Após barrar viagem

Israel permite que deputada americana visite avó na Cisjordânia, mas ela recusa

Condição estabelecida por Tel Aviv é que Rashida Tlaib não promovesse boicotes contra o país durante a visita

Atualizada em 11/10/2022 às 12h23

JERUSALÉM - Israel anunciou na sexta-feira,16, a concessão de um visto de "caráter humanitário" para que a deputada democrata americana Rashida Tlaib visitasse sua família na Cisjordânia, incluindo a avó de 90 anos, sob a condição de que a congressista não promovesse boicotes contra o país durante a viagem. Rashida, porém, anunciou no Twitter que desistiu da visita.

"Não posso permitir que o Estado de Israel me humilhe e use meu amor pela minha avó para me obrigar a me curvar a suas políticas opressivas e racistas", escreveu ela. "Silenciar-me e me tratar como uma criminosa não é o que ela quer para mim. (...) Eu decidi que visitar minha avó sob essas condições opressivas vai contra tudo em que eu acredito — a luta contra racismo, opressão e injustiça", escreveu.

Na véspera, em atitude inédita em relação a congressistas dos Estados Unidos, o governo de Benjamin Netanyahu havia negado uma autorização para que Tlaib e sua colega Ilhan Omar, ambas muçulmanas, realizassem uma visita oficial ao país. Em uma atitude também sem precedentes contra o Legislativo, o presidente americano, Donald Trump, havia pressionado pela negativa do visto, dizendo que as duas deputadas deputadas " odeiam Israel e todos os judeus ".

Antes de Tlaib anunciar que recusava o visto, um comunicado do Ministério do Interior israelense informou que ela teria permissão para visitar a avó no vilarejo de Beit Ur al-Fauqa, na Cisjordânia, território palestino ocupado por Israel desde a Guerra dos Seis Dias, em 1967.

A autorização foi concedida depois que a deputada democrata, filha de pais palestinos, enviou uma carta ao ministro do Interior, Aryeh Deri, dizendo que "esta poderia ser a última oportunidade de ver sua avó" e comprometendo-se a "respeitar restrições e não defender boicotes contra Israel" durante a visita — a mesma precondição que ela depois rejeitou.

"Eu aprovei o pedido por razões humanitárias, mas parece que houve uma provocação para constranger Israel. O ódio dela por Israel é maior do que o amor pela sua avó", respondeu no Twitter o ministro Deri.

Ataques racistas

Em julho, o presidente americano já havia realizado uma série de ataques racistas contra Tlaib, Omar e outras duas congressistas novatas da ala esquerda do Partido Democrata — Alexandria Ocasio-Cortez e Ayanna Pressley — afirmando que "deveriam voltar" para seus países de origem. Apenas Omar, no entanto, nasceu fora dos EUA, na Somália, embora seja cidadã americana.

A intervenção do presidente americano, descrita pelo New York Times como "um passo marcante para influenciar uma nação aliada e punir seus opositores em casa", foi alvo de críticas da oposição democrata e também de parlamentares republicanos.

O senador Marco Rubio, um forte aliado de Trump, disse "discordar 100%" das duas deputadas, mas que negar sua entrada em Israel "é um erro", enquanto o líder democrata na Câmara, o deputado Stony Hoyer — conhecido pelas posições pró-Israel — afirmou que a decisão do governo de Netanyahu é "ultrajante, independentemente do itinerário ou da posição das deputadas".

Até o Comitê de Assuntos Públicos Estados Unidos-Israel (AIPAC, na sigla em inglês), lobby pró-israelense em Washington, disse que, por mais que discorde da posição das deputadas, também acredita que "todos os membros do Congresso deveriam poder visitar e conhecer" Israel. A presidente da Câmara dos Deputados, Nancy Pelosi, por sua vez, afirmou que a decisão "é um sinal de fraqueza, abaixo da dignidade do grande Estado de Israel", enquanto o líder democrata no Senado, Chuck Schumer, disse que a medida “prejudicará a relação bilateral e o apoio a Israel nos Estados Unidos”.

Em um comunicado, Netanyahu disse que nenhum país do mundo respeita mais o Congresso americano que Israel, mas justificou o veto à visita com base em uma lei que proíbe a entrada daqueles que defendem um boicote a produtos israelenses fabricados nos territórios ocupados. Segundo o premier, seu país é uma “democracia vibrante e livre” aberta a todo tipo de crítica, menos àquelas que defendem o boicote. Omar e Tlaib apoiam o movimento Boicote, Sanções e Desinvestimento, conhecido pela sigla em inglês BDS, criado em repúdio ao tratamento dado aos palestinos.

" Afronta"

Em declaração publicada nas redes sociais, Omar chamou a decisão do governo israelense de "afronta", dizendo que era equivalente a um veto à entrada de muçulmanos no país. Ela também criticou Netanyahu, dizendo que ele "resiste aos esforços de paz" e se "alia a islamofóbicos", citando nominalmente Trump, e concluiu afirmando que o veto é um "insulto aos valores democráticos" e serve como uma "resposta arrepiante" a uma visita de representantes de uma nação aliada. Tlaib, por sua vez, disse que a decisão de Israel "é um sinal de fraqueza, porque a verdade sobre o que acontece com os palestinos é aterrorizante".

O premier israelense enfrentará eleições no meio de setembro e, tendo sua proximidade de Trump como um dos carros-chefe de sua campanha, não pode se dar ao luxo de contrariar o líder americano. Trump, por sua vez, já está na corrida para a reeleição, e parece decidido utilizar as deputadas de primeira viagem como suas adversárias, em uma tentativa de caracterizar o Partido Democrata como "radical".

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