Mistério saudita

Morte de jornalista saudita foi ''selvagem'', diz Erdogan

Em pronunciamento oficial sobre o caso, Erdogan rejeita versão da Arábia Saudita e pede punição "de alto a baixo"

Atualizada em 11/10/2022 às 12h28
O presidente turco, Tayyip Erdogan, discursa no parlamento em Ancara
O presidente turco, Tayyip Erdogan, discursa no parlamento em Ancara (Reuters)

ANCARA - O presidente turco,Recep Tayyip Erdogan , disse ontem que o jornalista saudita Jamal Khashoggi foi morto de forma "selvagem", em um crime com fortes indícios de ter sido premeditado, contrariando diretamente o relato da Arábia Saudita sobre o caso.

É a primeira vez que Erdogan fala oficialmente sobre o caso, e o relato feito por ele no Parlamento foi o mais detalhado já feito por autoridades turcas sobre a morte de Khashoggi. Diversos setores acreditam que o príncipe herdeiro saudita, Mohammed bin Salman, conhecido como MBS, estivesse ciente da operação que matou Khashoggi, e há suspeitas inclusive de que chegou a encomendá-la.

Ontem, investigadores dizem ter encontrado duas malas e bens(incluindo um computador e documentos) que, acredita-se, pertenciam a Khashoggi em um veículo do consulado saudita em Istambul, de acordo com a unidade da CNN na Turquia.

Erdogan não envolveu diretamente o príncipe em seu relato, mas afirmou que a morte foi premeditada, o que cria tensões com a versão apresentada por Riad, de que teria sido um acidente, parte de uma missão que deu errado:

"Nós temos indícios significativos de que isto não foi algo que aconteceu instantaneamente, espontaneamente", afirmou, em um discurso para os membros de seu partido no Parlamento." Khashoggi foi assassinado de modo selvagem".

Ele cobrou que os responsáveis pelo assassinato sejam punidos "de alto a baixo": "Instituições de segurança e inteligência têm provas de que o homicídio foi premeditado. Atribuir o caso a alguns integrantes da segurança e da inteligência [sauditas] não satisfará a comunidade internacional. O governo saudita deu um passo importante ao admitir o assassinato. De agora em diante, esperamos que eles apontem todos os responsáveis de alto a baixo, e os façam encarar as punições cabíveis".

Tensão regional

Arábia Saudita e Turquia são rivais regionais e Erdogan tem interesse em limitar a influência de Salman em seu país. O príncipe buscava promover uma imagem internacional de reformista, severamente prejudicada pelo caso.

O fato de o jornalista ter sido morto em um prédio diplomático torna a situação mais complexa. A Convenção de Viena confere imunidade diplomática a representantes de um país no exterior. A norma, no entanto, não visa a proteger atos como tortura e assassinato, que constituiriam uma manipulação da lei internacional.

"Este assassinato pode ter sido cometido em um prédio diplomático, que pode ser considerado um território saudita, mas ele está nas fronteiras da Turquia", disse Erdogan. "[A Convenção de Viena] não pode permitir que a investigação deste assassinato fique escondida por trás da proteção da imunidade".

O presidente turco afirmou que telefonará para o rei Salman e pedirá para o caso ser julgado em Istambul e não na Arábia Saudita. A versão oficial do país exportador de petróleo mudou algumas vezes. Depois de afirmar que Khashoggi deixou vivo o consulado, Riad, sob intensa pressão internacional , passou, na sexta-feira, a admitir a morte, atribuída a uma briga entre o jornalista e seus interrogadores.

Funcionários do governo turco e operadores de inteligência descartaram esta versão. Erdogan, que definiu a morte como um "assassinato político", disse "procurar respostas" e sublinhou as contradições sauditas:

" A mando de quem eles vieram?", disse. "Por que o prédio do consulado não abriu imediatamente, mas só depois de dias? Se o assassinato era tão claro, por que tantas declarações incoerentes foram feitas? Se o assassinato foi oficialmente admitido, por que o corpo não foi encontrado?"

O líder turco observou que o sistema de câmeras de segurança do consulado saudita em Istambul foi desativado um dia antes de Khashoggi chegar ao local, por meio da remoção de seu disco rígido.

Crítico

Khashoggi, colunista do "Washington Post" e crítico do príncipe herdeiro Mohammed bin Salman, governante de fato do reino, estava desaparecido desde 2 de outubro, depois de entrar no consulado saudita em Istambul para obter documentos para o seu casamento. Fontes turcas disseram que o governo tem uma gravação de áudio supostamente documentando o assassinato do jornalista de 59 anos.

O presidente turco disse ter contado ao rei saudita Salman que o cônsul saudita em Istambul era "incompetente" e que foi dispensado de seu dever e retornou a seu país.

O paradeiro do corpo de Khashoggi ainda é desconhecido e o presidente turco exigiu que a Arábia Saudita revele a identidade de um "cooperador local" que supostamente tomou o corpo do jornalista. Erdogan disse ainda que uma equipe saudita de 15 pessoas entrou no consulado no dia do assassinato.

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