Artigo

Um conto de fada moderno

Atualizada em 11/10/2022 às 12h24

Como deve proceder, hoje em dia, uma moça bonita, mas pobre, para casar com um príncipe? Antigamente bastava virar personagem de um conto de fadas, mas tudo muda. O buraco (literalmente) é mais em baixo e muitas não resistem à tentação de apelar justamente para ele.

A Cinderela atual tem nome bonito, corpo bonito, e nasceu em São Paulo. Pobre, nunca chegou a ser uma gata borralheira, no máximo chegou a gata, como a tratavam os rapazes suburbanos que a assediavam. Penou para sobreviver, mas nunca arredou do sonho típico das Cinderelas. As de antigamente, como se sabe, recorriam às fadas ou às bruxarias para acessar seus príncipes, as de hoje recorrem às redes sociais. Foi o que fez nossa Cinderela versão 2019.

Ela sabe que é fácil encontra-los dando sopa por aí, nos facebooks da vida. Hoje eles já não enfrentam dragões e bruxas. Pra quê? Muito mais fácil é correr atrás de uma bola, virar craque e ganhar muita grana. O poder que os príncipes possuíam, que as casadoiras almejavam, e que vinha da beleza, da coroa e do sangue azul hoje vem dos euros que recebem. Grana, muita grana.

Pois foi com um príncipe desses que a Cinderela 2019 sonhou. Ao invés de vestidos bonitos, como se exigiam das futuras princesas, os príncipes de hoje preferem que as candidatas dispensem as roupas. Quanto menos pano para cobrir, melhor! Ao invés de bilhetes, mensagens obscenas; ao invés de promessas de amor, vídeos de strip-tease.

Nossa Cinderela mandou ver e foi tão exuberante em sua performance que o príncipe, sucumbindo aos seus encantos, mandou busca-la do outro lado do Atlântico. Claro, carruagens e corcéis são coisas do passado, príncipes de hoje preferem jatos transatlânticos para transportar suas escolhidas.

E foi só a partir desse ponto que o conto de fada virou conto enfadado. A Cinderela bem que fez a sua parte tentando salvar a lua de mel a que tinha o direito, vindo de tão longe. Queria a festa da meia-noite durando por toda a eternidade, mas não tardou a descobrir que o melhor não era reservado para ela. O príncipe, mais veloz que o jato que a trouxe, só queria mesmo uma rapidinha.

Só então a Cinderela se tocou, vendo seu sonho desmoronar e disse: “Peraí, Príncipe! Vai me deixar sozinha aqui neste hotel. Cadê nossa lua de mel?” O príncipe, generoso como seus ‘parças ‘ insinuam, deve ter se achado dono de toda filantropia do mundo quando respondeu: “A lua você olha pela janela Cinderela, já o mel eu mando trazer de Uber. Pode ficar tranquila”.

Não restava outra saída para a Cinderela senão iniciar uma sessão de tapas com segundas e terceiras intenções. Vendo que o príncipe, mesmo com toda fama de cai cai, era duro na queda Cinderela subiu o tom da vingança: “Você não passa de um príncipe encantado de segunda! Nem pra me comer direito serve, garanto que o lobo mau comeu o Chapeuzinho Vermelho melhor do que você. Vou gritar e mentir pra todo mundo que você me estuprou.”

O resto, a imprensa toda divulgou, confirmando que é desse jeito que os contos de fada modernos terminam. Na delegacia. Não deve ser por falta de príncipes, nem de Cinderelas. Talvez, porque já não se fazem mais contos de fada como antigamente.

José Ewerton Neto

Autor de O ABC bem humorado de São Luís

E-mail: ewerton.neto@hotmail.com

Leia outras notícias em Imirante.com. Siga, também, o Imirante nas redes sociais Twitter, Instagram, TikTok e canal no Whatsapp. Curta nossa página no Facebook e Youtube. Envie informações à Redação do Portal por meio do Whatsapp pelo telefone (98) 99209-2383.