TRÂNSITO CAÓTICO

Velocidade média em avenidas de São Luís é de 7km/h em horário de pico

O Estado constatou longos congestionamentos nas principais vias da capital; especialista aponta possíveis soluções para problemas que prejudicam a população

MONALISA BENAVENUTO / O ESTADO

Atualizada em 11/10/2022 às 12h28
Crescimento não planejado da cidade e aumento vertiginoso no número de veículos gera congestionamentos
Crescimento não planejado da cidade e aumento vertiginoso no número de veículos gera congestionamentos (congestionamento)

A lentidão no tráfego das principais avenidas de São Luís vem gerando transtornos a motoristas e usuários do transporte público. Na manhã de ontem (14) O Estado identificou, por meio de aplicativos para celulares, os pontos com maiores congestionamentos: Avenida Jerônimo de Albuquerque, São Luís Rei de França, Casemiro Júnior e Guajajaras estão entre as mais complicadas. Para especialistas, situação exige medidas com soluções para curto e médio prazo.

Com o crescimento não planejado da cidade e a ineficiência do serviço de transporte público, o número de veículos que trafegam em ruas e avenidas de São Luís tem crescido de forma desproporcional em relação às adequações viárias da cidade. Em 10 anos - entre 2008 e 2018 - houve um crescimento de mais 40% da frota de veículos da capital, saltando de 139.937, em 2008, para 349.051 no ano atual (levando-se em consideração apenas automóveis, utilitários, camionetas e motocicletas), de acordo com dados do Departamento Nacional de Trânsito (Denatran).

A discrepância entre o número de veículos e intervenções no tráfego da cidade resultam em algo muito conhecido no trânsito da capital: congestionamentos. Sem muitas opções, os ludovicenses enfrentam diariamente, ao se deslocarem para o trabalho, escolas ou universidades, longos engarrafamentos nas principais avenidas e rotas alternativas da cidade.

Velocidade média
Por meio do aplicativo Waze - plataforma que permite visualizar em tempo real as condições do trânsito - O Estado constatou que a velocidade média nas principais vias de São Luís chega a 7 km/h no horário de 18h a 19h30 e 12 km/h entre as 6h30 e 8h, considerados horários de pico. Os reflexos do problema atingem, principalmente, os usuários do transporte público.

Durante o percurso de casa para o trabalho - Cohatrac-Cohama -, a arquiteta Priscilla Raquel Silva sente no bolso as consequências do trânsito da capital. “Normalmente pego três conduções para chegar ao trabalho. Quando tudo dá certo, gasto R$ 6,20, porque um dos ônibus é integrado. Levo cerca de uma hora para chegar, sendo que de carro são 30 minutos, pela possibilidade de escolher outra rota. Mas, às vezes, tenho de chegar mais cedo e preciso ir de Uber. Já cheguei a pagar R$ 30,00 por uma viagem que normalmente custa R$ 14,00, mas por causa do engarrafamento acaba ficando mais cara”, contou.

Por outro lado, quem trabalha com serviços de transportes por aplicativos também coleciona prejuízos devido ao tráfego pesado durante os horários de pico. Maior consumo de combustível, problemas no motor, além do próprio estresse causado pela situação fazem parte da rotina de condutores como o engenheiro Brayner Silva, que atualmente é motorista da Uber.

“O trânsito de São Luís é um caos. Todos os dias temos de passar por isso. Para mim, o horário mais complicado é entre 17h30 e 20h no sentido Cohama-Cohab. Para evitar os prejuízos, em algumas situações a gente consegue fugir por alguma rota alternativa. Com o tempo a gente já percebe os horários que ficam mais engarrafados e evita passar por lá, procurando ir logo pelos atalhos” explicou.

Entre as queixas dos motoristas, destaca-se o número elevado de semáforos espalhados por grandes avenidas de São Luís. Para o administrador de empresas, João Marcos Bezerra, esse é um agravante no congestionamento que ocorre, por exemplo, na Avenida Carlos Cunha.

