Nova derrota

Parlamento britânico rejeita acordo do Brexit pela 3ª vez

Reprovação do documento por parlamentares britânicos deixa o Reino Unido cada vez mais próximo de abandonar o bloco em 12 de abril sem estabelecer os parâmetros para o período de transição ou para sua futura relação com os antigos parceiros

Atualizada em 11/10/2022 às 12h25
Parlamentares britânicos se reuniram para votação de acordo do Brexit e impuseram derrota ao governo
Parlamentares britânicos se reuniram para votação de acordo do Brexit e impuseram derrota ao governo (AFP)

LONDRES - A data originalmente marcada para o adeus oficial do Reino Unido à União Europeia, os parlamentares britânicos rejeitaram, na sexta-feira, 29, pela terceira vez, o acordo negociado pela primeira-ministra do país, Theresa May, com o bloco europeu. Por 344 a 234, o Parlamento impôs nova derrota ao governo, que agora terá duas semanas para evitar o caos de uma saída sem regras de transição. Três anos depois de o Brexit ter sido aprovado em consulta popular, por 52% a 48% dos votos, o impasse deixa o Reino Unido à deriva, com poucas alternativas para evitar uma ruptura abrupta com o bloco do qual faz parte desde 1975.

Depois que o acordo de transição que negociou durante dois anos foi rejeitado duas vezes pelo Parlamento - graças principalmente ao voto de parlamentares eurocéticos do seu Partido Conservador, que querem romper todos os laços com a UE - , May pediu à União Europeia um adiamento da data de saída. Os líderes europeus lhe ofereceram duas opções: aprovar o acordo em uma terceira votação nesta semana e sair ordeiramente em 22 de maio, ou sair em 12 de abril, em princípio sem acordo de transição.

Com a nova rejeição, porém, May ainda poderá pedir um novo adiamento à União Europeia, que provavelmente decidirá sobre o pleito em uma cúpula em 10 de abril, na qual imporá condições para atender o pedido. Derrotada, May frisou aos parlamentares que teme que o país esteja "perto do limite" do processo. Ela advertiu que uma extensão do prazo da ruptura precisará do apoio de todos os 27 países da UE.

"Esta Casa rejeitou um Brexit sem acordo, rejeitou não ter Brexit, na quarta-feira rejeitou todas as variações do acordo que estavam sobre a mesa. E hoje rejeitou aprovar o acordo de retirada e continuar o processo no futuro. Este governo continuará a buscar o Brexit ordenado que o resultado do referendo demanda", destacou May, ao anunciar que, a partir de segunda-feira, 1º de abril, buscará uma "abordagem alternativa" no processo.

Além dos conservadores eurocéticos, o acordo de transição negociado por May sofreu resistência da oposição trabalhista e do DUP, o partido dos protestantes norte-irlandeses que faz parte de sua coalizão de governo e garante sua maioria parlamentar. Os trabalhistas, embora divididos, gostariam de manter relações mais próximas com a UE do que previsto no acordo, e os norte-irlandeses se opuseram às regras do chamado "backstop", previstas no pacto para evitar que fossem impostos controles alfandegários entre a Irlanda do Norte e a República da Irlanda, que será a única fronteira terrestre entre o Reino Unido e a UE depois do Brexit.

Problema

Na votação de sexta, 29, May enfrentava mais um problema. Ela foi avisada pelo Parlamento de que, legalmente, não poderia submeter um projeto à votação pela terceira vez na mesma sessão legislativa. Por isso, teve que fatiar o texto acordado com a UE. A premier submeteu à votação apenas o Acordo de Saída de 585 páginas, no qual estavam expressas as regras de transição que deveriam vigorar até o final de 2020. Deixou de fora a Declaração Política de 26 páginas sobre as relações futuras de Londres com o bloco europeu.

A divisão da classe política britânica sobre o Brexit ficou clara na terça-feira, quando, depois de anunciarem que tomariam as rédeas do processo, os parlamentares britânicos foram incapazes de aprovar por maioria qualquer ao alternativa ao acordo negociado por May, incluindo a possibilidade de um novo referendo sobre a saída da UE.

