PROTESTO

Tambor de crioula protesta contra redução de apresentações

Reivindicações foram realizadas na manhã de ontem (28), em frente ao Palácio dos Leões; grupos que tinham até cinco apresentações por dia, neste ano terão apenas uma

MONALISA BENAVENUTO / O ESTADO

Atualizada em 11/10/2022 às 12h26
Grupos de Tambor de Crioula se manifestaram no Palácio dos Leões
Grupos de Tambor de Crioula se manifestaram no Palácio dos Leões (tambor de crioula)

Ao som de tambores e toadas, as saias das coreiras de grupos de tambor de crioula ritmaram-se em forma de protesto, na manhã de ontem (28), em frente ao Palácio dos Leões, sede do Governo do Maranhão, localizado no centro de São Luís. A mobilização foi motivada pelo que os brincantes chamam de “desvalorização da cultura maranhense”, visto que, na programação carnavalesca de 2019, as apresentações do tambor de crioula - que sempre integrou os principais circuítos do período da folia ludovicense - foram reduzidas, estando presente apenas no circuito Madre Deus. Integrantes alegam que a manifestação está sendo desprezada pela Secretaria de Estado da Cultura (Secma).

Segundo os organizadores da brincadeira, apenas uma parte dos grupos participará da folia momesca. Grupos, que costumavam realizar até cinco apresentações por dia, farão apenas uma nos espaços localizados na Madre Deus e na Casa do Tambor de Crioula, localizado no Centro Histórico da capital. Para o coreiro Júnior Catatau, do grupo Arte Nossa, a sensação é de desvalorização da manifestação, tombada, em 2007, pelo Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional (Iphan) como patrimônio cultural imaterial nacional.

“Nós notamos que neste Carnaval, infelizmente, nem 10% dos grupos foram inseridos no auge da festa. Historicamente, nós abrimos todos os pontos, mas neste ano quase não houve apresentações, nem no pré-carnaval e muito menos agora, no Carnaval. Tem grupo que pegou muito mal uma apresentação e tem grupo que não pegou nada. Dizem que tem crise de orçamento, mas estão trazendo diversas atrações nacionais e trios elétricos. Não somos contra, mas acreditamos que a cultura local deva ser valorizada”, reivindicou.

Os representantes afirmaram que, dos 95 grupos maranhenses, 60 foram credenciadas pela Sectur para o “Carnaval de Todos 2019”. No entanto, um sorteio foi realizado para definir apenas 50 grupos para participarem do circuito. Para o presidente da Federação Maranhense de Tambor de Crioula, Paulinho de Matos, é necessário que a Secma dialogue com mais frequência com os grupos culturais do estado, para que, assim, não haja beneficiamento de uns em detrimento de outros.

“Nós queremos ganhar, pelo menos, mais duas ou três apresentações para equiparar com a tribos de índios, que têm quatro pelo estado. Não nos sentimos valorizados e com o devido respeito por parte da secretaria. Precisamos ser mais enxergados pelo poder público. Nos dispusemos para que ele nos receba para dialogar e discutir sobre a política estadual de cultura, de forma que os grupos sejam valorizados de forma igualitária e justa. Afinal, temos mais de dois séculos de história e somos unicamente do Maranhão”, reforçou Matos.

Por meio de nota, a Secma informou que reconhece a importância da preservação e difusão do tambor de crioula. Por isso, mantém programação semanal permanente (sempre às quartas-feiras) de apresentação de grupos deste segmento na Casa do Tambor de Crioula desde o mês de agosto de 2018.

O tambor de crioula também ocupa posição de destaque na programação do Carnaval de Todos 2019, com a participação de grupos todos os dias de folia momesca no Circuito Madre Deus, totalizando 50 grupos participantes. Por fim, a secretaria esclareceu que o circuito Beira-Mar é destinado para outro segmento cultural, os blocos de trio.

Breve histórico
O Tambor de Crioula do Maranhão é uma forma de expressão de matriz afro-brasileira que envolve dança circular, canto e percussão de tambores. Seja ao ar livre, nas praças, no interior de terreiros, ou associado a outros eventos e manifestações, é realizado sem local específico ou calendário pré-fixado e praticado especialmente em louvor a São Benedito. Essa manifestação afro-brasileira ocorre na maioria dos municípios do Maranhão, envolvendo uma dança circular feminina, canto e percussão de tambores. Dela participam as coreiras ou dançadeiras, conduzidas pelo ritmo intenso dos tambores e pelo influxo das toadas evocadas por tocadores e cantadores, culminando na punga ou umbigada – gesto característico, entendido como saudação e convite.

Inscrito no Livro das Formas de Expressão, em 2007, esse bem imaterial inclui-se entre as expressões do que se convencionou chamar de samba, derivadas, originalmente, do batuque, assim como o jongo no Sudeste, o samba de roda do Recôncavo Baiano, o coco no Nordeste e algumas modalidades do samba carioca. Além de sua origem comum, constatam-se, entre essas expressões do samba, traços convergentes na polirritmia dos tambores, no ritmo sincopado, nos principais movimentos coreográficos e na umbigada.

Praticado livremente, seja como divertimento ou em devoção a São Benedito, o Tambor de Crioula não tem local definido, nem época fixa de apresentação, embora se observe uma maior ocorrência desse evento durante o Carnaval e nas manifestações de Bumba-meu-boi. Trata-se de um referencial de identidade e resistência cultural dos negros maranhenses, que compartilham um passado comum. Os elementos rituais do Tambor permanecem vivos e presentes, propiciando o exercício dos vínculos de pertencimento e a reiteração de valores culturais afro-brasileiros.

A dança do tambor de Crioula, normalmente executada só pelas mulheres, apresenta coreografia bastante livre e variada. Uma dançante de cada vez, faz evoluções diante dos tambozeiros, enquanto as demais, completando a roda entre tocadores e cantadores, fazem pequenos movimentos para a esquerda e a direita, esperando a vez de receber a punga e ir substituir a que está no meio. A punga é dada geralmente no abdômen, no tórax, ou passada com as mãos, numa espécie de cumprimento. Quando a coreira que está dançando quer ser substituída, vai em direção a uma companheira e aplica-lhe a punga. A que recebe, vai ao centro e dança para cada um dos tocadores, requebrando-se em frente do tambor grande, do meião e o pequeno, e repete tudo de novo até procurar uma substituta.

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