Alerta

Putin diz que o mundo subestima a possibilidade de guerra nuclear

Em entrevista de quatro horas, presidente russo alerta para nova corrida armamentista e culpa ''russofobia'' por acusação no caso Skripal e sanções do Ocidente; o New Start - acordo que limita o armamento nuclear dos países signatários - expira em 2021

Atualizada em 11/10/2022 às 12h27
Presidente russo Vladimir Putin concede entrevista coletiva em Moscou e critica Washington
Presidente russo Vladimir Putin concede entrevista coletiva em Moscou e critica Washington (AFP)

MOSCOU - O presidente russo,Vladimir Putin , alertou o Ocidente nesta quinta-feira que o mundo enfrenta uma situação "muito perigosa" se os países não iniciarem conversas para renegociar os tratados de controle de armas nucleares. Durante as quatro horas da entrevista coletiva que concede todo final de ano, o líder do Kremlin criticou a decisão dos Estados Unidos de se retirarem do acordo de contenção de ogivas nucleares de curto e médio alcances e de não se engajarem para firmar novos pactos estratégicos do gênero. Para Putin, que acusa Washington de elevarem o risco de um conflito nuclear, tal cenário conduz o mundo a um "precipício muito perigoso".

"Infelizmente, há uma tendência de subestimar a possibilidade de uma guerra nuclear, e esta tendência está inclusive crescendo. Estamos essencialmente testemunhando o rompimento do controle internacional de armas e (o começo) de uma corrida armamentista", ressaltou Putin no evento, em Moscou. — Estamos presenciando a desintegração do controle de armas. O New Start (acordo que limita o armamento nuclear dos países signatários) expira em 2021, e ainda não temos negociações em curso. Não querem falar disso? Está bem. Estaremos a salvo, sabemos como nos proteger.

Desde que Donald Trump anunciou a retirada do país do Tratado sobre Forças Nucleares de Alcance Intermediário, o controle das armas se transformou em um dos pontos de fricção mais urgentes entre Washington e Moscou. O acerto havia sido firmado em 1987 pelo então presidente dos EUA Ronald Reagan e o secretário-geral do Partido Comunista da antiga União Soviética Mikhail Gorbachev. A cisão do pacto motivou preocupação no resto dos atores da geopolítica global.

Acusação

Ontem, Putin acusou Washington de arriscar a segurança do mundo ao abandonar os acordos estratégicos armamentistas. "É difícil imaginar o que vai acontecer. Se estes mísseis (dos EUA) aparecerem na Europa, teremos que garantir que estamos seguros. Não estamos lutando por uma vantagem, mas sim, por igualdade, por paridade, para garantir nossa segurança", argumentou o presidente russo diante das 1,7 mil pessoas presentes no auditório; jornalistas, em sua maioria.

Putin, que destacou a importância de normalizar as relações com Trump, assegurou ainda que Washington tem considerado o uso de mísseis balísticos com ogivas convencionais. O lançamento de um míssil do tipo poderia ser confundido com um nuclear, destacou o chefe do Kremlin, e isso poderia provocar uma catástrofe global. "Se isso ocorre, pode significar a destruição de toda a civilização e ser, inclusive, o fim do nosso planeta", alertou o líder russo.

Apesar do tom crítico de alerta, Putin acenou à retomada do contato com Trump. Ressaltou que o Ocidente "não quer reconhecer a vitória" do republicano nas eleições em uma "falta de respeito" com os eleitores do país. Além disso, o presidente russo, que apoia o ditador Bashar al-Assad, concordou com a avaliação do líder americano de que o Estado Islâmico foi derrotado na Síria e apoiou a retirada das tropas americanas na região - cuja presença considerou "ilegítima" - conforme anunciado pelo americano nesta quarta-feira.

A entrevista coletiva anual de Putin se transformou em um espetáculo de perguntas e respostas, no qual o presidente russo reforça seu discurso geopolítico, enquanto jornalistas tentam chamar sua atenção para obter a palavra. Os profissionais disputam a vez com cartazes e bandeiras nas mãos e trajes regionais no corpo no evento, que ocorre pela 14ª vez.

Prisão de ucranianos

Durante a entrevista, o líder russo voltou a justificar a prisão de marinheiros ucranianos pelo que chamou de "provocação" dos militares no Mar de Azov. Segundo ele, a conclusão da investigação da crise marítima permitirá ao país saber o que ocorrerá com os estrangeiros detidos na Crimeia. Putin ressaltou ainda que não entende por que a cidadã russa Maria Butina está presa nos EUA . Na semana passada, ela confessou ter atuado como agente secreta da Rússia para influenciar o governo americano. O presidente frisou que a mulher não recebeu qualquer comando dos serviços de segurança russos.

No evento, o líder do Kremlin evitou se aprofundar no caso do ex-espião Sergey Skripal , envenenado no Reino Unido ao lado da filha, Yulia Skripal. O governo britânico atribui as tentativas de homicídio a agentes do serviço secreto de Moscou, que nega responsabilidade. O incidente estremeu as relações entre os países e motivou a imposição de nova rodada de sanções contra a Rússia e a expulsão de diplomatas do país em várias nações. Putin classificou a reação ao envenenamento como "outro caso de russofobia".

"São movimentos políticos. É apenas uma desculpa para organizar outro ataque à Rússia. Se não houvesse o caso Skripal, teriam inventado algo. O objetivo é muito simples: frear o desenvolvimento da Rússia, vista como uma possível concorrente", apontou o mandatário.

"Vantagem nas sanções"

As sanções impostas pelo caso Skripal se somaram a restrições impostas pelo Ocidente na esteira da anexação russa da Península da Crimeia, em 2014, e pela ingerência do país nas eleições presidenciais dos Estados Unidos, em 2016. As punições econômicas vão desde o bloqueio de importações e exportações de produtos e alimentos ao bloqueio de contas de oligarcas e empresários russos ligados ao Kremlin. A Rússia reagiu com a imposição de suas próprias sanções a outros países.

Embora a economia russa esteja estagnada desde 2014 pela restrições do Ocidente e pela queda nos preços do petróleo, Putin assegurou na entrevista coletiva que as sanções contra a Rússia não surtiram efeito.

"A Rússia, por quase toda a sua história, tem ficado sob este tipo de sanções. Isto tem a ver com o crescimento do poder da Rússia e sua habilidade em competir. Nossa economia se adaptou a estes constrangimentos externos. E veja, há vantagens nesta história de sanções. Isso nos forçou a ligar nos cérebros em relação a várias coisas".

Para Putin, o Ocidente é quem mais sofre com as medidas. "As sanções têm sido contraproducentes para aqueles que as impuseram. Para eles (países ocidentais), é sensível. Veja a Espanha. Lá, eles têm desemprego de 15%. Nós temos uns 3%", ponderou Putin, que diz trabalhar para incluir Moscou entre as cinco maiores economias do mundo.

A Rússia hoje é a 20ª economia do mundo, segundo o Banco Mundial. Putin afirma ter os "meios" para fazê-la subir as 15 posições necessárias ao cumprimento da meta do top 5. O presidente explicou que a economia se contraiu 2,5% depois de 2014, mas atribuiu o fato à baixa do preço do petróleo. O chefe do Kremlin prevê um crescimento de 1,8% ao fim de 2018, embora reconheça que o número possa ficar abaixo disso.

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