“Quando não é causado por acidentes, o que não acho que seja tão frequente, é causado apenas pela lentidão do tráfego. Já cansei de estar em engarrafamentos na Avenida Carlos Cunha que não tinha nada, só as pessoas dirigindo devagar. Aqueles três semáforos próximos um ao outro, acredito que sejam um fator que contribui para o atraso no trânsito daquela área”, apontou.

O que diz o especialista
A ineficiência de semáforos e ausência de passarelas para tornar o trânsito mais fluido, é uma das principais causas da rigidez no tráfego de São Luís e atinge, além dos motoristas, os pedestres da capital, de acordo com Francisco de Assis Soares, coordenador do Observatório do Trânsito no Maranhão e integrante do Conselho Nacional de Trânsito (Contran).

“Eu diria que a cidade de São Luís é um exemplo típico de uma metrópole onde o pedestre não é respeitado e o gerenciamento do trânsito se resume em tentar controlar o fluxo e o itinerário dos veículos. Os pedestres disputam espaço na calçada, com os postes e os buracos e nas vias públicas, com os veículos. Não há faixa de pedestres. Não há passarelas. Não há respeito a prioridade do pedestre no trânsito”, explicou o especialista.

Entre as medidas destacadas por Francisco Soares para solucionar a problemática a curto prazo, destaca-se a melhoria na sinalização da cidade, priorizando as condições de fluxo. “Uma solução rápida para melhoria do trânsito e diminuição dos engarrafamentos seria implantação de uma sinalização inteligente, feita a partir da contagem real de fluxo de veículos e consequentemente programação das aberturas semafóricas, de modo que poderíamos criar ondas verdadeiramente verdes”, afirmou.

Além disso, o especialista ressaltou a importância de garantir uma estrutura adequada ao pedestre e o incentivo ao uso de transportes alternativos. “Dentro das condições atuais a cidade ideal que eu chamo de cidade amistosa seria aquela que desse prioridade para o pedestre, com faixas de pedestre bem localizadas, com rampa de acesso, com plena acessibilidade, com boa sinalização vertical e horizontal, com passarelas e outras soluções para a travessia de pedestres, com calçadas transitáveis e incentivo permanente ao uso de bicicletas e transporte público de qualidade”, ressaltou.

Para questionar quais as atuais formas de detecção desses problemas adotados pela Secretaria Municipal de Trânsito e Transportes (SMTT), além de possíveis medidas para solucioná-los, O Estado manteve contato com a Prefeitura de São Luís, que informou, em nota, que identifica os pontos de retenção de tráfego, tanto por meio do setor de engenharia de trânsito, como por ações realizadas pelas equipes de agentes nas vias da cidade.

A SMTT comunicou que, a partir de levantamentos técnicos, a Secretaria realiza ações permanentes ou pontuais com agentes de trânsito ou faz intervenções viárias, com modificações geométricas, mudança de sinalizações e outras ações relacionadas, visando solucionar o problema. Entre as ações realizadas pela SMTT: elevado da Cohama (ações com agentes), intervenções na Forquilha, Cohab, Bequimão, Curva do 90, Shopping da Ilha, São Francisco, Viaduto do Café, Anel Viário, Areinha (entrada do Itaqui-Bacanga).

Pontos de congestionamento e velocidade em horários de pico
Avenida Daniel de la Touche, Cohama – variação entre 4 e 10 km/h
Avenida São Luís Rei de França, Turu – variação entre 8 e 12 km/h
Avenida Beira Mar, Centro – 4 e 14 km/h
Avenida dos Holandeses, Calhau – 3 a 20 km/h
Avenida Jerônimo de Albuquerque, Angelim – 5 a 13 km/h
Avenida Jerônimo de Albuquerque, Cohafuma – 6 a 16 km/h
Avenida Professor Carlos Cunha, Jaracaty – 8 a 22 km/h
Ponte Hilton Rodrigues, Ipase – 7 a 11 km/h

