Imigração irregular

Obrador responde a Trump, que ameaça impor tarifa ao México

O presidente mexicano López Obrador afirma que seu governo está combatendo a imigração irregular ''na medida do possível e sem violar os direitos humanos''; segundo ele, '' problemas sociais não se resolvem com tarifas ou medidas coercitivas"

Atualizada em 11/10/2022 às 12h24
López Obrador fez um apelo para que os dois líderes trabalhem em conjunto por soluções pacíficas
López Obrador fez um apelo para que os dois líderes trabalhem em conjunto por soluções pacíficas (AFP)

CIDADE DO MÉXICO - Em resposta ao anúncio de que Donald Trump pretende impor uma tarifa de 5% sobre todos os produtos importados no México a partir do dia 10 de junho, até que o país vizinho suste a imigração irregular para os Estados Unidos, o presidente Andrés Manuel López Obrador afirmou que "problemas sociais não se resolvem com impostos ou medidas coercitivas".

"Como transformar, da noite para o dia, o país da fraternidade com os migrantes do mundo em um gueto, em um espaço fechado, onde se estigmatiza, maltrata, persegue, expulsa e cancela o direito à justiça daqueles que buscam com esforço trabalho para viverem livres da miséria? A Estátua da Liberdade não é um símbolo vazio", disse o líder mexicano, em carta aberta publicada em seu perfil no Twitter.

Segundo Trump, a medida anunciada na noite de quinta-feira,30, visa pressionar o México a "resolver o problema da imigração ilegal". Em sua resposta, López Obrador reforça que seu país, ao contrário das alegações americanas, está cumprindo "na medida do possível e sem violar os direitos humanos" o compromisso de evitar o tráfego de imigrantes de países centro-americanos pelo México.

O presidente mexicano também fez um apelo para que os dois líderes trabalhem em conjunto por soluções pacíficas para a controvérsia e afirma que sua luta contra a corrupção irá criar condições para que os mexicanos fiquem em seu país e não precisem migrar para o Norte. A maior parte dos imigrantes sem documentos que entra nos Estados Unidos pela fronteira sul, no entanto, não é atualmente de mexicanos, mas de cidadãos dos países do chamado Triângulo Norte da América Central — Honduras, Guatemala e El Salvador —, afetados pela violência e pela pobreza.

A correspondência indica que o líder mexicano está levando as ameaças a sério. Segundo López Obrador, representantes de seu governo, encabeçados pelo ministro de Relações Exteriores, Marcelo Ebrard, viajarão a Washington nesta sexta-feira em busca de um acordo e espera que eles sejam recebidos por representantes de Trump.

Cavalos de batalha

Trump tem feito da imigração um dos cavalos de batalha de seu governo, e a ameaça de impor tarifas às exportações do México — parceiro dos EUA no Tratado de Livre Comércio da América do Norte (Nafta), que está em vias de ser substituído pelo Acordo EUA-México-Canadá — vem depois de ele ter sido derrotado no Congresso em seus esforços de obter verba para a construção de um muro na fronteira com o país vizinho.

Um comunicado da Casa Branca divulgado após a mensagem do presidente americano informa que as tarifas sobre os produdos mexicanos serão elevadas para 10% no dia 1º de julho "se a crise persistir", e depois subirão outros 5% a cada mês por três meses, até atingir 25% no dia 1º de outubro.

"As tarifas permanecerão permanentemente no nível de 25%, a menos e até que o México detenha substancialmente o fluxo ilegal de estrangeiros que chegam ao seu território", disse o comunicado.

O anúncio de Washington disse ainda que "a cooperação passiva do México com essa incursão em massa (de centro-americanos) constitui uma ameaça extraordinária e de emergência para a segurança nacional e a economia dos Estados Unidos".

"O México tem leis de imigração muito fortes e poderia facilmente impedir o fluxo ilegal de migrantes, inclusive devolvendo-os a seus países de origem", alega o comunicado.

O México é o maior parceiro comercial dos Estados Unidos, e vende ao vizinho do Norte 80% de suas exportações, de tomates a carros. Em 2018, o México vendeu US$ 346,5 bilhões para os EUA, e uma tarifa de 5% sobre esse valor representaria mais de US$ 17 bilhões.

México endureceu

Apesar das acusações americanas, o México tem tomado medidas contundentes de combate aos fluxos migratórios. As deportações de imigrantes quase triplicaram durante os primeiros cinco meses de mandato de López Obrador , passando de 5.717 em dezembro de 2018 para 14.970 em abril, de acordo com dados preliminares divulgados pelo Instituto Nacional de Migração (INM).

As quase 15.000 expulsões registradas em abril, a maior parte delas de cidadãos de países da América Central, são o maior taxa mensal nos últimos três anos e apontam um endurecimento da política de López Obrador, que no início do ano permitiu a entrada massiva de imigrantes em caravanas que buscavam cruzar o México para chegar na fronteira com os Estados Unidos. Ainda assim, cerca de 100 mil pessoas foram detidas pela polícia americana em abril tentando cruzar a fronteira.

Além disso, o anúncio de Trump foi feito no mesmo dia em que seu governo disse ao Congresso que planejava obter aprovação para o Acordo EUA-México-Canadá, que foi negociado nos últimos dois anos e substituirá o Nafta. O governo mexicano também havia informado nesta semana que submeteria o novo acordo de livre comércio à aprovação do Congresso do país.

O governo de López Obrador tem insistido que só o desenvolvimento econômico pode reduzir os fluxos migratórios de centro-americanos. Em maio, ele apresentou um plano desenvolvido em conjunto com a Cepal (Comissão Econômica para a América Latina da ONU) para atrair investimentos para a América Central e criar empregos.

O plano, que Obrador chamou de "Plano Marshall" para a América Central, em referência ao projeto americano para recuperar a economia dos países europeus aliados no pós-Segunda Guerra, trabalha com cinco eixos — migração, economia, comércio, programas sociais e desenvolvimento sustentável. Várias obras de infraestrutura já foram propostas pela Cepal, mas sua materialização depende investimentos de US$ 10 bilhões, que seriam feitos pelos Estados Unidos.

"Desde o início de meu governo, proponho optar pela cooperação para o desenvolvimento e pela ajuda aos países centro-americanos com investimentos produtivos para criar empregos e resolver a fundo este penoso assunto", afirmou o líder mexicano na carta aberta em resposta a Trump.

Ameaça não é inédita

Trump já usou a ameaça das tarifas no passado para tentar pressionar líderes estrangeiros a adotarem uma ampla gama de ações, da a renegociação de acordos comerciais até a limitação da quantidade de minério ou de carros que eles exportam para os Estados Unidos. Em abril, ele ameaçou impor uma tarifa de 25% sobre carros mexicanos se o país não tomasse medidas para conter o fluxo de imigrantes.

O presidente disse a seus consultores que gosta de tarifas porque elas podem ser adotadas imediatamente e de forma unilateral. Essas taxas, contudo, são normalmente usadas para combater violações relacionadas ao comércio. Não está claro à qual legislação o presidente americano recorreria para impor taxas sobre a imigração mexicana. Se o governo cumprir tal ação, provavelmente enfrentará sérios desafios legais.

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