Críticas

Trump intensifica ataques ao Judiciário americano

Em meio a escalada de tensão na fronteira com o México, o presidente dos Estados Unidos, Donald Trump, diz que juízes não devem ''legislar sobre segurança''; imigrantes protestam para pedir asilo enquanto militares fazem demonstração de força

Atualizada em 11/10/2022 às 12h27
Imigrantes centro-americanos pedem a autoridades que os deixem pedir asilo nos EUA
Imigrantes centro-americanos pedem a autoridades que os deixem pedir asilo nos EUA (Reuters)

WASHINGTON E TIJUANA — O presidente americano Donald Trump intensificou os ataques ao Judiciário e a decisões judiciais que frearam iniciativas do governo contra a imigração. O republicano pediu que magistrados ou congressistas se engajem contra o que chamou de "decisões horríveis" do 9º Circuito de Cortes de Apelação - responsável pelo bloqueio de ordens restritivas de Trump à chegada de imigrantes e solicitantes de refúgio. Enquanto isso, a tensão na fronteira com o México aumenta, com protestos de imigrantes e exercícios militares dos soldados enviados pela Casa Branca para a região.

No começo da semana, Trump já havia discutido com o presidente da Suprema Corte dos Estados Unidos. Na ocasião, o conservador John Roberts defendeu a independência do Judiciário federal diante das críticas do chefe da Casa Branca a um magistrado que vetou a suspensão dos pedidos de asilo na fronteira sul, por onde caravanas de centro-americanos esperam entrar em solo americano. Chamado por ele de "juiz de Obama", em referência ao ex-mandatário, o juiz distrital Jon Tigar, de fato nomeado pelo democrata, não integra a corte de apelações, alvo principal do republicano.

Questionado em nota pública sem precedentes do presidente da Suprema Corte, Trump renovou a ofensiva contra a Justiça americana. Publicou no Twitter que "juízes não devem legislar sobre segurança na fronteira" e insinuou atribuir aos magistrados desafetos a responsabilidade por eventuais feridos ou mortos em embates.

"Eles não sabem nada sobre isso e estão tornando nosso país inseguro. Nossos grandes profissionais de polícia devem ser autorizados a fazerem seu trabalho! Se não (forem autorizados), haverá tumulto, caos, ferimentos e mortes. Queremos a Constituição como ela está escrita", destacou o presidente, para quem o 9º circuito judiciário é "um total desastre", "está fora de controle" e "tem péssima reputação".

Recursos

Sediado em São Francisco, o 9º circuito recebe recursos de tribunais federais de nove estados da Costa Oeste, incluindo a Califórnia. A Corte decidiu contra Trump em vários casos de alta repercussão, como a proibição de entrada de pessoas de vários países de maioria muçulmana e a tentativa de rescindir um programa que protege da deportação centenas de milhares de imigrantes ilegais que chegaram ao país ainda crianças, os chamados dreamers .

Em entrevista coletiva improvisada em Mar-a-Lago, Trump chamou o tribunal de "um grande espinho em nosso lado" e frisou que "juízes ou Congresso precisam fazer algo para deter isso". O presidente ressaltou que respeita o juiz Roberts, mas repetiu as queixas ao Judiciário e destacou que o 9º distrito era a corte com mais decisões revistas em instâncias superiores. Dados mostram que o 6º circuito da Justiça federal, baseado em Ohio, tem mais deliberações revertidas.

Militares para a fronteira

No último mês, o presidente Trump enviou milhares de militares para a fronteira com o México com a iminência da chegada de milhares de centro-americanos - muitos deles fogem da violência e da miséria e desejam solicitar asilo nos Estados Unidos. O presidente americano fez da aproximação dos estrangeiros, os quais classifica como "invasores", o eixo central da campanha republicana para as eleições de meio de mandato. Passado o pleito, o chefe da Casa Branca não se referiu mais à crise até a divulgação da ordem de suspensão de pedidos de asilo e o poster conflito com o juiz que bloqueou a medida.

