Governo Maduro

Solução para impasse na Venezuela poderá demorar

Principais instrumentos pensados pelos opositores para ganhar apoio militar, anistia e canal humanitário enfrentam percalços; a oposição insiste em sua teoria de que existe um profundo clima de frustração entre os militares, principalmente nas bases

Atualizada em 11/10/2022 às 12h26
O autoproclamado presidente interino Juan Guaidó, durante ato contra o governo Maduro em Caracas
O autoproclamado presidente interino Juan Guaidó, durante ato contra o governo Maduro em Caracas (Reuters)

CARACAS - Nas últimas duas semanas, a oposição venezuelana lançou uma estratégia ousada em sua ofensiva contra o governo de Nicolás Maduro. Foi aprovada uma Lei de Anistia a militares e civis na Assembleia Nacional (AN) e prometida a abertura de um canal humanitário para que entrem alimentos e medicamentos ao país. O plano de governo apresentado na quinta-feira ( 31) pelo presidente da AN e autoproclamado presidente interino da Venezuela, Juan Guaidó, prevê, ainda, "a assistência em massa de organismos multilaterais de crédito".

Os anúncios despertaram entusiasmo, mas cada vez ficam mais claras as limitações que os adversários do chavismo enfrentam para tirar esses planos do papel. Os que acharam que a saída da crise venezuelana era questão de dias (e não foram poucos) já começam a assimilar a ideia de que o processo não será tão simples como parecia.

Os próprios dirigentes da oposição reconhecem que nada será tão fácil como alguns esperavam. No caso da anistia, por exemplo, trata-se de um debate complexo, do qual participam ONG's de defesa dos direitos humanos que já começaram a questionar um eventual perdão a militares e civis que tenham participado da repressão.

"Achamos que os passos dados foram corretos, mas é verdade que a proposta ainda não chegou aos militares como esperávamos e, paralelamente, surgiram questionamentos de ONG's", admitiu o deputado Juan Andrés Mejia, um dos homens mais ativos no "governo encarregado" de Guaidó.

Reconciliação

Para ele, "é importante entender que neste momento o essencial é a reconciliação entre os venezuelanos e não a destruição de nossos oponentes".

"Faltam precisões, correções, para que as ONG's entendam que o limite serão as violações de direitos humanos. Esse assunto, no momento, está estagnado. Mas é um dos principais elementos que temos em mãos para conseguir respaldos e provocar fissuras nas Forças Armadas", explicou Mejía.

A oposição insiste em sua teoria de que existe um profundo clima de frustração entre os militares. Principalmente nas bases. O problema, reconhecem, são os mais de 600 generais, assessorados pela inteligência cubana, que bloqueiam o acesso a essas bases e, além disso, estão envolvidos, dizem os opositores, em negócios ilícitos com o governo.

A promessa de abrir um canal humanitário também enfrenta obstáculos. Mejía e outros dirigentes da oposição asseguram "que a ajuda é real, não estamos inventando nada". Mas ainda não está claro como essa ajuda chegará aos venezuelanos que estão vivendo, há anos, uma tragédia social.

Uma das alternativas, talvez a mais forte neste momento, é levar alimentos e medicamentos até a fronteira com Brasil e Colômbia. Sabe-se que o governo brasileiro ajudará, principalmente, com remédios. A questão é saber se os militares venezuelanos permitirão a entrada ou assumirão o custo político de barrar produtos que já não conseguem em seu país, pelo menos não nas classes mais baixas. Uma opção é que ONG's como a Caritas ajudem no ingresso dos produtos. Mas isso, mais uma vez, ainda não está definido.

"Estamos enviando vídeos pelas redes, mostrando que a ajuda existe. Isso busca gerar uma demanda social às Forças Armadas e ao próprio regime. Claro, para que essa ajuda entre de forma expressiva é necessário a recuperação da democracia", frisou Mejía.

Questão humanitária

Na sexta ( 1º), representantes da AN se reuniram com a Conferência Episcopal da Venezuela (CEV), para pedir a ajuda da Igreja na resolução da questão humanitária. Também estariam sendo contactadas ONG's como a Médicos sem Fronteira e a venezuelana Ação Solidária.

Era esperada uma ajuda contundente das Nações Unidas, mas o deputado admitiu que as coisas não estão acontecendo como a oposição esperava: "Como não somos um país em guerra, nem sofremos um desastre natural, tem sido mais complexo. Somos um país com milhões de dólares mal administrados e a ONU não está deixando claro isso, que esta crise tem uma origem política.

Na visão de Gustavo Tarre Briceño, nomeado representante de Guaidó na Organização de Estados Americanos (OEA), "sem uma mudança de governo a ajuda humanitária chegará até a fronteira".

"Vamos utilizar as ONG's e pressionar, mas a verdade é que não sabemos se dará certo", admitiu.

O autoproclamado presidente interino também anunciou um processo de recuperação da economia, reestruturação da dívida externa e negociação de empréstimos com organismos multilaterais. Alguns opositores como o economista José Guerra, ex-chefe de economistas do Banco Central e deputado da AN, acham que os créditos poderiam ser liberados mesmo com Maduro ainda no Palácio de Miraflores.

"Em todos os organismos temos maioria. Rússia e China não têm poder de veto", afirmou Guerra. No caso da renegociação da dívida, comentou, "já estamos conversando com credores", mas isso sim está condicionado a uma mudança política.

Guaidó e seus colaboradores trabalham em ritmo frenético, comunicam medidas que ainda não podem ser plenamente implementadas e prometem o retorno de uma democracia ferida e golpeada. Foi o suficiente para acordar os que passaram quase dois anos sem protestar, mas ainda parece insuficiente para virar o jogo de vez.

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