Celebração

Tradição de São Cosme e Damião movimenta São Luís na entrega de doces

Em vários bairros da capital, crianças corriam para receber as guloseimas, distribuídas por quem pagava alguma promessa. Na Umbanda, Candomblé e Tambor de Mina, a data é celebrada hoje.

Nelson Melo

Atualizada em 11/10/2022 às 12h23
Dona Andrelina organiza os doces para a entrega
Dona Andrelina organiza os doces para a entrega (Cosme e damião)

SÃO LUÍS-Nesta quinta-feira, 26, comemorou-se, na Igreja Católica, o Dia de São Cosme e São Damião, seguindo uma tradição antiga. A fim de agradecer as graças recebidas, por circunstâncias distintas, as pessoas costumam distribuir doces, geralmente, para crianças, mas isso não impede que adultos também recebam. Em São Luís, a data foi celebrada em vários bairros da cidade. Em diversos lugares, moradores entregavam bombons, pipoca e pirulitos.

A movimentação de crianças correndo ou aguardando na entrada de casas começou logo cedo, nas primeiras horas da manhã. Algumas pessoas distribuíram os doces de manhã. Outras, à tarde. E ainda há aquelas que fizeram a entrega à noite. A pedagoga Ana Maria Melo Costa, que é professora da rede municipal de São Luís, segue essa tradição há 14 anos, como uma forma de agradecimento a duas graças que recebeu de São Cosme e São Damião.

“Eu faço todo ano. Já é meu 14º ano que pago a promessa por dois motivos: vestibular e problema de saúde. No mesmo ano em que passei no vestibular da Ufma para Pedagogia, comecei a ter problemas de nervos. Então, eu fiz duas promessas, aproveitando que São Cosme e São Damião são padroeiros dos médicos. Eu fui aprovada no vestibular e melhorei do problema nos nervos”, explicou Ana Maria. Ela sempre faz a entrega dos doces no período noturno, mas somente para as crianças da catequese.

Essa distribuição dos doces ocorre na Igreja Nossa Senhora de Fátima, no bairro Redenção, que está na circunscrição da Paróquia de Santa Terezinha. Dentro dos sacos, que são personalizados com a imagem dos santos, Ana coloca pé de moleque, pirulitos, pipocas e bombons. “Desde 2005, eu pago a promessa. Eu andei em vários médicos, mas nunca descobriram qual era o meu problema de saúde. Eu me apeguei aos santos e fiz essa promessa. Enquanto eu tiver vida e saúde, vou entregar bombons às crianças”, comentou a pedagoga.

Bairro de Fátima

Também em celebração ao Dia de São Cosme e Damião, dona Andrelina Joana Costa Leite, de 58 anos, distribuiu doces em sua residência, na Rua Paulo Frontin, no Bairro de Fátima, em São Luís, no turno vespertino. Presidente da Associação Carente de São Benedito do Bairro de Fátima, ela contou que entrega, além dos doces, outras coisas, como refrigerantes e bolo, sendo que esse projeto é realizado há 15 anos.

“A gente cumpre essa tradição com muita alegria e orgulho. É um dia de muita festa, de celebração. É um dia de devoção, espiritualidade e gratidão”, expressou ‘dona’ Andrelina. Nesta sexta-feira, 27, a distribuição de doces ocorrerá na sede da Associação, onde funciona o Educandário Manoel da Conceição Pinheiro Sobrinho, que beneficia 282 alunos de 3 a 10 anos, além de 120 idosos.

Umbanda e candomblé

Diferentemente da tradição católica, na Umbanda, Candomblé e Tambor de Mina, o Dia de São Cosme e São Damião é celebrado no dia 27 de setembro. Eles são conhecidos como os orixás Ibejis. São filhos gêmeos de Xangô e Iansã. Os devotos e simpatizantes têm o costume de fazer caruru (uma comida típica da tradição afro-brasileira), chamado também de “Caruru dos Santos” e “Caruru dos sete meninos”, que representam os sete irmãos (Cosme, Damião, Dou, Alabá, Crispim, Crispiniano e Talabi).

Entrega de doces

Segundo a historiadora e professora Marcela Martins, da Faculdade dos Guararapes, em Pernambuco, a origem do costume de entregar guloseimas às crianças na referida data pode estar no sincretismo religioso. “Quando os africanos chegam ao Brasil como escravos, eles são proibidos de praticar sua religião e rituais. Dessa forma, eles começaram a associar suas entidades às figuras do catolicismo. Assim, São Cosme e Damião foram associados às entidades crianças, para as quais eram ofertadas doces”, explicou a pesquisadora.

Segundo a professora, a partir de então, a religião católica aderiu à tradição, que se tornou mais forte com o tempo.

Cosme e Damião

Cosme e Damião eram irmãos gêmeos, que viveram na Ásia Menor, na região do Oriente Médio, entre os séculos III e IV d.C. Médicos, eram ficaram conhecidos por curarem as pessoas sem cobrarem dinheiro ou qualquer outra coisa. São considerados protetores dos gêmeos e das crianças. E também padroeiros dos farmacêuticos, médicos e das faculdades de Medicina.

“Foram dois irmãos, que, como profissão, exerciam a Medicina. Eles usaram a Medicina para fazer pastoral, para trazer pessoas para a Igreja Católica, isso no século III, sendo que morreram martirizados no começo do século IV, por incomodar as autoridades pagãs daquela época”, explicou o jornalista e católico Lucas Hadade, que faz pesquisas sobre a história dos santos. De acordo com ele, os gêmeos não cobravam pelos trabalhos que faziam nas comunidades, pois agiam para converter os pagãos e infiéis.

“Eles faziam trabalho missionário e foram presos pelas autoridades locais, que não gostavam do fato de que eles estavam ganhando popularidade por meio desse trabalho e de suas curas. Essas autoridades não gostavam porque Cosme e Damião usavam o talento para converter almas. Então, foram martirizados, decapitados, mas, antes, sofreram torturas”, pontuou Lucas. Ainda segundo o jornalista, os santos se recusaram a adorar os deuses pagãos, e acabaram sendo assassinados por conta disso.

“Eles entraram para o panteão da Igreja como homens exemplares, que seguiram Cristo acima de tudo. São exemplos para os ricos, porque eles eram de famílias ricas. Isso não impediu de usarem os estudos, o dinheiro, para o bem, como ferramenta para o ascetismo. O que determina se uma pessoa vai para o Céu ou não é como ela usa o que tem”, ressaltou Hadade.

Importância dos santos

Lucas disse que os santos na Santa Igreja Católica não são idolatrados ou adorados. Na verdade, são venerados. “Por conta de serem exemplos de irmãos de fé. Eles triunfaram sobre o mundo. São exemplos de pessoas que seguiram Cristo de maneira reta, que colocam a Igreja e as virtudes teologais como centro da vida. O resto vem depois. Os santos são exemplos de imitação de Cristo, mas em um nível quase perfeito, porque perfeito é só Nosso Senhor”, esclareceu Hadade.

O jornalista pontuou que os católicos usam os santos como referências de como devem agir diante de inúmeras situações. “São situações onde você é colocado diante de dilemas éticas, onde você tem que adorar Cristo, orar, exercer funções na sociedade. Os santos foram exemplos. Está aqui o manual. Aqui na Medicina, como eu devo agir? O santo mostra como você deve agir. Eles fazem isso inspirados em Jesus Cristo, para ter como fim adorar e amar Cristo”, enfatizou Lucas.

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