79 anos do Festejo de São Pedro, tradição que arrasta multidões na Ilha
O encontro e as homenagens são o ponto máximo da reverência ao santo que, de pescador, virou apóstolo; procissão marítima ocorre neste sábado, às 15h30
SÃO LUÍS - Dos primeiros grupos à consolidação da festa como rito religioso, o Festejo de São Pedro completa 79 anos, conforme defendem pesquisadores da festa. Com a construção da capela por César Aboud até a década de 1970, a tradição ganha nova configuração e apresenta modificações. Com o processo de modernização da capital maranhense e entrega de obras de expansão urbana, as homenagens ao santo padroeiro dos pescadores e das viúvas tornam-se conhecidas não somente entre os moradores da região Central como em outros bairros.
Contam alguns mais antigos que um dos primeiros grupos de bumba-boi a comparecer na capela simples de São Pedro, às margens da Praia da Madre Deus, foi o Boi de Iguaíba, ainda na década de 1930. A informação é rechaçada por Herbert Santos. Para ele, as primeiras manifestações compareceram à estrutura religiosa para as bênçãos do santo em meados da década de 1940. “Os primeiros grupos somente compareceram neste período. Alguns contatos de pessoas com antigos moradores da Madre Deus e estivadores vindos da região de Guimarães da Baixada e que por ali na Madre divina se estabeleceram facilitaram o deslocamento das primeiras manifestações”, disse o pesquisador.
Segundo Herbert, grupos como o Boi do Matadouro (que virou o Boi de Leonardo), de Laurentino (da Fé em Deus) e do Mizico (da Vila Passos) foram os precursores da tradição de buscar na capela a proteção divina. “Como havia na comunidade da Madre Deus uma força muito grande da comunidade cultural, com a promoção previamente de festas de Carnaval, por meio dos grupos tradicionais, pensou-se na junção da festa religiosa com a tradição dos grupos de bumba-boi. E deu certo”, frisou Herbert.
O fator barragem
Com a inauguração, em meados da década de 1970, da Barragem do Bacanga, o itinerário da procissão marítima (que antes saía da Praia da Madre Deus) passou a ter como ponto de partida a maré alta do Jenipapeiro, no cais que atualmente é administrado pela Marinha do Brasil (ainda é possível ver o cais para quem sai da Ponte Bandeira Tribuzi) O deslocamento, assim como hoje, depende da variação da maré.
Dependendo do ano, a procissão sai nas primeiras horas da manhã ou no fim da tarde. A atual configuração da procissão e da capela permaneceu até 1997, quando o governo do Maranhão, na gestão de Roseana Sarney, financiou a construção da igreja em alusão ao santo.
O projeto foi pensado, na ocasião, pelos departamentos de infraestrutura e apoiados pelo setor de cultura. Com os serviços, a igreja passou a funcionar no alto do espaço do largo, com cobertura em formato de chapéu típico dos grupos de bumba boi. Subir as escadarias que dão acesso à igreja passou a ser um desafio para os devotos.
Antes da reforma mais recente, a capela de São Pedro foi reformada em outras três ocasiões, entre 1973 e 1995. No entanto, neste período, foram feitos apenas reparos por iniciativas da Prefeitura de São Luís. A partir de 2001, por orientação da comunidade, a Arquidiocese de São Luís modificou a referência nominal da capela, de forma definitiva, para Igreja de São Pedro (reportada à Paróquia de São Pantaleão, no Centro).
Uma das responsáveis pela manutenção da igreja é uma personagem que, vindo de Viana (MA), se apaixonou pela festa ao santo padroeiro dos pescadores. Ao se estabelecer em São Luís com o pai e a mãe, dona Regina Soeiro (cuja formação católica auxiliou na proximidade dela com a congregação religiosa) é uma das pessoas mais conhecidas da comunidade da Madre Deus.
Na quinta-feira (27), véspera do clímax da festa, Regina Soeiro estava preocupada com a autorização do Corpo de Bombeiros que, horas mais tarde, seria concedida. A O Estado, a colaboradora lembrou que a tradição ganhou ainda mais pujança a partir da reforma da capela por intermédio do Governo do Maranhão. “No governo de Roseana Sarney, foi construído um novo templo, deixando assim de ser capela e passando, em seguida, para igreja da comunidade da Madre Deus”, disse.
Ela relembrou o esforço diário da comunidade em manter a ordem na construção religiosa. “Apesar da festa estar restrita, em um primeiro momento, especificamente ao período junino, durante todo o ano, há uma ativa programação voltada para as atividades religiosas. Em paralelo a isso, temos promoções de eventos para a manutenção da festa”, disse.
Lembranças dos mais antigos
Uma das frequentadoras mais antigas da igreja de São Pedro é dona Maria do Socorro Pereira, de 84 anos. Vinda do interior maranhense, ela citou os antigos encontros nos arredores. “Nossa, faz muitos anos que frequento! Dava muita gente, realmente”.
