Quarentão

Walkman: uma revolução tecnológica que completa 40 anos

Aparelho desenvolvido pela Sony foi um dos primeiros reprodutores de música portátil do mundo e revolucionou o mercado de áudio

Atualizada em 11/10/2022 às 12h24

[e-s001]SÃO PAULO - se hoje a música pode nos acompanhar aonde quer que formos, isso é graças ao walkman, que este mês completa 40 anos de existência. Lançado pela japonesa Sony em julho de 1979 (mais precisamente no dia 1º), o aparelho de fitas cassete foi o primeiro a permitir que se ouvisse áudio com facilidade em qualquer lugar, sendo o pioneiro em uma linhagem de portáteis que marcaram gerações, como o discman e o iPod, até os celulares multitarefa de hoje.

O aparelho foi um dos primeiros reprodutores portáteis de música do mundo e marcou a geração dos anos 80. Capaz de reproduzir fitas cassete, um formato que revolucionou a indústria da música na época, o dispositivo fez tanto sucesso que o nome Walkman, patenteado pela Sony, virou um ícone do mercado de áudio. O aparelho foi decisivo também para revolucionar a indústria fonográfica, ao ajudar na popularização dos cassetes e na queda dos discos de vinil.

A ideia de criar um aparelho portátil capaz de reproduzir fitas cassete surgiu de um dos fundadores da Sony, Masaru Ibuka. Ele queria ouvir música com fones de ouvido em estéreo durante uma viagem de negócios para o exterior, e solicitou, então, que o time de desenvolvimento criasse uma versão do gravador portátil da Sony TC-D5. Este dispositivo, modificado para apenas reprodução em estéreo, viria a ser o protótipo do Walkman.

Em 1º de julho de 1979 o Walkman TPS-L2 foi lançado no Japão. Posteriormente, suas vendas se estenderam para todo o planeta, marcando uma geração inteira e revolucionando o mercado de áudio. Ao longo dos anos 80, tempo em que o Walkman reinou, a Sony lançou diversos modelos, como WM-2, WM-20 e a evolução deste aparelho, o WM-109, que acumulou mais de 20 milhões de unidades vendidas.

O surgimento do Walkman foi o início da era dos dispositivos pessoais de áudio portáteis, permitindo que as pessoas ouvissem suas músicas em qualquer lugar e a qualquer momento. Com o declínio da fita cassete e a ascensão do CD, no fim da década de 80, a Sony lançou em 1988 o Discman D-20. Depois, em 1992, a companhia introduziu o MiniDisc como formato de áudio com o MZ-1 MD-Walkman.

O Walkman fez tanto sucesso que a Sony nunca abandonou a marca, mesmo quando os cassetes se tornaram inviáveis. Nos anos 2000, os discmans passaram a ser lançados com o nome "CD Walkman". A Sony também criou celulares com o no­me em alusão às capacidades multimídia e aproveitou a marca em MP3 Players, que competiam com a febre dos iPods. Hoje em dia, o uso do selo é restrito a reprodutores de áudio digital de alta qualidade.

O sucesso atingido pelo Walkman nessas quatro décadas de existência é difícil de ser superado. As estimativas oficiais dão conta de que a linha de produtos Walkman vendeu 385 milhões de unidades no mundo todo – mas estes números datam de 2009. Para se ter uma ideia da escala, durante o auge do reprodutor de cassetes, a Sony comercializava 50 mil novas unidades por mês só no Japão.

Ícone dos anos 80
As fitas cassete e VHS se tornaram verdadeiros ícones gráficos dos anos 80 e o Walkman era o sonho de consumo de 10 entre 10 adolescentes. Vale destacar que naquela época a importação de produtos era mais difícil e ninguém tinha um celular no bolso para tocar o que quisesse - e mais, não dava para baixar exatamente a faixa que você queria para escutá-la das mais diversas formas, como atualmente.

Some isso ao fato de que um jovem oitentista tinha muito menos opções de entretenimento. Nada de streaming com Netflix e Spotify ou milhares de conteúdos on demand. Então, ter sua própria “central musical portátil” era algo para lá de sensacional.

Posteriormente, o Walkman passou a ser vendido em todo o planeta, marcando uma geração inteira e revolucionando o mercado de áudio. Ao longo dos anos 80, a Sony lançou diversos modelos, co­mo o WM-2, o WM-20 e sua evolução, o WM-109, que acumulou mais de 20 milhões de unidades vendidas.

[e-s001]A “morte” do Walkman
E como um aparelho fantástico como esse “desapareceu”? Bem, com a própria evolução de seu conceito, em 1988, a Sony introduziu o Discman D-20, que, em vez de usar as fitas cassete, partiu para os discos de leitura a laser. Isso permitiu aos usuários escolher as faixas sem ter que passar uma a uma, entre outras vantagens de gravação. Os CDs virgens também passaram a ser muito mais baratos do que as fitinhas magnéticas.

Já nos anos 90, o Walkman foi aos poucos caindo no ostracismo, especialmente com os modelos mais poderosos de tocadores de CD. Nos 2000, os iPods e MP3; e nos 2010 os celulares e gadgets sem fio decretaram de vez a morte das fitas cassetes.

Se bem que não foi uma morte total, porque ainda há muitas pessoas que gostam da fidelidade de gravações das fitas, que até hoje se mostram como repositórios de informação muito mais duráveis do que qualquer CD um dia foi. E com o charme desse dispositivo revolucionário presente em filmes e séries, como “Guardiões da Galáxia” e “Stranger Things”, o Walkman talvez seja dessas coisas que sempre terão um revival nostálgico de tempos em tempos.

