Agressões

Maranhão é o 5º em violência contra moradores de rua no Nordeste

De 2015 a 2017, foram 229 casos; estado está atrás de Bahia, Pernambuco, Alagoas e Paraíba; parte dos casos não é notificada, dizem autoridades

Daniel Matos / Coordenador de Reportagem

Atualizada em 11/10/2022 às 12h24
Morador de rua dorme sobre papelão em calçada no bairro Ponta d'Areia
Morador de rua dorme sobre papelão em calçada no bairro Ponta d'Areia

SÃO LUÍS - Boletim epidemiológico divulgado pelo Ministério da Saúde aponta que de 2015 a 2017 foram registados 229 casos de violência no Maranhão motivados pelo fato de a vítima ser morador de rua. Os números posicionam o estado, em termos percentuais, como o quinto da região Nordeste nesse tipo de agressão, junto com o Ceará e o Rio Grande do Norte, e atrás da Bahia, de Pernambuco, de Alagoas e da Paraíba.

No ranking nacional, o Maranhão é a 19ª unidade da federação onde os moradores de rua são mais vulneráveis. No período pesquisado, o estado concentrou 1,3% de todas ocorrências de agressões físicas a pessoas que vivem nessa situação no país. O ano de 2015 foi o mais violento, com 110 registros. Nos dois anos seguintes, houve queda significativa. Em 2016, foram 62 notificações e em 2017 a quantidade de casos caiu para 57.

Em São Luís, foram contabilizados 45 atos violentos contra moradores de rua de 2015 a 2017. Analisando cada um dos três anos pesquisados, constata-se a incidência muito maior em 2015, quando foram registrados 31 casos. Nos dois anos seguintes, houve redução substancial, para 9 e 5 ocorrências, respectivamente. Apesar da queda acentuada, a estatística coloca a cidade como a 12º capital brasileira com maior índice de agressões a pessoas que vivem na rua.

Moradores de rua deitados em bancos de praça em São Luís
Moradores de rua deitados em bancos de praça em São Luís

Subnotificação

Se as a estatísticas já expõem um cenário já considerado preocupante, as autoridades garantem que a realidade é ainda mais cruel. Titular da Delegacia de Costumes e Diversões, com vasta experiência em atender ocorrências envolvendo moradores de rua, o delegado Joviano Furtado informa que dos 23 inquéritos relacionados a homicídios abertos em 2017 no 1º Distrito Policial, que tem jurisdição no Centro de São Luís, e era chefiado por ele na época, 17 tiveram como vítimas pessoas em situação de rua, a grande maioria usuários de drogas, principalmente crack.

Um dos idealizadores e executores de uma ação realizada em parceria com o Centro de Apoio Psicossocial Álcool e Drogas (Caps-AD), que consiste no recolhimento periódico de pessoas em situação de rua na área do Centro, Joviano aponta o Mercado Central e arredores como ponto de maior concentração de moradores de rua da capital e estima em 15 o número de indivíduos que perambulam de forma fixa pela área, atualmente, por não terem onde morar. “A população flutuante chega a 40”, calcula.

Essas pessoas costumam entrar em conflitos entre si, o que frequentemente evolui para a violência física, mas também travam confrontos com terceiros, a exemplo de comerciantes e donos de outros estabelecimentos e seus empregados, clientes e até policiais. Para muitos desses cidadãos, a presença dos moradores de rua perto dos seus locais de trabalho e em outros espaços movimentados representa incômodo. “Muitos vigiam carros e não são bem vistos. Alguns pedem comida e até dinheiro e também não são bem aceitos”, observa Joviano Furtado.

Indigência

Além do Centro, outras áreas de São Luís registram a presença de moradores de rua. É o caso do trecho entre os bairros São Francisco e Ponta d’Areia, interligado pelas avenidas Ana Jansen e dos Holandeses. Nessa região, indigentes caminham, errantes, dia e noite, e ficam expostos à violência permanentemente.

É o caso de Mirian Galvão Silva, 28 anos, que ocupa a calçada em frente à filial de uma grande rede de farmácias, na Ponta d’Areia. Ela diz não saber desde quando está no local e afirma que jamais sofreu qualquer agressão física, nem mesmo ameaça. Por outro lado, admite que escolheu o local onde passa a maior parte do tempo por medida de proteção.

Com a perna esquerda amputada, resultado de um grave atropelamento que sofreu, um jovem pedinte que preferiu não se identificar é o retrato da fragilidade diante dos perigos da rua. Com aspecto físico extremamente debilitado e já exibindo indícios de perturbação mental por causa do uso constante de drogas, ele vaga entre o retorno do São Francisco e as vias que convergem para esse ponto em busca não só de trocados para sustentar o vício e de comida, mas também para escapar dos riscos inerentes à sua condição de vida.

Realizado em 2012, o último levantamento feito pela Secretaria Municipal da Criança e Assistência Social (Semcas) apontou a existência de 627 pessoas morando em logradouros públicos de São Luís. O número representou um aumento de quase 23% em relação a 2011, quando haviam sido identificados 510 moradores de rua. A estimativa é de que esse contingente tenha aumentado ainda mais nos últimos anos.

Com intuito de atualizar os dados referentes à população de rua da capital maranhense, O Estado encaminhou solicitação à Secretaria Municipal de Comunicação (Secom). Foram duas tentativas de obter as informações pretendidas, mas em nenhuma houve êxito.

Saiba Mais

Em três anos (2015-2017), foram notificados, no Brasil, mais de 17 mil casos de violência cuja motivação foi a vítima estar em situação de rua. Mas existe uma alta proporção de casos de violência entre moradores de rua que nem sempre são notificados. Os motivos da subnotificação variam desde a não procura pelo serviço de saúde por parte da vítima (ou dificuldade de acesso ao serviço), até o não registro desses casos no sistema de notificação por parte do profissional de saúde e o não preenchimento do campo “motivação da violência”.

A expressão “pessoas em situação de rua” abrange a compreensão da transitoriedade da condição de viver/estar na rua. De acordo com a Política Nacional para a População em Situação de Rua (Decreto nº 7.053/2009), esta população é caracterizada como “grupo populacional heterogêneo que possui em comum a pobreza extrema, os vínculos familiares interrompidos ou fragilizados e a inexistência de moradia convencional regular, e que utiliza os logradouros públicos e as áreas degradadas como espaço de moradia e de sustento, de forma temporária ou permanente, bem como as unidades de acolhimento para pernoite temporário ou como moradia provisória”.

Em 2015, a estimativa das pessoas vivendo em situação de rua no Brasil foi de 101.854, sendo que a maioria (77,02%) delas vivia em municípios de grande porte e na região Sudeste (48,89%).

As características majoritárias das pessoas que constituíam a população em situação de rua eram: sexo masculino, adultos jovens (25 e 44 anos), exerciam atividade remunerada, passavam a maior parte do tempo nas áreas comerciais das cidades. Os fatores que influenciam a vivência na rua são diversos, mas os principais foram: uso abusivo de álcool e/ou outras drogas, desemprego e conflitos familiares.

NÚMEROS

627 pessoas era o total da população de rua de São Luís em 2012, um aumento de 23% em relação a 2011

229 foi o total de casos de violência contra moradores de rua no Maranhão entre 2015 a 2017

45 casos de violência contra moradores de rua foram registrados em São Luís entre 2015 a 2017

17 inquéritos de homicídios foram registrados em 2017 no 1º DP (Centro) tendo moradora de rua como vítima

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