Artigo

Confrontando seu outro eu

Atualizada em 11/10/2022 às 12h24

Um belo dia, inesperada e infalivelmente, qualquer ser humano vai ter de se deparar com seu Outro eu. Nessa difícil hora da verdade poucos escapam ilesos Não adianta fugir, o melhor é encarar o diálogo:

- Que estás fazendo aqui? Juro que desta vez não o chamei.

- Pelo que sei não tenho outras opções, infelizmente.

- Infelizmente? Por que fala assim?

- Essa história de ser seu duplo não pense que me agrada. Vim para tirar satisfações. Se é para ser o Outro eu de alguém preferia ter nascido outro eu de gente menos chata do que você.

- Você é um ingrato. Nem corpo tem para reclamar de alguma coisa... Dê-se por feliz sendo meu Outro eu. Sempre digo aos outros que você é melhor do que eu, enfim, um eu que eu gostaria de ter sido e não sou. Não me faça duvidar disso, a partir de agora.

- Deveras? Ora, você sabe muito bem que me usa por oportunismo, apenas para fugir de seus problemas. Valoriza-me sim, mas para realçar a si mesmo. Ou então para se desculpar pelo que faz de errado. Um farsante, isso é o que você é.

- Basta! Não precisava ser tão petulante nesta primeira vez em que nos encontramos, de fato. Sempre tive simpatia por você, que, ao final de contas, é onde arquitetei a soma de minhas ilusões. Percebo, porém que você é tão contraditório como eu.

- Não nego isso. Afinal de contas... Dependo de você, que me criou, moldou e inventou. Posso ser contraditório também, já que não tenho outra saída, com genes semelhantes aos seus, mas mentiroso não sou.

- Acho que você está indo longe demais. Por acaso está me chamando de mentiroso?

- Sim porque sempre me usa para justificar-se. Sempre. É corrupto como todo mundo; gosta mais de futebol e praia do que de trabalhar como todo mundo, vota em ladrão como todo mundo, gasta seu tempo em tevê como todo mundo, tem medo da morte como todo mundo e nada faz para justificar sua vida como todo mundo. E, tem mais: imagina projetos mirabolantes para mim, ao invés de tentar realiza-los você mesmo, tentando dotar sua personalidade de uma originalidade inexistente. Enfim, você é incapaz de ser você mesmo. Agora basta. Vim para dar um fim a isso.

- Pelo amor de Deus, aonde quer chegar? Seria isso que estou a pensando agora? Você seria capaz de...

- De lhe matar? Calma, fique frio, Claro que não. Nenhum Outro eu tem a capacidade de assassinar o eu da pessoa a quem é integrado. Isso é conversa fiada! Por outro lado, qualquer suicida pode matar seu Outro eu, e quantos eus mais achar necessário. É simples, basta ter coragem. Porque não tenta isso agora? Vamos decida-se. Garanto que eu não sofreria com isso.

- Deus do céu! Está sugerindo que eu tire a minha vida para você se livrar de mim? Que Outro eu mais sacana fui arranjar! Quer saber de uma coisa? Nunca mais vou querer saber de você. A partir de agora na minha vida basta um eu. Suma da minha vida!

-Tudo bem. Ora, que mais posso dizer?... Finalmente!

. - Passe bem!

-Ótimo! Passe bem, também.

(Ufff! Pelo menos fiz o cara, afinal, tomar uma decisão na vida por si mesmo).

Moral da história. Aquilo que nosso Outro eu é capaz de fazer por nós, ninguém na vida faz!

José Ewerton Neto

Autor de O ofício de matar suicidas

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