DOAÇÃO DE ÓRGÃOS

MA: fila de espera para transplante de córnea tem 514 pacientes

Abril Marrom, mês de combate à cegueira, é momento para debate acerca do baixo número de doação de córnea em relação à demanda de pacientes

IGOR LINHARES / O ESTADO

Atualizada em 11/10/2022 às 12h25

A atitude, a princípio, parece simples, e é. Mas para grande maioria da população, a doação de córnea ainda é um tabu que, com a alta demanda de pacientes com a visão comprometida, precisa ser quebrado. Atualmente, 514 pessoas integram a fila de espera por um transplante de córnea no Banco de Olhos do Hospital Universitário da Universidade Federal do Maranhão (HU-UFMA). Neste mês, intitulado Abril Marrom – alusivo à campanha sobre a importância da prevenção e combate às diversas causas da cegueira -, especialista destaca a necessidade de se debater, sobretudo, a oportunidade de devolver a visão para pacientes que dependem de uma iniciativa solidária.

Embora o setor de captação do Banco de Olhos do Maranhão tenha tido resultados positivos quanto à doação de córnea nos últimos anos, tem sido evidente, na mesma medida, o crescimento do número de pacientes na fila à espera de um transplante, com o sonho de poder recuperar a visão. Assim, ao ponto que as doações não têm salvaguardado a todos, a realidade de poder zerar a fila de espera é cada vez mais distante. Mas seria o contrário, se os familiares do doador em potencial, com óbito declarado, se dispusessem ao ato solidário, uma vez que a captação do órgão só é permitida com a devida autorização da família.

Consciência
De acordo com a médica oftalmologista e responsável técnica pelo Banco de Olhos do HU-UFMA, Roberta Farias, há a necessidade de muitas famílias terem consciência da vontade do doador em potencial – que deve, naturalmente, avisar aos familiares sobre o desejo de doar –, bem como se sensibilizarem com a realidade de muitos que lotam a fila na expectativa de conseguirem ser beneficiados com um transplante de córnea – procedimento capaz de devolver a visão acometida por doenças que levam à cegueira.

“Atualmente, o paciente na fila do Banco de Olhos do Hospital Universitário Presidente Dutra [da UFMA] espera, em média, dois anos por uma doação. Até o momento, temos 514 pessoas esperando para a realização do transplante, espera esta que poderia ser reduzida se não estivesse faltando conscientização de todos, porque o Banco de Olhos não trabalha sozinho, mas em parceria com os profissionais da área da saúde, de outras instituições, como o IML [Instituto Médico Legal], e com a sociedade – que é a parte mais importante” dessa tríade, explicou a oftalmologista.

“Existem, na verdade, duas filas: a fila do transplante eletiva e a de urgência. O transplante de urgência é requerido por todo aquele paciente que não pode esperar pelo período de dois anos para realizar o transplante, porque se esperar perderá o olho. Esses pacientes de urgência são aqueles que não tem mais a córnea ou quando ela já está muito perfurada, ao ponto de incluí-lo no ranking nacional, ou seja, ele pode receber córnea de todo o Brasil”, explicou, por fim. “Crianças, menor de oito anos de idade, que estejam com uma mancha na córnea de forma bilateral, também são pacientes urgentes”.

Barreira
Segundo a médica, a impossibilidade de zerar a fila se dá pela falta de informação, uma vez que muitas pessoas consideram a doação de órgãos um tabu, e acabam por rejeitar a tentativa da equipe médica em captar o órgão saudável, de um ente que teve óbito declarado, que pode beneficiar algum paciente da fila de espera. No caso da córnea, em específico, o doador e receptor não precisam da compatibilidade para se efetivar o transplante, basta apenas que a córnea tenha qualidade garantida para beneficiar o paciente a ser transplantado.

“Não há necessidade do doador ser parente do receptor e de pertencer ao mesmo grupo sanguíneo. Ou seja, um homem pode doar para uma mulher, ou para uma criança, de menor ou maior idade, não exigindo nenhuma compatibilidade de qualquer fator”, explicou. “É válido ressaltar que, por incrível que pareça, a maior parte dos doares de córnea são pacientes idosos, de mais idade, enquanto os jovens são os que menos doam”, fato que se dá, ainda segundo Farias, pela não aceitação da família à perda, que fica irredutível à possibilidade de conceder a transferência de órgãos do parente com óbito declarado.

