coordenação à carga certa de movimentos”, afirmou.

O lado negativo de ser idoso: a coação e a violência

Dados do Centro Integrado de Apoio e Prevenção à Violência contra a Pessoa Idosa (Ciapvi) - órgão vinculado à Defensoria Pública do Estado do Maranhão - apontam que, de 1º de janeiro a 30 de setembro deste ano foram registrados 1.366 atendimentos referentes a possíveis situações de violência cujas vítimas foram idosos. O saldo é de uma média diária de aproximadamente cinco ocorrências por dia.

Ano passado, ainda de acordo com a entidade, foram catalogados 1.172 atendimentos do gênero. Para Isabel Lopizic, representante do CIAPVI, a conscientização da população sobre esta realidade é um dos grandes desafios da rede. “A questão da violência ainda é muito presente em vários lares de idosos. A população idosa tem crescido, e nós observamos que as pessoas não estão preparadas para este envelhecimento. A falta de respeito é muito grande”, afirmou.

De acordo com dados da Delegacia do Idoso de São Luís, mais de 70% das denúncias que são registradas de violência ou dano às pessoas acima dos 60 anos de idade ocorrem no eixo familiar. “É a mãe ou pai que sofre com o filho ou filha, em sua maioria. Nestes casos, há uma dificuldade a mais, já que a vítima, por estar vinculada emocionalmente ao acusado ou acusada, não quer denunciar”, disse a titular da Delegacia do Idoso, Igliana Azulay.

Segundo ela, a denúncia pode ser formulada por pessoas próximas ou vizinhos que, mesmo sem contato com a vítima, se solidarizam com o caso. “A polícia avalia a situação e, nos casos específicos, parte para a averiguação no local”, disse.
Bairros com maiores registros de violência ao público idoso

Outro perfil adotado pela Defensoria Pública do Estado do Maranhão listou as localidades no território de São Luís com maiores índices de violência (física e psicológica) contra o público idoso. Seis são apontados como os de maior foco nos casos: Centro, Anjo da Guarda, Turu, São Francisco, Angelim e Maracanã.

Dentre os fatores apontados para os registros, estão a sensação falsa de impunidade, coação física e social e condição econômica. “O que nós estamos fazendo dos nossos dias atuais pode ser determinantes para quando chegarmos aos 60 anos. Qual a leitura que estamos fazendo dos dias de hoje? Estamos nos permitindo?”, afirmou o promotor do Idoso, Augusto Cutrim.

Crimes contra idosos
Ainda de acordo com dados da Defensoria Pública do Estado do Maranhão (DPE), a maior parte dos casos definidos como de “violência” está relacionada à negligência ou a situação de abandono (24,52%). Em segundo lugar, estão os casos relativos a abuso financeiro (com 17,13%) e, em terceiro lugar, os registros de abuso psicológico, com aproximadamente 15% dos casos. Existem casos ainda de lesão ao idoso por ausência de orientação devida por parte de tutores ou responsáveis legais.

Punições

De acordo com a Lei nº 10.741 (Estatuto do Idoso) sancionada em 2003, a exposição do idoso a perigo de sua condição física ou psicológica ou submetê-lo a condições desumanas ou degradantes pode resultar em pena que varia de dois meses a um ano. Nos casos de lesão corporal, a reclusão deve chegar a quatro anos. Nas ocorrências cujo desfecho é a morte do (a) idoso (a), a pena máxima é de 12 anos.

ABRINDO O JOGO

O que você faz no dia a dia para ser mais feliz, após os 60?

[e-s001]“Atualmente, gosto apenas de me deitar e dormir [risos]. Mas também me divirto com minhas amigas, ao contar histórias de coisas que vivemos quando éramos mais novas”

Ivonilde de Moraes, 71 anos, aposentada

[e-s001]“Eu descobri, há quase 15 anos, o exercício físico por prazer em minha vida. Aos 80, me sinto um menino que gosta de se divertir, tomar uma cervejinha e sair”

Elizeu Freire, 80 anos, aposentado

[e-s001]“Eu, na verdade, gosto de conversar e não ficar só. Infelizmente, a vida limitou os meus movimentos, mas adoro ouvir música e falar sobre o passado”

Maria Correia, 74 anos, aposentada

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