História da Ilha

Escadarias: De ponto de encontro dos amores à "terra dos pedintes"

É neste cenário que as escadarias e São Luís estão inseridas, não somente pela constituição arquitetônica, mas por servir de ambiente para encontro de casais e amigos e palco para a contemplação das belezas

Thiago Bastos / O Estado

Atualizada em 11/10/2022 às 12h24

[e-s001]Andando pelo Centro His­tórico e suas ruas e pelas avenidas de São Luís, é possível se deparar com casarões, museus, monumentos e outros aspectos do cotidiano da cidade. É neste cenário que as escadarias estão inseridas, não somente pela constituição arquitetônica, mas por servir de ambiente para encontro de casais, de amigos e de palco para a contemplação das belezas da nossa cidade.

[e-s001]A Escadaria dos Amores, na Praça Gonçalves Dias
Esta construção é a mais perfeita personificação do que poderia se chamar de palco dos amores. Não há um fim de tarde que não haja um casal admirando a beleza da Beira-Mar a partir das escadarias. Ela dá acesso ao coreto da Praça Gonçalves Dias e, apesar da ostentação, já sofreu com a ausência de conservação do poder público.
No ano de 2013, O Estado mostrou que parte da mureta de contenção da escadaria desabou com as fortes chuvas da cidade. Na ocasião, a ausência de manutenção pelo poder público foi a razão para o fato.

[e-s001] As escadarias dos pedintes, na Igreja do Carmo
Uma das igrejas mais tradicionais do acervo arquitetônico e religioso resguarda uma das estruturas de escadarias mais conhecidas do centro e adjacências: a da Igreja do Carmo. O bilhete postal de 1905, obtido por O Estado, apresenta uma escadaria frontal que levava à porta de entrada da unidade religiosa, No entanto, a planta da cidade de “São Luiz do Maranhão” datada de 1858, revelou que a estrutura das escadarias eram laterais, tal qual conhecemos hoje.

A partir daí, o questionamento dos historiadores começou a se dar sobre o porquê da mudança (de lateral para frontal) e reincorporação da configuração original nos tempos de hoje. “Ainda é um mistério, não se sabe o porquê da volta da estrutura lateral”, disse o historiador Euges Lima.
Mesmo sem a razão exata, a escadaria é conhecida atualmente por dar acesso a uma das construções religiosas mais antigas da cidade e por abrigar os chamados “pedintes”, pessoas que ficam nos degraus pedindo dinheiro. Uma das mais antigas é Maria Francisca, de 72 anos. “Ah meu filho, eu já vi tanta gente passar por essas escadas!”, disse.

[e-s001]A escadaria do Palácio das Lágrimas
Uma das construções mais emblemáticas da cidade e com história mais rica é a do Palácio das Lágrimas, na Rua da Paz, esquina com Rua São João. O prédio – ocupado inicialmente por um homem chamado Jerônimo de Paula – era conhecido por ostentar riqueza para a sociedade. Tratava-se de um comerciante português e o imóvel, de rica história, também apresenta uma das escadarias mais conhecidas da cidade.

O imóvel tem a fama de “amaldiçoado” pois, de acordo com lenda, tudo ocorreu a partir da morte de um dos filhos de Pádua. Uma das escravas do comerciante foi acusada do crime e, dizem os mais especialistas, que a mesma teria “chorado” muito no palácio.

A configuração antiga do Palácio das Lágrimas foi destruída, e o prédio reerguido na década de 1920. Inicialmente, o local recebeu a Escola Modelo Benedito Lei­te. Na década de 1950, passou a abrigar a Faculdade de Farmácia e Odontologia.

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Degraus de acesso para a saúde: a escadaria do Português
Inaugurado em 31 de outubro de 1869 – de acordo com o acervo histórico do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) –, o Hospital Português de São João de Deus (ou Hospital Português) – foi construído para atender à comunidade lusitana do estado. No início do século XX, para quem frequentava o centro antigo ludovicense, tratava-se de uma das escadarias – situada no caso da construção lusa no hall de acesso à recepção – mais belas daqueles tempos.

Por estas escadas, passaram - por exemplo - pacientes que eram atendidos por antigos médicos portugueses. Pertencente à antiga Quinta do Monteiro, a casa aproveitada pela direção do hospital – e em consequência a escadaria famosa – estava fixada em uma das ruas mais frequentadas da cidade.

A escadaria tornou-se elemento constitutivo de um imóvel feito com influência fortemente europeia. Na fachada, vê-se ainda o nome da instituição grafado com a ortografia lusitana (“Hospital Portuguez”). Acima do nome, há o brasão de Portugal e citações a escritores, como Luís de Camões, por exemplo.

De acordo com pesquisadores, a escadaria precede a porta principal confeccionada em ferro e vidros coloridos. O acesso em degraus, pensado pela antiga direção da unidade, faz parte da simetria da entrada principal, cujo desfecho se dá com as janelas laterais. Atualmente, as escadarias “se perdem” em meio à configuração do estacionamento da unidade de saúde.

