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Em Israel, Bolsonaro diz que nazismo foi de esquerda

Em Israel, presidente respalda afirmação de chanceler, contestada por historiadores e pela Alemanha; um dos compromissos ontem foi a visita visita ao Yad Vashem, o museu mundial do Holocausto

Atualizada em 11/10/2022 às 12h25
Bolsonaro deposita uma coroa de flores no Hall do Memorial do Holocausto
Bolsonaro deposita uma coroa de flores no Hall do Memorial do Holocausto (AFP)

JERUSALÉM - O presidente Jair Bolsonaro fez ontem, 2, eco às declarações do ministro das Relações Exteriores, Ernesto Araújo, ao afirmar que "não há dúvida" de que o nazismo foi um movimento de esquerda, durante entrevista a jornalistas em Israel. Para embasar seu argumento, o presidente procurou lembrar o nome oficial do Partido Nazista.

"Não há dúvida, né? Partido Socialista, como é que é?", respondeu Bolsonaro quando indagado por um repórter se concordava com a declaração de Araújo, dada recentemente e posteriormente reiterada, de que o nazismo, que governou a Alemanha de 1933 a 1945, quando o país foi derrotado na Segunda Guerra Mundial, era um movimento de esquerda.

"Partido Nacional Socialista da Alemanha", completou o presidente ao ser lembrado do que seria o nome oficial do partido nazista, de Adolf Hitler. Na verdade, o nome completo era Partido Nacional-Socialista dos Trabalhadores Alemães.

Museu explica origem

Um dos compromissos de Bolsonaro em sua visita a Israel foi uma visita ao Yad Vashem, o museu mundial do Holocausto, quando 6 milhões de judeus foram assassinados pela Alemanha nazista de Hitler. O site do museu traz a história do Holocausto e a ascensão do nazismo da Alemanha. De acordo com o site, o Partido Nazista teve origem em grupos radicais de direita.

"Hitler e o Partido Nazista chegaram ao poder devido a circunstâncias sociais e políticas que caracterizaram o período entre guerras na Alemanha. Muitos alemães não podiam admitir a derrota de seu país na Primeira Guerra Mundial, argumentando que 'traições' e a fragilidade na retaguarda paralisaram e, eventualmente, causaram o colapso na frente de batalha", afirma o museu em seu site em um texto em inglês.

"Essa frustração, junto com a resistência intransigente e alertas sobre a crescente ameaça do comunismo, criou solo fértil para o crescimento de grupos radicais de direita na Alemanha, gerando entidades como o Partido Nazista".

Em entrevista ao GLOBO em outubro do ano passado, o embaixador alemão no Brasil, Georg Witschel, também contesta a relação entre o nazismo e movimentos de esquerda, afirmando que "isso não é fundamentado, é um erro, é simplesmente uma besteira".

"É um consenso entre os historiadores da Alemanha e do mundo que o nazismo foi um movimento de extrema direita", afirmou Witschel, reforçando que é um fato "bem fundamentado".

Witschel explicou que o uso da palavra “socialismo” no nome do partido nazista - Partido Nacional Socialista dos Trabalhadores Alemães - foi uma estratégia para apelar “a trabalhadores e setores pobres da população”.

"Lembremos de quantos regimes brutais usam a palavra “democrata” em seu nome", disse.

Olavo e Araújo

A tese de que o nazismo foi de esquerda tem sido defendida pelo atual chanceler brasileiro desde antes de ele assumir o cargo. Ela é defendida também pelo guru da direita e do bolsonarismo, Olavo de Carvalho. No dia 17 de março, Araújo deu uma entrevista a um canal de rede social em que voltou a repetir que o nazismo foi fruto de uma manipulação do nacionalismo - para ele algo positivo - pela esquerda.

A teoria do ministro repercutiu mal na principal emissora de TV pública da Alemanha, a Deutsche Welle. Em texto publicado na quinta-feira, na versão do seu site em português, a emissora diz que esse é o "absurdo que virou discurso oficial em Brasília". "A estratégia de tentar classificar o nazismo como uma ideologia de esquerda não é nova e chegou a ocorrer no passado em vários países. Mas nunca chegou a virar um debate sério entre especialistas", diz o texto.

O artigo da Deutsche Welle ouve, entre outros, o historiador Wulf Kansteiner, da Universidade de Aarhus, que deixa claro que os nazistas jamais seguiram políticas de esquerda.

"Ao contrário, propagavam valores da extrema direita, um extremo nacionalismo, um extremo antissemitismo e um extremo racismo. Nenhum especialista sério considera hoje o nazismo de alguma forma um fenômeno de esquerda. Por isso, da perspectiva acadêmica histórica, essa declaração é uma asneira", afirma Kansteiner.

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