Para convencer os eurocéticos dentro do seu partido, May então jogou uma última cartada: prometeu renunciar ao cargo se, desta vez, o acordo com a UE fosse aprovado, dando lugar a uma nova liderança conservadora. Antes da votação, o procurador geral britânico, Geoffrey Cox, disse aos parlamentares que se tratava da "última oportunidade" de garantir que o processo fosse estendido até 22 maio sem que os 27 líderes europeus tivessem poder de veto para isso.

Enquanto os parlamentares se preparavam para votar, manifestantes pró -Brexit marchavam nas ruas de Londres. Com cartazes e bandeiras britânicas, destacavam que adiar o processo seria trair a decisão do povo, que escolheu, em maioria, deixar a UE. "O mundo está de olho", dizia um dos cartazes. "May traidora", criticava outro. No último sábado, manifestantes contrários à cisão do bloco saíram às ruas com bandeiras europeias e pediram a manutenção dos laços com os vizinhos.

Rejeição

Na primeira vez que foi levado ao Parlamento, em 15 de janeiro, o acordo apresentado pela primeira-ministra foi rejeitado por acachapantes 432 votos a 202. Já na segunda tentativa, em 12 de março último, com alterações cosméticas negociadas com os líderes da UE, a diferença foi menor, mas ainda significativa: 391 contra e 242 a favor. Neste contexto, May precisava convencer até esta sexta-feira ao menos 75 parlamentares de seu próprio partido ou coalizão a mudarem de posição. O risco da manobra era claro, já que ela manteve em votação o "backstop".

"O mesmo problema continua", destacou o DUP, antes da votação, em referência a estas regras, ao confirmar que seus dez parlamentares rejeitariam o acordo pela terceira vez. Na tribuna, o líder trabalhista Jeromy Corbyn reiterou as críticas à negociação "inaceitável" de May — alguém que, segundo ele, "falhou" em concretizar o desejo popular. Na sequência, a minutos da deliberação, May exortou os parlamentares a enxergarem "as escolhas difíceis" que enfrentam no momento e aprovarem o texto fatiado para evitar uma saída do bloco "à beira do penhasco".

"O Parlamento rejeitou qualquer opção até agora. Esta é a última oportunidade de garantir o Brexit. Todos nós que queremos entregar o (desejo popular) voto, se não votarmos pela moção (o acordo), seremos perguntados por que não votamos pelo Brexit", ressaltou a primeira-ministra. "A moção não é um Brexit de olhos vendados, é a garantia de um Brexit".

Sem acordo

A saída da UE sem nenhum acordo, muito temida por empresários e investidores britânicos, foi rejeitada pelos deputados na votação de 13 de março, e e May pareceu descartá-la na segunda-feira. Ainda assim, continua a ser a "opção padrão" se o país atingir o prazo de 12 de abril sem ter aprovado um acordo ou apresentado uma opção alternativa que provavelmente implicaria em um longo adiamento do Brexit.

Do dia para a noite, o Reino Unido acabaria com 46 anos de adesão à UE, abandonando todas as suas leis e acordos, sem um período de transição. As trocas comerciais entre o Reino Unido e o resto da Europa passariam a ser regidas pelas regras básicas da Organização Mundial do Comércio (OMC). May teria que convencer líderes europeus a concedê-la mais tempo para organizar uma estratégia diferente junto ao Parlamento.

Segunda consulta

Muitos deputados pró-europeus defendem a convocação de uma segunda consulta como a forma mais viável de evitar o Brexit. Eles alegam que, em 2016, os britânicos votaram em falsas promessas e que a negociação com Bruxelas mostrou as reais conseqüências da saída da UE. Os opositores desta opção argumentam que a realização de um segundo referendo colocaria em risco a legitimidade do sistema democrático e minaria naqueles que votaram pelo Brexit a confiança nas instituições.

Uma eventual anulação unilateral, no entanto, parece politicamente difícil sem antes haver uma consulta os eleitores. A Justiça europeia determinou que, até que a sua retirada seja concretizada, Londres tem o direito de parar o Brexit unilateralmente. Uma petição lançada na semana passada a esse respeito totalizou 5,7 milhões de assinaturas a favor da interrupção da saída.

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