Artigo

Crime e castigo

Atualizada em 11/10/2022 às 12h24

Noutro dia escutei o atual ministro da Justiça, Sérgio Moro, verbalizar algo que sempre me passou pela cabeça. Disse o ministro: “Ouço muito que prender custa caro. Que o preso custa muito para o Estado. É verdade, mas quanto custa um criminoso perigoso solto? A solução para o crime não pode ser abrir as portas da prisão em um sistema já leniente. O raciocínio não fecha”.

Talvez, alguns, ao ler o parágrafo acima, gritem: “investe em educação”. Sempre concordei com isso, que a educação de qualidade podia melhorar esse quadro. Contudo, o aumento recente da criminalidade no Uruguai, fizeram-me questionar se a educação sozinha é capaz de promover essa mudança.

Houve um aumento expressivo da criminalidade daquele país, a despeito de que, no ranking internacional de educação, o Uruguai não tem se saído tão mal quando comparado ao Brasil. Tem ficado em segundo lugar, entre os países da América do Sul, só perdendo para o Chile.

A primeira coisa que pensei quando vi esses dados foi que a culpa podia ser atribuída à liberação da maconha. Porém, os estudos demonstram ser prematuro afirmar isso.

Outra possibilidade: desigualdade social. Também não. A pobreza só tem caído no Uruguai: de 21% para 8%, a massa de pobres.

Pois bem, as autoridades uruguaias indicam que a culpa é da mudança legislativa, acontecida em 2017, que tornou o Código de Processo Penal mais “compreensivo” com o crime e, portanto, mais leniente na punição.

Três são as mudanças apontadas, que justificariam o cenário atual: redução do uso da prisão preventiva; o “processo abreviado”, resolvido por negociação entre promotores e advogados de defesa; e a adoção de penas alternativas, com o propósito precípuo de impedir a superlotação nas cadeias.

Hoje, por tudo isso, já se fala no Uruguai em voltar atrás nas mudanças legislativas.

Interessante notar que, esse cenário de maior “compreensão” legislativa é justamente o que vivemos no Brasil: dificilmente o criminoso tem sua prisão preventiva decretada e existe uma preocupação acentuada com a superlotação dos presídios, sem levar em conta os índices alarmantes de crimes.

Para piorar, no Brasil, poucos são os inquéritos concluídos com a identificação do criminoso (8 em cada 100), logo, há muitos criminosos soltos.

Em “Crime e Castigo”, obra monumental de Dostoiévski, o protagonista, Raskonlnikov, mata duas pessoas, e por se achar um “homem extraordinário” via-os como crimes justificáveis. Todavia, foi consumido pela culpa, levando-o à insanidade.

Na atualidade, ao que parece, pela ficha corrida de muitos, não se fazem mais criminosos como Raskonlnikov, com consciência. Assim, se continuarmos com essa leniência legislativa, acredito que o crime só crescerá, como demonstra o Uruguai.

Que se melhore a educação, porque só quantidade não resolve, e que se diminuam os índices de pobreza, mas vamos prender quem merece ser preso. Insegurança gera perda de investimentos, que, por sua vez, gera desemprego e pobreza.

Sônia Maria Amaral Fernandes Ribeiro

Juíza de Direito

E-mail: sonia.amaral@globo.com

Leia outras notícias em Imirante.com. Siga, também, o Imirante nas redes sociais Twitter, Instagram, TikTok e canal no Whatsapp. Curta nossa página no Facebook e Youtube. Envie informações à Redação do Portal por meio do Whatsapp pelo telefone (98) 99209-2383.