Transformação de São Luís

Iluminação: fator importante no desenvolvimento da capital

Com o serviço, São Luís entrou em uma nova era e, ainda que de forma tardia, iniciou sua transição de uma economia agroexportadora para uma mais voltada às técnicas industriais; inicialmente, apenas Sul e Sudeste tinham eletricidade

Thiago Bastos / O Estado

Atualizada em 11/10/2022 às 12h27

No final do século XVIII e início dos anos 1800, o mundo sofreu uma trans­formação nos métodos de produção, com a inclusão na economia mundial, impulsionada pelos interesses ingleses, que foi denominada pelos historiadores de “A Revolução Industrial”. Quase cem anos depois e para se enquadrar na nova tendência do acúmulo e distribuição de riquezas, o Maranhão (e também a capital São Luís) começou a trazer inovações no aspecto tecnológico que se refletiram em transformações no contexto urbanístico. Uma delas foi a inclusão dos serviços de iluminação pública, que modificou a configuração visual de uma cidade que, neste período, ainda tentava se desapegar da tradição rural e migrar para as tendências revolucionárias do mundo.

Porém, essa então novidade demorou para chegar às terras nativas brasileiras, conforme explicita o autor Raimundo Palhano em “A Produção da Coisa Pública”, que trouxe um panorama acerca dos serviços de importância para os cidadãos e ofertados pelas administrações municipais e/ou estaduais. Com base na obra, Palhano cita que em 1879 a iluminação elétrica foi trazida ao território nacional. No referido ano, “o então imperador dom Pedro II inaugurava a iluminação elétrica da Estação da Corte”, ou Estrada de Ferro Central do Brasil, no Rio de Janeiro. Quatro anos depois, o serviço deu início a sua expansão no próprio território carioca, com a inclusão da iluminação na cidade de Campos (RJ).

Antes da ascensão do serviços, de acordo com o professor Leandro Carvalho em artigo intitulado “História da Iluminação Pública no Brasil”, até o final do século XVIII não havia iluminação ofertada pela administração do território no país. O serviço era feito preponderadamente de forma artesanal, com imóveis abastecidos com fontes de sebo e gordura. Anos mais tarde, algumas cidades brasileiras passavam a ser iluminadas com “lâmpadas de óleo e baleia”. No Rio, havia registros de serviço à base de óleos vegetais e animais.

No início do século XX - enquanto outros países contavam com fontes e recursos próprios para a produção deste serviço - no país a potência instalada era de 12.085 quilowatts (o equivalente ao consumo de uma atual TV em cores de 40 polegadas). Em 1930, 30 anos do primeiro registro relevante de reservas energéticas e usadas para os serviços de iluminação de grandes cidades, a potência instalada no país era de 779 mil quilowatts.

Mesmo com o aparente avanço, conforme chancelado por Raimundo Palhano, apenas as chamadas cidades mais desenvolvidas, ou seja, aquelas situadas nas regiões Sul e Sudeste do país recebiam o serviço de iluminação movido por eletricidade, que sucedeu as antigas fontes movidas a gás. O aproveitamento manual de fontes, o trabalho escravo e os meios de transporte animais ainda eram usados nos estados considerados mais pobres, como o Maranhão.

Na primeira metade do século XX, o país - apesar de já se inserir no contexto das grandes produções industriais - ainda não dispunha de condições para concorrer com os grandes centros econômicos. Não havia ainda, por exemplo, fontes energéticas de carvão vegetal e não eram usadas as chamadas máquinas a vapor, mais modernas para o contexto financeiro e que aceleravam os meios de produção, ao retirarem parte da necessidade de intervenção humana.

Poder público disciplina o serviço
Com o passar dos anos, a partir da primeira metade do século XX, o poder público, em especial o Executivo Municipal - com a ascensão da República e instalação dos primeiros governos -, passou a gerir o serviço de iluminação elétrica. Com isso, as administrações locais passaram a manter contatos com grupos estrangeiros, que, geralmente, mantinham os serviços em outros países e iniciavam a internacionalização da inovação.