"Se chegar a um nível em que percamos o controle ou que pessoas possam ficar feridas, fecharemos a entrada ao país por um período de tempo", afirmou Trump a jornalistas. Nesta semana, ele autorizou nesta semana que militares usam força letal e façam detenções temporárias contra as caravanas. Para críticos, a ordem viola a lei que limita a ação dos militares em ações de segurança interna.

O mandatário tem histórico de investidas contra o Judiciário por decisões que não lhe agradam. Em 2016, em tom de insulto, ele defendeu que o juiz distrital Gonzalo Curiel, nascido e criado em Indiana, não teria condições de decidir com imparcialidade sobre a proposta de construir um muro na fronteira com o México, em vista de seu nome latino.

Durante os quase dois anos de mandato, Trump consolidou a maioria conservadora na Suprema Corte do país - com a indicação de Neil Gorsuch, em 2017, e de Brett Kavanaugh, este ano, após um controvertido processo de confirmação entremeado por denúncias de agressão sexual.

Tensão em Tijuana

Em Tijuana, cidade mexicana na fronteira com os EUA, centenas de centro-americanos protestaram na quinta-feira, enquanto do outro lado da divisa tropas americana realizavam uma demonstração de força.

Os migrantes - homens, mulheres e até crianças - partiram ao meio-dia do albergue instalado pela prefeitura de Tijuana para abrigá-los em direção à ponte El Chaparral, localizada a cerca de um quilômetro do local. No lado americano, centenas de policiais e soldados realizaram um "exercício em grande escala de rapidez operacional" no ponto de passagem de San Ysidro, segundo o Escritório de Alfândega e Proteção da Fronteira dos EUA.

Uma linha de vanguarda, formada por dezenas de policiais com capacetes e armas longas, foi colocada de frente para o território mexicano, enquanto um batalhão de choque simulava manobras de contenção. Reforçada por barreiras metálicas, a linha de fronteira era sobrevoada por vários helicópteros das forças americanas.

Protestos

Na tentativa de conter o protesto dos centro-americanos, um agente do grupo Beta — equipe de funcionários e voluntários do governo mexicano que auxilia há anos os migrantes — conversou com a liderança da marcha que seguia para a fronteira. Com a ajuda de um alto-falante, o agente explicou aos migrantes que, para cruzar a fronteira e pedir asilo nos Estados Unidos, era preciso entrar em uma lista de espera. O grupo rejeitou a proposta.

" Que nos deixem passar, estamos desesperados, deixamos nossas famílias em Honduras. Precisamos de trabalho", disse um imigrante identificado como Wilson.

Na tentativa de deter o avanço do grupo de migrantes, o agente citou os benefícios oferecidos pelo México para que regularizem sua situação. "Há um escritório onde se oferece trabalho, há muito trabalho na cidade (Tijuana)... O que propomos é que ao menos ganhem algum dinheiro antes de seguir para os Estados Unidos. Que esperem a sua vez", destacou o integrante do grupo Beta.

Outro homem informou que, no albergue, havia ônibus para levar os migrantes a um local onde era oferecido trabalho. "Não queremos!", gritaram os migrantes antes de reiniciar sua marcha em direção à fronteira.

Irritados após uma noite chuvosa que encharcou seus pertences e colchões instalados a céu aberto, os milhares de centro-americanos abrigados no albergue em Tijuana acordaram com um único pensamento: partir do local em direção à fronteira americana.

"Vamos direto para a fronteira! Assim poderemos pressionar Trump. Neste albergue estamos apenas perdendo tempo e nossas forças", gritou em um alto-falante Carlos Rodríguez, um membro da caravana. Ao cair da noite, dezenas de migrantes criaram um novo acampamento, em plena rua, junto a El Chaparral.

Leia outras notícias em Imirante.com. Siga, também, o Imirante nas redes sociais Twitter, Instagram, TikTok e canal no Whatsapp. Curta nossa página no Facebook e Youtube. Envie informações à Redação do Portal por meio do Whatsapp pelo telefone (98) 99209-2383.