Artigo

Demurrage: um fato jurídico e o horizonte oportunidades

Atualizada em 11/10/2022 às 12h24

Em 21 de maio de 2019, a 4ª Câmara Cível do Tribunal Justiça do Estado do Maranhão, composta pelos desembargadores Paulo Velten (presidente) e Jaime Ferreira, seguindo voto do relator, desembargador Marcelino Everton, singrou mar da incerteza, descortinou horizonte de dúvida e trouxe fundamentos jurídicos sólidos em julgamento inédito.

A temática? Demurrage de contêiner. Em linhas gerais, o termo é utilizado para denominar a cobrança pelo uso além do período de tempo acordado (laytime), gerando custos ao remetente ou destinatário, para além das despesas ordinárias como contêiner yard, taxas portuárias e de cais, frete marítimo.

Simplificadamente, trata-se de posse prolongada que tisna cláusula contratual de transporte. A temática avança pelos tribunais em decorrência da expansão do uso na logística de transportes, associado a problemas relativos ao desembaraço aduaneiro, gargalos portuários, bem como ao constatar-se que a natureza jurídica do instituto e a extensão da aplicação das normas em relação aos contêineres de transporte também não estão pacificadas.

O cenário de ebulição conceitual e finalística, conexo a redação de contratos imperfeitos, que deixam de delimitar com precisão o que é lei entre as partes, desaguam nos mares revoltos dos Tribunais brasileiros. No Maranhão, ante a timidez do setor no âmbito do Porto do Itaqui - segundo dados da EMAP - movimentou no ano de 2018 singelos 12 TEUs e em 2017 nenhum - os debates jurídicos suscitados ainda são embrionários.

Ao realizar busca pela jurisprudência do TJMA constatou-se que, muito embora estejamos diante de setor portuário tão imponente - para não dizer um dos mais importantes do país -, a temática é pouco usual. Contudo, verifica-se que mesmo com os poucos julgados já proferidos na seara marítima, estes seguem a toada dos entendimentos majoritários dos demais tribunais nacionais ao considerar a cobrança de demurrage legal, ressalvando as hipóteses de valores abusivos ou imputação do pagamento da sobre-estadia ao despachante aduaneiro.

Questiona-se a razão pela qual o Itaqui, com sua destacada localização geográfica e sendo o maior porto público do Brasil em profundidade apto, portanto, a receber navios cargueiros, não está inserido na rota dos contêineres? A resposta, talvez, resida na tese do equilíbrio entre carregamento e descarregamento da embarcação, ou seja, deve-se fomentar a exportação de produtos nacionais pelo Itaqui, evitando-se o chamado “frete morto” (dead freight), tornando a operação de contêiner economicamente viável e, consequentemente, atrativa.

Em tempo, destaca-se que, historicamente, duas cadeias concentram o volume de cargas movimentadas pelo Brasil: a produção de grãos - (exportação de soja e milho) - e os produtos petrolíferos (importação de diesel e gasolina). Neste contexto, o Porto do Itaqui é versado como “porto especializado”, vocacionado para movimentação de granéis sólidos e líquidos, destacando-se soja e milho (em virtude do investimento do Terminal de Grãos do Maranhão - TEGRAM) e celulose, assim como movimentação de fertilizantes e combustíveis.

Considerando a vocação maranhense na produção de soja e milho, quiçá fosse viável, como saída imediata para implementação de rota de contêineres, que o Itaqui operasse como já fez o Porto do Rio Grande, usando o contêiner também como meio de transporte da soja voltado para pequenos importadores e exportadores, com custo reduzido do frete marítimo e mais agilidade no envio.

É uma nova perspectiva que se desenha: a da exportação sob medida, que atende ao mercado, alcança novos elos da cadeia e contorna deficiências estruturais, agilizando o escoamento da produção. E, por outra via, acende espaço para o Porto Itaqui avançar na configuração de um porto multifuncional.

Se o mundo pertence a quem se atreve, como dizia Charlie Chaplin...

Anna Graziella Santana Neiva Costa*

*Advogada, Pós-Graduada em Direito Constitucional e em Ciência Jurídico-Políticas; MBA em Direito Tributário; Pós-Graduanda em Direito Eleitoral; Mestranda em Ciências Jurídico-Políticas

E-mail: annagraziellasnc@hotmail.com

Mariana Costa Heluy**

** Advogada, Especialista em Gestão do Transporte Marítimo e Portos

E-mail: mcheluy@gmail.com

Leia outras notícias em Imirante.com. Siga, também, o Imirante nas redes sociais Twitter, Instagram, TikTok e canal no Whatsapp. Curta nossa página no Facebook e Youtube. Envie informações à Redação do Portal por meio do Whatsapp pelo telefone (98) 99209-2383.