Principais problemas e problemas e soluções

O coordenador do Observatório do Trânsito no Maranhão destacou os principais problemas enfrentados na capital maranhense no que se refere ao fluxo de trânsito e possíveis formas de solucioná-los, “considerando o transito como um movimento de veículos, cargas e pedestres em vias públicas ou até mesmo em áreas privadas abertas ao público como os grandes centros comerciais, ambulatoriais”. Confira:
- Ruas e avenidas estreitas : Elaborar plano de reestruturação viária de longo prazo. Ação que exige grande disponibilidade de recursos financeiros.
- Alta densidade de veículos: Incentivar o uso compartilhado de veículos e investir em ciclovias
- Semaforização não inteligente: substituir por semaforização inteligente com a contagem de fluxo de veiculo e abertura de sinal variável;
- Áreas para uso de pedestres sem acessibilidade e/ou continuidade: revitalizar as calçadas e criar peitorais;
- Ausência de passarelas ou passagens de nível para pedestres: investir na instalação de passagens aéreas, subterrâneas e de nível;
- Faixas de pedestres mal localizadas e sinalizadas: realocar as faixas para locais adequados;
- Transporte público pouco convidativo para população de maior poder aquisitivo: investir mais ainda na melhoria do transporte de massa para atrair a demanda de pessoas que possuem carro próprio;
- Baixa oferta das Faixas exclusivas de ônibus: demarcar mais faixas exclusivas;
- Ausência de faixas exclusivas, virtuais, compartilhadas para motocicletas, motonetas e ciclomotores: criar a faixas;
- Desperdício da caixa viária onde as faixas de rolamento são bem mais largas do que o necessário: estreitamento de faixas para colocar três faixas onde existem duas;
- Falta de aplicação do CTB na desobstrução das vias ocasionados por pequenos acidentes sem vitimas ou danos ao patrimônio.

Opinião

Francisco de Assis Soares
coordenador do Observatório do Trânsito no Maranhão

“Diante de tantas dificuldades crescentes e da ausência ou insuficiência orçamentária que poderia arcar com investimento em construção de novas vias, em novos modais de transporte de massa, como o VLT, o hidroviário, etc., só consigo vislumbrar a utilização de um gerenciamento quadridimensional (4D) de trânsito baseado em técnicas que tentam impedir que todas as pessoas tentem ir para o mesmo lugar ao mesmo tempo. É a chamada defasagem temporal que leva a uma desconcentração funcional da cidade, mas nós estamos falando do estado da arte de gerenciamento de trânsito com muito poucas chances de ser implantada em São Luís, não por falta de recurso tecnológico mas por falta de conhecimento dessa técnica pelos gestores de trânsito. Neste tipo de gerenciamento todo fluxo de veículos da cidade seria dividido em frações de 1/3 dos horários de pico. É como se houvesse três cidades ocupando o mesmo espaço territorial de São Luís. Cada uma começando em um horário diferente da outra. O mais próximos que já chegamos a isso foi na França quando na época das férias escolares as autoridades criam um calendário diferenciado de entrada de férias por região.
O maior desafio é a mudança cultural. O cidadão se acostumou a ver a cidade como um espaço do veículo motorizado, onde o pedestre é um intruso. Temos que promover uma inversão de valores. O legítimo direito de ir e vir não é do veículo e sim do pedestre. O motorista apenas goza de uma concessão temporária para dirigir. Não é racional que todos os recursos da cidade sejam voltados para o veículo e para o condutor do veículo. Se a cidade não for amistosa e tratar bem o seu idoso, sua criança, o seu portador de deficiência física, permanente ou temporária, esta cidade será incapaz de promover melhoria na vida das pessoas. Será sempre uma cidade dura, uma cidade hostil, uma cidade de costas para o cidadão e reativa aos verdadeiros interesses públicos”.

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