Crime

Quinze estudantes do Colun denunciam professor por assédio

Francicarlos Veras, professor de química, enviava mensagens e usava seu poder em sala de aula para tentar se relacionar com alunas

Emmanuel Menezes / O Estado

Atualizada em 11/10/2022 às 12h26
Alunas e ex-alunas do Colun denunciam professor; não é a primeira vez que docente foi acusado de assédio
Alunas e ex-alunas do Colun denunciam professor; não é a primeira vez que docente foi acusado de assédio (Colun)

SÃO LUÍS - Estudar se tornou um pesadelo para muitas estudantes do Colégio Universitário (Colun). Casos de assédio sexual e moral partidos do professor de química Francicarlos Veras Cardoso acabaram tornando a rotina escolar dessas jovens um stress. No total, 15 alunas e ex-alunas da instituição entraram em processo contra o professor, que continuava a dar aula normalmente no Colun, até a última semana.

Em 2015, o primeiro caso veio à tona na instituição. Uma ex-aluna, que preferiu não se identificar, conta que estava no primeiro ano do ensino médio quando tudo aconteceu. “Após um dia de aula, ele chegou para conversar comigo no Facebook. Lá, ele me enviou mensagens, perguntando se eu tinha gostado da aula e depois disse que havia preparado ela especialmente para mim. Após isso, ele sugeriu de diversas formas que eu deveria encontrá-lo a sós”, diz a jovem. As mensagens, de cunho sexual, propuseram encontros no carro do professor ou, até mesmo, em salas vazias da instituição.

“No dia seguinte, meu pai e eu fomos à Delegacia de Proteção à Criança e o Adolescente [DPCA], e depois ele me levou à escola, onde conversamos com a coordenação. A escola decidiu manter o caso em silêncio, e o professor foi informado sobre o boletim de ocorrência”, conta a menina. Segundo ela, após isso, o professor a chamou para conversar. “Ele tentou me dizer que não era preciso tudo isso, que era preciso apenas dizer não. Mas nesse período eu descobri que ele cometia esse tipo de assédio desde 2011”, completa.

Evitando contato
Desde o exposto pela estudante, mais 14 alunas e ex-alunas tornaram públicas suas queixas contra o professor. Em uma publicação na rede social, outra aluna da instituição contou sobre o caso que sofreu com o professor. “Em uma tarde que passei no Colun, me falaram sobre um professor rigoroso […]. Falaram assim: ‘Se quiser passar de ano, é só ficar com ele’. Fiquei pasma”, publicou. Segundo ela, os comentários sobre assédio por parte do professor já eram correntes, mas ela ainda não havia constatado nada. “Na minha sala, os alunos faziam uma barreira de cadeiras na frente e as meninas sentavam atrás. Qualquer tipo de contato era evitado. A gente ia para a escola com medo e nos dias de aula dele era dia de pânico”, diz.

O caso em questão aconteceu no início de 2018. A aluna conta que o professor, que também é advogado, decidiu criar um grupo com alunos de todas as turmas a que dava aula, com a intenção de comentar sobre política. A aluna se queixa, ainda, de que Francicarlos começou a tirar pontos dos alunos que não tinham a mesma opinião que ele. “Certo dia, ele me chamou do Facebook, falando que eu era linda. Me convidou para sair e pediu meu número. Após isso, nas aulas, ele me marcava.
O pior foi o dia em que eu fui a última a sair da sala. Ele me puxou pelo braço e me chamou para ir para a casa dele”, escreveu.

No decorrer da publicação, a jovem deixa claro que ele tentava usar o poder dele como professor para conseguir algo a mais com as alunas. Jovens foram reprovados e até expulsos de aulas por não concordarem com os ideais ou não aceitarem suas propostas.

Grupos de alunas
Em meados de 2017, alunos do então professor de química reuniram-se, a fim de desmascará-lo, pois já estavam cansados da opressão imposta em sala de aula e do assédio constante para com as meninas. Provas foram reunidas para que algo fosse feito e assim aconteceu: um processo foi aberto contra o servidor e ele, afastado de suas funções. O caso ficou conhecido apenas dentro da Universidade Federal do Maranhão (UFMA), após julgamento realiza­do na Pró-Reitoria de Ensino (Proen), da UFMA, resultando no afastamento do servidor.

