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Morre Robert Mugabe, de herói da independência a ditador do Zimbábue

Líder da luta contra o apartheid na antiga colônia britânica da Rodésia, dirigente fraudou eleições e reprimiu opositores para se manter no poder; ele tinha 95 anos

Atualizada em 11/10/2022 às 12h23
Robert Mugabe, durante celebração do seu aniversário de 90 anos, em 2014
Robert Mugabe, durante celebração do seu aniversário de 90 anos, em 2014 (AFP)

ZIMBÁBUE - O ex-ditador Robert Mugabe , herói do movimento pela independência do Zimbábue que acabou fraudando eleições e reprimindo opositores para se manter no poder por 37 anos, morreu na sexta-feira,6, Aos 95 anos. A morte foi confirmada pelo atual presidente, Emmerson Mnangagwa , que liderou um golpe cívico-militar para afastar Mugabe do poder em 2017. Ele chamou Mugabe de “um ícone da libertação panafricana que dedicou sua vida à emancipação e ao empoderamento de seu povo".

Mugabe supostamente morreu em Cingapura, onde passava por tratamento médico, mas a causa imediata da morte não foi divulgada.

Celebrado por lutar contra o regime de segregação racial imposto na antiga colônia britânica da Rodésia — uma das últimas a conquistar sua independência, em 1980 —, Mugabe tornou-se uma figura polarizadora em seu país e no continente. Isso ficou evidente no fato de que até seus opositores ressaltaram seu papel histórico contra o colonialismo.

"Ele era um colosso no cenário do Zimbábue e seu legado positivo será o papel que teve para pôr fim ao governo da minoria branca e a expansão da educação de qualidade para todos os zimbabuanos", disse o senador opositor e defender de presos políticos David Coltart.

O regime de Mugabe foi marcado pelo caos econômico provocado por uma reforma agrária feita de maneira autoritária e desorganizada no início dos anos 2000, quando terras dos fazendeiros brancos - que continuavam controlando a maior parte da área arável do país — foram confiscadas.

A queda da produção agrícola decorrente da reforma, com terras entregues a altos funcionários do governo e sem que a população negra beneficiada recebesse recursos e ajuda técnica, provocou hiperinflação e desemprego generalizado, agravados por sanções internacionais lideradas pelo Reino Unido. Mugabe foi derrubado quando preparava sua última mulher, Grace, para sucedê-lo.

Resultados contestados

No ano passado, nas primeiras eleições pós-Mugabe, Emmerson Mnangagwa, do mesmo partido do ex-ditador, a Zanu-PF (União Nacional Africa do Zimbábue-Frente Patriótica), foi vitorioso, mas a oposição contestou os resultados. Os distúrbios que se seguiram, com o governo recorrendo cada vez mais à repressão, continuam travando a recuperação econômica do país.

Nascido em 1924 e formado na Universidade de Forte Hare, na África do Sul — a mesma onde Nelson Mandela estudou —, Robert Mugabe tornou-se professor em Gana, já então independente, e retornou à Rodésia na década de 1960 para lutar contra o regime da minoria branca. Na época, em meio à onda de descolonização da África, os colonos brancos, liderados pelo primeiro-ministro Ian Smith, haviam declarado independência da Rodésia em relação a Londres, mas continuaram recebendo apoio da metrópole.

Preso por dez anos pelo regime de Smith por "discurso subversivo", sem jamais ter sido julgado, quando foi solto em 1974 Mugabe fugiu para Moçambique, tornando-se um dos líderes do então clandestino Zanu-PF, que iniciou a luta armada contra o regime de Smith. Após um conflito que se estendeu por sete anos, e cujo fim foi mediado pelo Reino Unido, eleições em fevereiro de 1980 deram a vitória ao Zanu-PF e ele se tornou primeiro-ministro do Zimbábue independente.

Contra o apartheid

Mugabe nem sempre foi um tirano. Logo depois da independência, ele permitiu que Ian Smith — que em 1966 o impedira de sair da prisão para ir ao enterro do filho de três anos — concorresse e fosse eleito deputado do novo Parlamento. No poder, ele apoiou a luta do Congresso Nacional Africano de Mandela contra o apartheid na África do Sul.

De início, Mugabe liderou o país por um período de crescimento econômico e desenvolvimento educacional, dotando o Zimbábue de um dos melhores sistemas de educação da África, mas as violações de direitos humanos logo começaram. Na década de 1980, ao menos 8 mil pessoas — algumas estimativas falam em até 30 mil — foram mortas na província de Matabeleland, quando o governo esmagou um movimento de oposição liderado pela minoria ndebele, à qual pertencia Joshua Nkomo, rival de Mugabe no movimento pela independência.

Em 2002 e 2008, ele foi acusado de fraudar eleições para impedir a vitória da oposição. Nos últimos anos, Mugabe se tornou cada vez mais um peso para o regime que havia criado. Em 2016, ele disse que permaneceria no poder "até Deus me chamar". No ano seguinte, foi forçado pelos ex-aliados a se afastar.

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