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Os primeiros grupos estrangeiros que por aqui passaram vinham de países com processos de colonização distintos do sofrido pelo Brasil. Os dois primeiros, ainda segundo a obra “A Produção da Coisa Pública”, foram a Light (empresa canadense) e a American Foreign Power Company (Amforp, norte-americana). Estas, segundo os registros históricos, deram o pontapé às suas atividades no Rio de Janeiro e em São Paulo.

Em São Paulo, segundo cita Raimundo Palhano, o ano oficial do início do serviço foi 1899, quando a empresa passou a receber o nome de “The São Paulo Railway Light and Power Co. Ltd”. Quase vinte anos depois, o grupo se estendeu para o Rio de Janeiro. A Amforp teve a largada das operações no início do século XX e rapidamente se fixou no interior do São Paulo.

À época, o impulso das operações dos grupos estrangeiros no sistema de iluminação elétrica e pública do país também ocorreu por causa da ascensão da produção cafeeira, que colocou o território nacional em posição de protagonismo na economia mundial. A partir de 1927, observando o projeto até então bem-sucedido de exploração e oferta do serviço, outras cidades passaram a contratar os serviços de empreendimentos multinacionais, como Salvador (BA), Recife (PE), Maceió (AL), Natal (RN), Vitória (ES), Niterói (RJ), São Gonçalo (RJ), Belo Horizonte (MG), Curitiba (PR), entre outras.

Com equipes técnicas mais bem-dotadas e maquinários mais modernos, os grupos estrangeiros tiveram preponderância no mercado, mesmo com as tentativas - em sua maioria malsucedidas - de organizações nacionais que ofertavam o serviço. Um destes negócios, conforme citado por Raimundo Palhano, foi o grupo “Gaffrée & Guinle” - organizado no Rio de Janeiro a partir de uma pequena loja de importação de moda francesa.

De acordo com os historiadores, a atuação da “Gaffrée” se concentrou entre os anos de 1909 e 1911. Mesmo diante da concorrência, o empreendimento brasileiro conseguiu se manter, com dificuldades, no mercado. A última tentativa de participação na oferta do serviço foi em São Paulo. Segundo registros locais, a empresa Gaffrée ofertou à administração pública paulistana um serviço pelo preço de 40 réis o quilowatt-hora. O valor era oito vezes menor do que o oferecido pela Light, por exemplo.

Em contrapartida e com proximidade com as autoridades públicas, integrantes da Light conseguiram comprovar que, mesmo com o valor irrisoriamente mais barato do que a da concorrente nacional, o negócio brasileiro não dispunha das condições necessárias para a produção das fontes de energia. A Gaffrée, por exemplo, não apresentou registros de estruturas hidrelétricas, por exemplo.

As provas dos representantes da Light foram tão contundentes que a Câmara de São Paulo reviu o contrato firmado com a Gaffrée, que, por sua vez, conseguiu a revogação da medida pelo próprio Legislativo. Por sua vez, o Executivo não se conformou com a revisão do contrato e retirou todos os direitos e deveres da empresa brasileira.

SAIBA MAIS

Cronograma dos primeiros passos da iluminação elétrica no território nacional

Segunda metade do século XVIII - Sem iluminação, o serviço era feito de forma artesanal, com imóveis com fontes à base de sebo e gordura.
Final do século XVIII - Iluminação com “lâmpadas de óleo de baleia”. No Rio, havia registros de serviço à base de óleos vegetais e animais.
A partir do século XIX - Início e desenvolvimento da Revolução Industrial no país
1879 - A iluminação elétrica foi trazida ao território nacional
1883 - Expansão dos serviços no território carioca
1889 - Início da operação da “The São Paulo Railway Light and Power Co. Ltd”
Início do século XX - Aumento da potência produzida de energia para iluminação públicas
1930 - Potência instalada no país era de 779 mil quilowatts
Final da primeira metade do século XX - Fim da concessão da “Gaffrée & Guinle” em SP

Fonte: “A Produção da Coisa Pública”

Cidades que receberam no país os primeiros serviços de empresas internacionais de iluminação elétrica:
São Paulo (SP), Rio de Janeiro (RJ), Salvador (BA), Recife (PE), Maceió (AL), Natal (RN), Vitória (ES), Niterói (RJ), São Gonçalo (RJ), Belo Horizonte (MG), Curitiba (PR).

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