RESTAURAÇÃO

Após anos de abandono e descaso, casa onde morou Aluísio Azevedo é restaurada

O imóvel, que quase foi demolido, apresentava deficiência em toda estrutura; danos, causados pela ação do tempo e falta de preservação, foi denunciado várias vezes pela mídia

IGOR LINHARES / O ESTADO

Atualizada em 11/10/2022 às 12h29

SÃO LUÍS – Em estado deplorável, foi assim que permaneceu por anos o casarão, do século XIX, onde viveu o escritor Aluísio Azevedo. Hoje, já restaurado, após decisão judicial que condenou a demolição e a principal ideia – a de tornar o espaço em um estacionamento –, o imóvel, localizado à Rua do Sol, na esquina com a Rua da Mangueira, no Centro Histórico da capital maranhense, foi o recinto onde ele escreveu uma das obras mais importantes da literatura brasileira, “O Mulato” que em 1881 abriu caminho para o naturalismo e realismo no Brasil. O imóvel é tombado pelo Departamento Histórico, Artístico e Paisagístico do Maranhão (DHAP/MA) e deveria ter sido reformado em 2014.

Início da ação

Em 2014, o Instituto Histórico e Geográfico do Maranhão (IHGM) denunciou a situação do imóvel onde morou o escritor. À época, o instituto desenvolveu uma ampla campanha para chamar a atenção da sociedade e do poder público para a conservação do imóvel, que havia sido vendido e a nova proprietária, Bianca Costa Oliveira estava fazendo uma obra para transformar o espaço em um estacionamento. No mesmo ano, com a denúncia, o Ministério Público (MP) entrou na Justiça com uma Ação Civil Pública, e as obras foram paralisadas.

“Era uma tarde de domingo, eu estava passando pela Rua do Sol, completamente deserta, e vi o estado precário do casarão. Parei e tirei duas fotos, em dois ângulos diferentes, pois tinha o conhecimento de que era ali, naquele mirante [da casa], que o escritor Aluísio Azevedo tinha escrito ‘O Mulato’, entre 1879/1881. Achei um absurdo um imóvel de inestimável valor histórico e cultural estar naquela situação. Foi então que conversei com um vigia, de um prédio vizinho, e, então, ele me disse que os proprietários estavam tentando fazer um estacionamento no interior do imóvel, que as obras já estavam avançadas”, contou o vice-presidente do IHGM, Euges Lima, quando pensou em denunciar o fato.

A denúncia de que a casa onde Aluísio Azevedo morou em São Luís poderia virar um estacionamento foi feita no dia 11 de março daquele ano pelo IHGM na página da instituição em uma rede social. “Quando retornei para casa, com as fotos, ponderei um pouco e resolvi postar e fazer a denúncia a bem da história e memória do Maranhão e do Aluísio Azevedo, mas confesso que não previ a repercussão que aquilo poderia causar”, acrescentou Lima, quando lhe surgiu a ideia de publicar a ocasião na internet. “A partir daí, encampamos um movimento pela preservação do imóvel juntamente à direção do IHGM; fizemos abraço coletivo, textos, postagens, concedemos inúmeras entrevistas sobre o caso [...]”.

Foi após toda a repercussão na mídia e mobilização, não só maranhense, que o MP interveio contra os proprietários. “O caso foi parar na justiça, que determinou a restauração do imóvel sob pena de multas”.

A imposição da multa foi dada em 2015. À época, o juiz Clésio Coelho Cunha, da Vara de Interesses Difusos e Coletivos, deferiu pedido liminar ajuizado pelo MP determinando aplicação de multa de R$ 10 mil por dia em caso de descumprimento da determinação que previa providências como escoramento, limpeza e conservação do imóvel. Na ocasião, também foi determinado o bloqueio de todos os imóveis e de veículos registrados em nome da proprietária, com a expedição de ofícios aos cartórios de imóveis de São Luís e ao Departamento Estadual de Trânsito (Detran) para que não fossem averbados e registrados atos de alienação ou garantia sobre os bens.

Restauração

Quase quatro anos se passaram e, nos últimos meses, foi possível perceber que toda mobilização, nas mídias sociais, valeu à pena. A sonhada restauração foi feita, pelo menos externamente, ao que constatou O Estado, em visita ao local, ontem (9). “Com essa restauração, fica a sensação de que estávamos fazendo a coisa certa e que vale a pena lutar pela preservação do nosso patrimônio histórico”, finalizou o vice-presidente do IHGM.

Agora, com a restauração do prédio, o que não faltam são ideias para a preservação, principalmente da memória das obras e feitos de Aluísio Azevedo. “Deveria ser, pelo menos, uma casa que fosse um memorial, onde tivesse os objetos relativos à escravidão, pois o livro que ele escreveu, ‘O Mulato’, trata exatamente disso. Seria uma casa voltada à exposição de fatos, atos e tudo que lembrasse o que no Maranhão tivesse sido feito e escrito em relação à escravidão, este seria o propósito”, destacou e sugeriu o presidente da Academia Maranhense de Letras (AML), Benedito Buzar.

Biografia
Aluísio Tancredo Belo Gonçalves de Azevedo nasceu em São Luís em 14 de abril de 1857. Foi romancista, contista, cronista, diplomata, caricaturista e jornalista brasileiro, além de bom desenhista e pintor.

Irmão do dramaturgo e jornalista Artur Azevedo, seguiu carreira como diplomata, servindo na Espanha, Inglaterra, Itália, Japão, Paraguai e Argentina. É fundador da cadeira nº 04 da Academia Brasileira de Letras e autor de romances de estética naturalista como 'O Mulato' (1881), 'Casa de Pensão' (1884), 'O Cortiço' (1890) e outros. Morreu em Buenos Aires, em 21 de janeiro de 1913.

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