No entanto, no início do ano de 2019, o docente retornou à sala de aula. “Estamos nos mobilizando para que esse criminoso pague exemplarmente por seus delitos e assim não faça novas vítimas”, diz uma nota publicada pelo grupo de meninas que já sofreu assédio do professor.

Segundo as jovens, a educação é o único caminho para transformarmos o mundo em que vivemos, e por essa razão todo e qualquer tipo de violência, de intolerância, de opressão não pode ser tolerada. “Por meio desta nota, exigimos um posicionamento do Colégio Universitário, pois foi dentro desta instituição que um dia aprendemos a questionar, a pensar por nós mesmos e ter uma posição, até porque temos a convicção de que quem não se posiciona em situações de injustiça faz-se cúmplice”, completa.

O Estado entrou em contato com a UFMA, para saber as medidas tomadas pela universidade a respeito do caso. Em nota, a Reitoria informa que as providências legais cabíveis no âmbito da instituição já foram tomadas, em atenção aos trâmites previstos para ocorrências dessa natureza.

Em Portaria GR N° 098-MR, assinado na data de 18 de fevereiro pela reitora da UFMA, Nair Portela, foi determinado o afastamento do servidor Francicarlos Veras Cardoso, pelo prazo de até 120 dias. A denúncia, portanto, já está sendo devidamente averiguada por meio do Processo Administrativo Disciplinar.

O Colun e a UFMA reforçam seu compromisso com a verdade e a justiça e reiteram que repudiam veementemente qualquer prática de assédio e que considera essa prática inadmissível em quaisquer circunstâncias e locais.

Caso de polícia
Ciente do caso, a delegada Ana Zélia Gomes, da DPCA, informa que recebeu a mãe de uma das vítimas assediadas pelo professor. “A adolescente em questão foi uma das que recebeu reprovação da escola após a situação ser comunicada a coordenação da instituição. A partir disso, estamos colhendo depoimentos, buscando as demais vítimas e juntando as demais provas para que possamos encerrar este inquérito policial”, explica.
A delegada informa que a Secretaria de Educação já recebeu informações sobre o caso para que tome as medidas cabíveis no seu âmbito.

SAIBA MAIS

VIOLÊNCIA EM NÚMEROS

Com base na análise dos registros da rede pública de saúde dos atendimentos a crianças e adolescentes vítimas de violência sexual, o Ministério da Saúde liberou em julho de 2018 dados que apontam um crescimento de 83% no caso de violência contra menores. Em números, de 13.378 durante o ano de 2011, para 23.456 ao longo de 2017.
Considerando todo o período analisado, o Ministério da Saúde armazenou o total de 591.731 casos de violência sexual contra crianças e adolescentes. A maioria das menores foi vítimas de estupro – sendo 62% dos casos que envolvem em crianças e 70,4% entre adolescentes.
Em segundo lugar, está o assédio sexual, que representa 19,9% dos casos entre adolescentes, e 24,9% entre crianças. Em seguida, está a exploração sexual (3,6% e 2,9%) e pornografia infantil (2% e 3,3%). Entre crianças, mais da metade das vítimas tem até 5 anos de idade (51%) e quase metade, 45%, são negras. Meninas representam 74% das vítimas de 0 a 19 anos.
Quando é analisado o perfil do agressor, 81% são do sexo masculino e 37% tinham algum vínculo familiar com a vítima. O segundo maior agressor era considerado um amigo ou conhecido, com 27%. No caso de adolescentes, 17% dos agressores eram o parceiro íntimo da vítima, mais de 14 mil.

Leia outras notícias em Imirante.com. Siga, também, o Imirante nas redes sociais Twitter, Instagram, TikTok e canal no Whatsapp. Curta nossa página no Facebook e Youtube. Envie informações à Redação do Portal por meio do Whatsapp pelo telefone (98) 99209-2383.