Feminicídio

O feminicídio como violência de gênero

Atualizada em 11/10/2022 às 12h27

A história recente de nosso país tem revelado a crescente violência de gênero contra a mulher, inobstante exista em nossa república lei que reprime essa conduta penal, batizada com o nome de Lei Maria da Penha. Em território maranhense está sendo realizada a semana de combate ao feminicídio, que teve início no dia 13 e encerra-se no dia 18 de novembro. Mas é preciso dizer que a violência contra a mulher não se resume apenas à agressão física e a seu assassínio pelo fato de ser mulher.

Outros tipos de violência, como a doméstica, a familiar, a patriarcal, a psicológica, a discriminatória, tão graves como o feminicídio, vêm acontecendo diariamente contra a mulher em nosso país, levando os setores envolvidos com a questão a desenvolverem campanhas de combate a essas práticas, através de palestras, seminários, estudos e a implementação de protocolos que visem eliminar ou minimizar as ocorrências que as estatísticas negativas registram. Ainda não existe em nosso Estado uma data de combate a essas práticas abomináveis, mas unicamente ao feminicídio.

Cumpre registrar, por oportuno, que a primeira vítima de feminicídio em território maranhense, foi uma menina-moça, de 15 anos de idade, chamada Maria da Conceição, morta no dia 14/08/1873, pelo desembargador Pontes Visgueiro. Um homem honrado, respeitado na sociedade maranhense pela sua inconspurcada posição de membro do Tribunal da Relação que, por conta de ciúmes, tirou a vida de Maria da Conceição, uma mulher simples, pobre, analfabeta, sem família, cujo único erro foi ter cedido aos instintos libidinosos do seu algoz.

Julgando-se traído por ela, Pontes Visgueiro perdeu o autocontrole e a matou cruelmente, a facadas, com o auxílio de seu escravo Guilhermino, esquartejando depois o corpo inanimado, colocando-o em um pequeno caixão e enterrando-o no quintal de sua casa.

O valetudinário Pontes Visgueiro, naqueles idos tempos imperiais, tinha contra si toda a imprensa e a opinião pública da província do Maranhão. O caso é único no Brasil, e repercutiu no país inteiro, havendo jornais de circulação nacional que trataram do assunto denegrindo a imagem do desembargador assassino que, de forma satânica, tirou a vida de uma jovem mulher, de menoridade e insonte, que também sofria violência de gênero praticada pelo referido magistrado.

Por essa razão, o supremo tribunal, à vista, inclusive, da confissão espontânea, condenou Pontes Visgueiro à pena de prisão perpétua, tendo o mesmo morrido no cárcere.

A desigualdade de gênero no Brasil é marcada pela ostensibilidade da violência que lhe é característica. Desse episódio funesto resta-nos pinçar o que interessa para conhecimento das gerações passantes e futuras. A propósito, o dia 14/08/1873, data da morte de Maria da Conceição, vítima desse brutal homicídio praticado por um homem perverso, o famigerado desembargador Pontes Visgueiro, simboliza o marco da violência de gênero em solo maranhense, vale dizer, o martírio de tantas mulheres, conhecidas ou anônimas, que perderam a vida em virtude de agressões ou assassínios praticados por homens que associam a ideia de masculinidade ao sentimento de posse, domínio e propriedade sobre elas ou invocam a condição de macho ferido para lavar a honra pessoal com sangue feminino, submetendo, desse modo, a mulher, como vítima de sua fúria incontrolável, ao seu julgamento irrecorrível.

Partindo desse pressuposto, entendo que a morte de Maria da Conceição representa o marco balizador e a bandeira de luta do combate à violência de gênero e à exploração da prostituição feminina em nosso Estado, a fim de que seja evitada a incidência de conduta agressiva à integridade física ou psicológica da mulher maranhense, bem como à sua dignidade sexual, qualquer que seja sua condição humana.

Por isso, sugiro que a data da morte de Maria da Conceição (14 de agosto) seja celebrada como o dia maranhense de combate à violência de gênero contra a mulher, com o objetivo de divulgar e intensificar as políticas públicas concernentes à eliminação desse grave problema que estimula a desigualdade de gênero e aflige a sociedade.

Minha proposta não possui cunho político algum, muito menos está ligada a qualquer grau de parentesco com alguma das partes envolvidas. Meu objetivo é unicamente estabelecer uma forma de reparação póstuma a essa infeliz menina-moça, bem como chamar a atenção dos setores envolvidos com a implementação e o estudo das políticas públicas de valorização e proteção da mulher maranhense a esse fato ocorrido na cidade de São Luís, a fim de que a data acima indicada seja instituída por lei como o dia de combate a violência de gênero contra a mulher no Estado do Maranhão.

José Eulálio Figueiredo de Almeida

Membro da Academia Maranhense de Letras Jurídicas, juiz de Direito em São Luís-MA.

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