INVENTOR É QUASE BRASILEIRO

O Walkman teve sua criação marcada por uma longa batalha judicial. Isso porque o primeiro tocador de cassete portátil da história foi na verdade o stereobelt, criado em1972 pelo filósofo germano-brasileiro Andreas Pavel. Nascido na Alemanha, Pavel veio para o Brasil ainda na infância, quando o pai foi contratado para trabalhar nas Indústrias Matarazzo.

“Tenho passaporte alemão, mas se você me acordar no meio da noite, vou falar em português”, diz ele, que desenvolveu sua invenção enquanto morava em São Paulo (hoje, ele se divide entre o Brasil, a Alemanha e a Itália). Ele conta que a ideia do stereobelt se deve muito à contracultura do Brasil dos anos 1970, quando os jovens do país viviam entre o idealismo hippie e a realidade opressora da ditadura militar.

“Havia uma utopia, e essa utopia no Brasil passava por uma intensificação, porque uma coisa é você ser hippie em São Francisco ou em Berlim, mas outra é você ir contra a corrente cultural e ao mesmo tempo ter que se defender de uma ditadura. Havia uma experimentação com a vida e os sentidos, e as duas coisas me interessavam muito”.

De forma mais específica, Pavel diz que a vontade de criar um aparelho de som portátil também se deveu muito à casa onde foi criado: uma construção modernista no Morumbi, com uma abóboda que conferia uma ótima acústica ao lugar. A vontade dele era poder levar para qualquer lugar a experiência sensorial que tinha quando ouvia música lá.

“Eu e minha namorada estávamos viciados na nossa música e não tínhamos como ouvi-la fora de casa. Para mim, a solução parecia óbvia: pegar o menor emissor de ondas sonoras, o fone de ouvido, e o menor suporte, que era o cassete, e conceber um aparelho cassete muito pequeno, mas de qualidade”, diz ele, que, uma vez com a invenção pronta, deixou para usá-la ao lado da amada. A música escolhida foi "What's going on", de Marvin Gaye, na versão do flautista de jazz Herbie Mann.

“Quando tudo isso estava pronto, eu não quis testar em casa. Queria o impacto total da experiência. Saí com a minha doce companheira. Estávamos em Saint Moritz, na Suíça, vendo a neve cair. O ambiente era mágico, de silêncio total, quase ninguém andando. Tudo pronto, apertei o botão”.

Batalha na Justiça
Embora a tecnologia para criar o tocador portátil já estivesse disponível, Pavel conta que as empresas ainda não tinham pensado em tanto porque, na época, a qualidade do som era associada ao tamanho dos aparelhos. Por isso, ele começou a desenvolver seu modelo. Em1977, registrou a patente na Itália e, até o ano seguinte, nos Estados Unidos, Alemanha, Reino Unido e Japão. A partir daí, apresentou o protótipo a diversas empresas de tecnologia — entre elas, a Sony, que o recusou.

Porém, no ano seguinte, a gigante japonesa introduziu o Walkman no mercado. Ele ficou sabendo primeiro por um amigo que visitara o Japão, e depois por um anúncio de revista no Brasil.

Pavel então iniciou uma longa batalha judicial contra a empresa. A primeira foi na Alemanha, e a empresa concedeu em pagar royalties pela primeira versão do aparelho comercializada no país. A briga seguiu para o Reino Unido, e Pavel quase faliu com os gastos milionários do processo.

“A Sony me colocou numa prensa violentíssima. Disseram que iam pedir todos os custos que tiveram com os advogados. Queriam me cobrar dois milhões de libras. Foi uma pressão tremenda, porque eu não conseguia mais ter cartão de crédito ou pagar um dentista”, relembra o inventor, que, finalmente, fechou um acordo milionário com a Sony em 2004.

Mesmo assim, o germano-brasileiro não guarda ressentimentos: Pavel fala com admiração de Akio Morita, cofundador da Sony que apostou no aparelho mesmo contra vozes dentro da própria empresa, e diz que os japoneses acertaram ao escolher o nome "walkman", que, de tão popular, passou a ser usado como sinônimo para qualquer tipo de tocador de cassete portátil, e logo recebeu versões de concorrentes. Ele ainda antecipa que a história dele e do aparelho será transformada em um filme, ainda em fase de desenvolvimento.

“O filme não vai ser briga de tribunal. Vai ter isso também, mas não é o principal. É um filme sobre o clima cultural do Brasil da época, e não sabemos ainda se será uma ficção ou documentário”, antecipa.

Defesa da filosofia
Hoje com 74 anos, Pavel ainda foi diretor de programação da TV Cultura e editor da tradicional coleção Os Pensadores, da Abril Cultural. Durante a faculdade, ele retornou à Alemanha e estudou filosofia, psicologia e antropologia. Para ele, a formação humanística é fundamental para que a inovação tecnológica seja possível:

“Eu talvez não teria inventado o Walkman se não tivesse estudado filosofia. Porque a filosofia, entre outras coisas, é a arte do ceticismo, de questionar qualquer coisa e estudar aqueles grandes autores maravilhosos, que ensinam você a examinar qualquer hipótese. O progresso da ciência e da pesquisa consiste em questionar hipóteses. O treinamento filosófico é especificamente um treinamento de questionamento. Voce só inventa se pula para fora dos padrões, e o primeiro passo para você fazer isso é questionar os padrões, pensar em cada coisa ao contrário do que ela é”.

Apesar de Pavel ter conseguido receber uma indenização da Sony, é difícil avaliar em valores o impacto que o Walkman teve na indústria cultural, especialmente nos anos 1980: segundo o "Japan Times", 400 milhões de unidades do aparelho foram vendidas desde seu lançamento.

Fonte: O Globo

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