De acordo com uma pesquisa realizada pela Associação Brasileira de Transplantes de Órgãos (ABTO), no ano passado, a negativa familiar é o principal motivo para que um órgão não seja doado no Brasil. No caso da doação de córnea, o paciente com óbito declarado pode ter sido vítima de qualquer causa e não necessariamente estar em processo de morte encefálica para que a córnea possa ser transferida.

Abril Marrom
O marrom, cor que dá nome ao movimento, foi escolhido por ser a da íris, predominante nos brasileiros, e ser o órgão responsável por controlar a entrada de luz nos olhos.

Para a técnica responsável pelo Banco de Olhos do HU-UFMA, a campanha “Abril Marrom” é importante não só para debater acerca de doenças que podem levar à cegueira, mas pôr em voga casos em que pacientes ficaram com deficiência visual reversíveis, mas que esperam pelo tão sonhado transplante de córnea, cada vez mais demorado. “Muitas pessoas têm tabu quanto à doação de órgãos, e é preciso que isso seja quebrado. O fato de querer preservar a história daquele ente querido que faleceu deveria ser reflexo para boas ações como as de doar as córneas deste doador em potencial, que teve óbito declarado”, destacou.

Estima-se que hoje, no Brasil, cerca de 1,2 milhão de pessoas sofram de cegueira. No entanto, segundo dados da Organização Mundial de Saúde (OMS), 60% a 80% dos casos poderiam ser evitados ou tratados. Diabéticos, crianças, adultos acima de 40 anos e idosos, acima de 60 anos, devem ter maior atenção aos cuidados com a visão. As doenças mais comuns que podem causar cegueira são catarata, retinopatia diabética e glaucoma.

Em casos de doenças como ceratocone, edemas de córnea e outros traumatismos na córnea, por exemplo, podem levar a uma cegueira reversível a partir do transplante do órgão.

SAIBA MAIS

Funções da córnea

Desempenha papel fundamental na formação da visão. Transparente, funciona como uma lente sobre a íris (parte colorida do olho), focando a luz da pupila na direção da retina. As lágrimas (secreção lacrimal) mantêm a córnea úmida e saudável. Para o bom funcionamento da córnea é necessário que a mesma tenha transparência satisfatória e curvatura adequada. Se há perda de sua integridade, ela se torna embaçada, desfocada e a luz passa a não alcançar a retina, prejudicando sensivelmente a visão e provocando diversos transtornos que prejudicarão o paciente no desenvolvimento das suas atividades diárias, podendo até mesmo ocasionar a perda completa da visão.

O que é um transplante de córnea?

O transplante consiste na substituição da córnea opaca ou doente por uma córnea doada sadia, a fim de melhorar a sua visão ou corrigir defeitos oculares que ponham em risco a anatomia ou a função do olho. Pode ser substituída a espessura total (penetrante) ou parcial (lamelar). É um procedimento cirúrgico que pode ser realizado em caráter ambulatorial, não sendo necessária a hospitalização do paciente.

Qual a possibilidade de melhora da visão?

Transplante de córnea pode proporcionar uma melhor qualidade de vida. A cirurgia apresenta alta porcentagem de sucesso. Normalmente, varia entre 80 e 90% de sucesso em situações não complicadas (de acordo com estatísticas mundiais). Em casos complicados, a taxa de sucesso pode diminuir, dependendo da complexidade e da patologia. A boa qualidade da córnea doada e a adequada manutenção do enxerto até sua utilização são de fundamental importância para um bom prognóstico visual final.

Quem pode doar?

Pacientes que tiveram morte por parada cardíaca inferior a 6 horas ou morte encefálica, com idade acima ou igual a 2 anos e abaixo de 80.

Podem doar os pacientes que:

– Tenham miopia, hipermetropia e astigmatismo
– Tenham tido conjuntivite, mas já foram curados
– Usem óculos ou lentes de contato
– Tenham algum câncer que não seja leucemia, linfoma ou câncer no olho

Contraindicações para a doação:

– Linfomas ativos e leucemias
– Hepatites B e/ou C
– HIV (AIDS)
– Infecção generalizada
– Morte de causa desconhecida
– Raiva

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