Acesso à educação e saber: a escadaria da Biblioteca Benedito Leite
Com estilo neoclássico e traços de construção marcantes, a Biblioteca Pública Benedito Leite também apresenta para contemplação uma das escadarias mais citadas por quem preserva o patrimônio público. Considerada por vários pesquisadores a segunda mais antiga do Brasil, a construção foi criada ainda no período imperial, mais especificamente – de acordo com pesquisa do IBGE – em 29 de setembro de 1829.

A partir do esforço de intelectuais que, na primeira metade do século XIX – queriam provar o valor intelectual do país – a biblioteca foi aberta a público somente em 1831, sempre com a configuração de acesso pelos marcantes degraus. Além das escadarias, os elementos mais marcantes da construção são a cúpula central, as alas semicirculares e o vão de janelas.

De acordo com informações do Governo do Maranhão – administrador atual do prédio – a biblioteca possui aproximadamente 127 mil peças em seu acervo, entre obras de arte, coleções de jornais maranhenses, manuscritos do século XVIII, livros, revistas, jornais, fotografias, microfilmes, dentre outros objetos.

Beleza contrasta com depredação: a escadaria da Rua João Henrique
Ao lado do antigo Sioge, a escadaria da Rua João Henrique, no Centro, passa às vezes despercebida por quem usa o trecho de acesso ao Mercado Central e adjacências. Trata-se da escadaria com maiores avarias das vistas nesta região da cidade. Sem qualquer conservação, não há, por enquanto, qualquer projeto de recuperação do local.

Moradores que são vizinhos à escadaria lamentam o fato. “Eu moro aqui desde a década de 1960. E poucas vezes a vi assim. Já brinquei aqui com os meus amigos de bola, de pipa, e vê-la assim, dá pena”, disse seu Sebastião, morador da rua que dá acesso ao Mercado Central e Anel Viário.

[e-s001]A antiga ladeira: a escadaria Humberto de Campos
Fixada ao lado da Rua do Giz, a escadaria da Rua Humberto de Cam­pos serviu de cenário para novelas e tornou-se conhecida, no início do século XX, por ser uma ladeira em vez de escadaria.

O fato é confirmado em pesquisa do IHGM. Registros como o mapa de Justo Jansen corroboram a tese. “Trata-se de uma construção única, pela suntuosidade. E pouca gente sabe que ali já fora uma ladeira”, disse Euges Lima, vice-presidente do IHGM.

Degraus cercados por sobrados: a escadaria da Rua do Giz
Quem pensa em escadaria invariavelmente cita a mais famosa de todas: a escadaria formada por 35 largos degraus em pedra da cantaria da Rua do Giz que, em simbiose com o centro nervoso da parte antiga da cidade, é a estrutura deste tipo com maior número de admiradores. Fixada em um logradouro de concentração significativa de importantes unidades públicas, como o Centro de Cultura Popular Domingos Vieira Filho e o Museu do Folclore e Arte Popular, a escadaria é ponto de encontro, em especial, de jovens que procuram curtir a amizade ou o amor em um dos degraus.

Além dos casarões, a Rua do Giz é cercada por bares e restaurantes, que propiciam a concentração de público na via de acesso à Rua Portugal e à Praça Benedito Leite. Admirar o cenário em um fim de tarde ou início de noite na estrutura é de praxe de grupos, como o do jovem Marcos Paz, estudante de psicologia. “Já fiz algumas amizades nesta escadaria”, confirmou.

Para ele, a escadaria é elemento imprescindível do Centro Histórico da cidade. “É de se admirar que nossa bela cidade, além das construções já conhecidas, também ofereça para o morador este tipo de beleza que são estas escadas que oferecem um verdadeiro cartão-postal para quem por aqui passa”, disse.

De acordo com Ademar Charles, outro jovem frequentador da escadaria da Rua do Giz, trata-se de um lugar marcante. “Aqui, já me reuni com amigos, vi casais namorando, amizades sendo formadas. Se esses degraus falassem”, afirmou. Por falar em casais, quem nunca tirou uma foto para aquele book de casamento nas escadas do Giz? “Fiz vários trabalhos fotográficos nestas escadas. Além de serem belíssimas, o seu entorno também atrai casais para este cenário”, disse o repórter fotográfico de O Estado, Paulo Soares, que lembra da escadaria principalmente como ambiente de trabalho.

[e-s001]A menor em tamanho e rica em empreendimentos: a Escadaria Catarina Mina
Composta por 35 degraus e localizada entre as ruas de Nazaré e Portugal (Trapiche), a escadaria do Beco Catarina Mina possui característica peculiar que as demais não registram com a mesma contundência: a grande presença de estabelecimentos comerciais no entorno da mesma. São várias lanchonetes, lojas de artesanato e de outros produtos que por ali atraem não somente turistas como o público local.

De acordo com a versão mais próxima do oficial, a escadaria é datada do século XVIII e vincula à intervenção portuguesa a sua constituição. Feita de pedra conhecida como lioz, de tipo raro, a escadaria é considerada a mais resistente de todas da cidade.

O tipo de pedra usado é o mesmo que constitui a sacada de igrejas, palácios e chafarizes. “É um tipo de pedra considerado raro e extremamente caro, o que comprova que, no período em que foi feita, o Maranhão apresentava forte poder econômico”, afirmou Euges Lima.

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