Ela conta que, apesar do encontro dos bumba-bois, costuma frequentar mais por causa da festa religiosa. “Sou devota de São Pedro e costumo vir nas missas e em todas as rezas e nas homenagens”, disse.
A descendente “Bagum”
Em uma humilde casa da Rua Pau d’Arco, na Madre Deus (a poucos metros da atual igreja de São Pedro), reside há mais de sete décadas a aposentada Maria Francisca dos Santos (conhecida como “Bagum”). Ela, além de vários atributos (simpatia, humildade, sinceridade…) tem ligação de parentesco com vários dos organizadores da festa. Dentre as heranças, é sobrinha de José Raimundo Carvalho (vulgo Zé de Zuleide).
Ao falar com O Estado, dona “Bagum” rememorou histórias que marcaram sua infância e adolescência. Aos 77 anos, a agora aposentada se lembra do empenho do tio em tornar a festa conhecida da cidade. “Ah, ele era muito orgulhoso desta festa. Falava com todos para sempre conseguir donativos. Sem ele, o festejo e o encontro não seria conhecido”, disse.
De acordo com a sobrinha de Zé de Zuleide, dona Marcela - a antiga zeladora da igreja de São Pedro - também foi fundamental. “Ela quem cuidava da igreja, a antiga, no caso. Depois, dona Marcela passou a missão para outra pessoa”, disse.
Programação do Festejo de São Pedro
De acordo com os organizadores, a procissão marítima que encerrará o festejo de São Pedro sairá neste sábado (29) às 15h30, da Rampa Campos Melo, na Praia Grande. Após aproximadamente uma hora de cortejo, o grupo volta para o terminal de embarque e desembarque. Em seguida, os romeiros seguirão a pé até a igreja de São Pedro, onde está programada inicialmente a reza do terço (sob a responsabilidade do Terço dos Homens do bairro do Goiabal, no Centro).
Às 19h do mesmo dia, está programada missa campal. Neste ato, será feita uma homenagem a romeiros, devotos de São Pedro e fiéis de outras congregações.
Saiba mais
Sobre o São Pedro
Nascido em Betsaida – Simão (assim chamado), era de origem pescador e casado, além de ter um filho. Seu nome, Pedro, foi concebido após encontro com Jesus Cristo, em um dia de pregação. Jesus disse a Pedro: “Avança para águas mais profundas” (Lc 5; 4).
Mesmo trabalhando à noite inteira e quase sem esperança, ao chegar no meio do mar, Pedro jogou suas redes e não acreditou quando, ao retornar, pediu ajuda ao irmão. Ao voltar, Jesus disse a ele: “Você será pescador de homens” (Lc 5;10)
Ao ser glorificado com o poder do Espírito Santo, de acordo com a bíblia, tornou-se um dos doze apóstolos de Jesus. Ao assumir tal posto, trouxe à tona a ira do poder vigente (em Jerusalém e Roma). Assim que “descoberto”, foi condenado à morte por ser seguidor de Jesus. Ele teria sido morto em 29 de junho e seu corpo, de acordo com historiadores, estaria onde atualmente encontra-se o Vaticano.
Programação
Sábado (29)
15h30 – Procissão Marítima (com saída programada da Rampa Campos Melo)
16h30 – Chegada da procissão à Rampa Campos Melo
17h – Chegada a Igreja de São Pedro
18h15 – Reza do Terço
19h – Missa Campal
Fonte: Comunidade São Pedro
Outros fatos históricos
O convite a Archer para visitar a capela
Em 19 de janeiro de 1947, conforme explicita o presidente da Academia Maranhense de Letras (AML), Benedito Buzar, em seu artigo “As eleições no Maranhão”, é eleito para o mandato de governador um homem chamado Sebastião Archer da Silva (com 36.532 votos). Recém no cargo, na edição do dia 2 de julho de 1949 do Diário de S. Luiz, o governador visita as instalações da capela de São Pedro.
Trouxe o antigo periódico o seguinte registro do fato: “Uma comissão de pescadores esteve em Palácio, convidando S. Exa, o Sr. Governador, para assistir aos festejos que se realizarão na Capela de São Pedro, na Praia da Madre Deus, organizados pela Colônia de Pescadores”. O detalhe desta história é que o convite foi feito em julho, ou seja, em tese após a data alusiva ao santo – que normalmente é reverenciado a cada 29 de junho.
Da Rampa Manoel Nina saía a travessia marítima
Entre 1949 e 1970, da escadaria da rampa Manoel Nina (às margens da Praia da Madre Deus), saíam as embarcações rumo às águas para, anualmente, homenagear São Pedro. Uma das construções mais conhecidas era o iate Paulo Afonso, cujo registro fotográfico constam nos arquivos de Herbert Santos. “Nesta época, a saída era da Madre Deus da procissão marítima com destino às águas. Depois, o cortejo voltava para a capela”, disse Herbert a O Estado.
Com a construção da barragem do Bacanga, no começo da década de 1970, houve uma mudança obrigatória do itinerário da procissão. Antes disso, os bois já davam o tom da festa e das homenagens a São Pedro.
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