Telefonema

Trump pediu para líder ucraniano investigar Biden

Segundo líder democrata, que abriu investigação para possível impeachment do presidente, registro mostra comportamento incompatível com dignidade do cargo; Trump pressionou um líder estrangeiro para perseguir um rival político

Atualizada em 11/10/2022 às 12h23
O presidente americano Donald Trump em um encontro sobre a Venezuela em Nova York
O presidente americano Donald Trump em um encontro sobre a Venezuela em Nova York (Reuters)

WASHINGTON - O presidente dos Estados Unidos, Donald Trump, pediu para o presidente da Ucrânia entrar em contato com o secretário de Justiça americano, William Barr, para conversar sobre uma potencial investigação de corrupção envolvendo o ex-vice-presidente e pré-candidato democrata à Presidência Joe Biden , mostra uma transcrição de um telefonema de julho.

A ligação está no centro das acusações de que Trump pressionou um líder estrangeiro para perseguir um rival político, o que motivou a presidente da Câmara dos Deputados, a democrata Nancy Pelosi, a anunciar na terça-feira,24, o início de um inquérito legislativo para avaliar se o presidente cometeu crimes passíveis de impeachment.

"A divulgação das notas [do telefonema] confirma que o presidente adotou um comportamento que mina a integridade de nossas eleições, a dignidade do cargo que ocupa e nossa segurança nacional", disse Pelosi em uma declaração por escrito nesta quarta.

Durante a ligação, no dia 25 de julho, Trump disse ao recém-eleito presidente Volodymyr Zelensky, da Ucrânia, que ele deveria entrar em contato com Barr e com o advogado pessoal do presidente, o ex-prefeito de Nova York Rudolph W. Giuliani, de acordo com a transcrição divulgada pela Casa Branca ontem, 25.

"Fala-se muito sobre o filho de Biden, que Biden interrompeu a investigação [sobre supostas ligações do filho, Hunter, com corruptos ucranianos], e muitas pessoas querem descobrir isso, então o que quer que você possa fazer com o secretário de Justiça seria ótimo", disse Trump na ligação, segundo resumo fornecido pelo Departamento de Justiça dos EUA.

"Biden saiu por aí se vangloriando de ter impedido a investigação, então, se você puder conferir isso... Parece horrível para mim", disse Trump, de acordo com o memorando.

O telefonema aconteceu depois de Trump ordenar ao governo americano que congelasse quase US$ 400 milhões de ajuda dos EUA à Ucrânia. Não houve nenhuma referência, implícita ou explícita, à ajuda durante a ligação.

A ligação não menciona nenhuma troca de favores explícita. Segunda a transcrição, Trump diz que os EUA "fazem muito pela Ucrânia" e foram "muito, muito bons para o país". O americano também sugere que o outro país não está retribuindo."Eu não diria que é recíproco necessariamente porque coisas que não são boas estão acontecendo, mas os EUA têm sido muito, muito bons para a Ucrânia", afirmou Trump.

A existência do telefonema veio à tona a partir de uma denúncia anônima feita internamente por um agente dos serviços de inteligência que escutou a conversa, como revelaram na semana passada os jornais Washington Post e Wall Street Journal.

O corregedor-geral da comunidade de inteligência, Michael Atkinson , considerou a denúncia crível e urgente, mas o diretor interino da Inteligência Nacional, Joseph Maguire , discordou, e não repassou a queixa às comissões de Inteligência da Câmara e do Senado, como prevê a lei.

Diante da controvérsia, na segunda-feira, 23, Nancy Pelosi havia dado até esta quinta-feira,26, para que Maguire entregasse a denúncia anônima ao Legislativo. Diante da pressão, Trump ordenou a divulgação da transcrição da ligação.

No Twitter, antes que a transcrição fosse conhecida, o ocupante da Casa Branca afirmou que o registro iria provar que ele não cometeu nenhuma irregularidade. "Os democratas vão se desculpar depois de ver o que foi dito na conversa com o presidente ucraniano? Eles deveriam, foi uma ligação perfeita — os pegou de surpresa!", afirmou.

Pressão antiga

Ainda ontem, 25, o Departamento de Justiça afirmou que o secretário Barr não sabia que Trump havia dito a Zelensky para entrar em contato com ele.

Embora combater a corrupção generalizada na Ucrânia seja um objetivo da política externa americana de longa data, Trump fez referência a Biden durante a ligação. Trump e Giuliani há muito tempo pressionam as autoridades ucranianas a examinar se houve algum conflito de interesses entre as negociações de Biden com a Ucrânia enquanto estava na vice-presidência e o cargo de seu filho Hunter no conselho de uma empresa de energia ucraniana.

Mas a sugestão de Trump de que autoridades americanas fossem diretamente envolvidas e entrassem em contato com o governo da Ucrânia é a primeira evidência de que o presidente procurou se valer do seu poder para promover uma investigação com motivação política.

No início do telefonema, Trump pede que seu colega ucraniano "nos fizesse um favor", citando uma teoria, apresentada por seu advogado Giuliani, de que os ucranianos tiveram algum papel no hackeamento de e-mails do Comitê Nacional Democrata durante a campanha para as eleições de 2016.

"Eu gostaria que o secretário de Justiça ligasse para você ou pessoas que trabalham com você e gostaria que você levasse essa história até o final", disse Trump na ligação, referindo-se também a Robert Mueller, o promotor que investigou a interferência da Rússia no pleito de 2016 e, em seu relatório final, acusou agentes russos pela invasão dos computadores do Comitê Democrata.

Logo em seguida, Trump menciona o caso de um promotor "muito bom" que foi afastado na Ucrânia, em referência ao suposto caso envolvendo o filho de Biden. "Muitas pessoas falam sobre isso, como vocês demitiram um promotor que era muito bom e que havia pessoas muito ruins envolvidas. Giuliani é um homem muito respeitado, foi o prefeito do Nova York, um ótimo prefeito, e quero que ele telefone para você."

Abuso de autoridade

Em seguida, Trump diz que Giuliani "sabe bem o que está acontecendo", antes de citar diretamente o filho de Biden. A investigação a ser conduzida por autoridades ucranianas, Barr e Giuliani teria por alvo um suposto abuso de autoridade cometido por Biden.

Quando ainda era vice-presidente, o democrata teria exigido a demissão de um promotor ucraniano que investigava a empresa na qual trabalhava seu filho. Na época, ele teria ameaçado suspender US$ 1 bilhão em ajuda aos ucranianos caso não fosse atendido, mas negou que a pressão fosse relacionada ao seu filho.

O então promotor supostamente perseguido por Biden, Viktor Shokin, havia sido criticado pelo governo dos EUA e pela União Europeia por questões maiores, incluindo o bloqueio de reformas no sistema legal da Ucrânia. O Parlamento da Ucrânia aprovou sua demissão em março de 2016.

Os aliados de Trump argumentam que ele não exerceu pressão inadequada sobre Zelensky no caso de Biden, mas mencionou Barr porque o Departamento de Justiça já conduzia uma revisão das origens do inquérito sobre a interferência russa.

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