Droga

Legalização da maconha para uso recreativo entra em vigor no Canadá

Objetivo principal é deter mercado negro e promover conscientização; ontem, se formaram filas diante de lojas para comprar o produto

Atualizada em 11/10/2022 às 12h28
Um cliente com um produto de cannabis deixa uma loja de maconha
Um cliente com um produto de cannabis deixa uma loja de maconha (Reuters)

TORONTO - O Canadá tornou-se ontem a primeira grande economia mundial a legalizar a maconha para fins recreativos. Já pela manhã havia filas diante de lojas de produtos de cannabis em diferentes localidades do país.

"Vou fazer uma placa com data, hora e tudo. Isso nunca será realmente fumado. Vou guardá-la para sempre", disse à rede CNN o cliente Ian Power, um dos primeiros a comprar maconha em St. John's, uma cidade no leste canadense.

A aprovação representa um marco histórico, permitindo que os canadenses adultos fumem maconha para fins recreativos após uma proibição de quase um século.

No entanto, uma confusão jurídica tornará difícil que os usuários aproveitem desa novidade nas maiores cidades do país, como Toronto e Vancouver, que não terão lojas abertas.

Os governos provinciais do Canadá só aprovaram até agora um número pequeno de lojas e existe uma escassez da erva fornecida a elas. Por isso, a maioria dos canadenses provavelmente continuará, por enquanto, se abastecendo no mercado negro.

"Haverá muitas comemorações no dia e serão quase todas com maconha ilegal" em algumas das maiores cidades do Canadá, disse Brad Poulos, instrutor e especialista em negócios de maconha da Universidade Ryerson de Toronto. "Os usuários de maconha recreativa do Canadá simplesmente continuarão com suas fontes (atuais) de fornecimento até o sistema legal se atualizar."

Apesar da falta de lojas nas grandes cidades do país, os consumidores do Canadá poderão comprar maconha legal pela internet, seja em sites administrados por governos provinciais, seja em varejistas licenciados, mas a entrega pode demorar alguns dias.

O objetivo da legalização é justamente tentar conter o mercado negro e seu uso entre os jovens, ainda que em meio a preocupações em torno da saúde pública e a segurança da legalização.

Trabalhadores de saúde pública sustentam que fumar maconha faz tanto mal quanto o tabaco, mas agradecem a oportunidade que a legalização traz de um diálogo aberto.

A polícia, por sua vez, se prepara para um aumento da incidência de motoristas dirigindo sob efeito da droga e não está pronta ainda para apresentar três novas denúncias criminais, que exigem coletar amostras de sangue duas horas depois da detenção para se detectar níveis acima do limite de THC, o agente psicoativo do cannabis.

"Como médico e como pai, não estou de acordo com a legalização da cannabis recreativa", disse Antonio Vigano, especialista em maconha medicinal e diretor de pesquisas na clínica de cannabis Sante em Montreal, ante o risco de um consumo maior entre os jovens.

"Há preocupações com a saúde", disse à AFP Gillian Connelly, da Agência de Saúde Pública de Ottawa. "Mas a legalização está criando uma oportunidade para se discutir o consumo de cannnabis e, por exemplo, que os pais comecem uma conversa com seus filhos a respeito. Durante décadas, só dissemos: 'não consumam', mas isto não funcionou", acrescentou.

Dirigir sob seus efeitos

O governo enviou uma mensagem a 14 milhões de famílias destacando os aspectos básicos, inclusive advertências sanitárias e a necessidade de se manter a maconha longe de crianças e animais de estimação.

A organização Mothers Against Drunk Driving também se associou ao Uber e à produtora de maconha Tweed em uma campanha contra a direção sob os efeitos da cannabis.

Connelly notou uma breve retomada nas internações depois que o estado americano do Colorado legalizou a maconha em 2014, atribuindo-o a que pessoas não se davam conta de sua potência. O THC aumentou de uma média de 3% em 1980 a 15% hoje.

Os empregadores, por outro lado, estão estabelecendo uma ampla gama de restrições ao uso que afeta o trabalho. O exército, por exemplo, ordenou aos soldados que não usem maconha oito horas antes de um turno, enquanto alguns policiais e companhias aéreas anunciaram proibições.

Risco entre adolescentes

Além das zonas cinzentas legais, há uma escassez de dados científicos sobre a cannabis, o que dificulta o estabelecimento de políticas.

Isto ficou evidente quando autoridades descartaram as preocupações dos médicos com o impacto da maconha no desenvolvimento do cérebro de menores de 25 anos, e estabeleceram a idade mínima para o consumo em 18 ou 19 anos, de acordo com a idade legal para ingestão de álcool.

Um painel que recomendou o marco legal ao governo disse que "a ciência atual não é definitiva quanto a estabelecer uma idade segura para o uso da cannabis".

Também determinou que fixar a idade em 25 anos comprometeria os esforços para eliminar o mercado negro, o que por sua vez enfraqueceria o fornecimento de um produto mais seguro para os consumidores.

O consumo relacionado à execução de tarefas sob efeito de entorpecentes também permanece confuso. Para responder a isto, o governo estabeleceu três limites de concentração de THC proibidos no sangue: acima de 2 nanogramas (ng) mas inferiores a 5 ng por mililitro de sangue; 5 ng ou acima; e 2,5 nanogramas em combinação com 50 mg de álcool por 100 mililitros de sangue.

"Nas pessoas que dirigem, sabemos que a presença do THC é um risco para a atenção, a concentração e o julgamento", disse Vigano.

Mas as forças de ordem ainda não têm pessoal para coleta de amostras de sangue. E os policiais estão sendo treinados para usar medidores alternativos de saliva em rodovias para detectar o THC, aprovados em agosto. Enquanto isso, o governo espera que a redução do preço simplesmente ponha os traficantes fora do negócio.

Para Jean-Sebastien Fallu, especialista em dependência da Universidade de Montreal, os riscos - definitivamente - não superam as virtudes das legalização. "A cannabis não é boa para a saúde, mas a proibição é extremamente nociva e pior que a cannabis", disse..

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