Artigo

Os brutos também amam

Atualizada em 11/10/2022 às 12h29

O poder desumaniza as pessoas? Há alguns anos, cientistas começaram a estudar as formas como o poder afeta o cérebro humano. Eles descobriram que o poder faz com que as pessoas se tornem mais impulsivas, menos conscientes dos riscos e menos capazes de ter empatia pelos outros. As consequências em termos de gravidade são equivalentes a danos cerebrais.

“O poder não modifica as pessoas, apenas mostra o que elas são”. Esta frase, sábia e conhecida, significa que existiria todo um potencial de vaidade, arrogância, empáfia e até mesmo crueldade inata ao ser humano, prestes a ser revelada desde que surjam condições efetivas para isso.

Conversando outro dia com um amigo, ao concordarmos que o eventual exercício do poder não nos seduziria ele expôs a situação de uma conhecida sua, prefeita do interior que, sem vocação para isso e eleita por imposição do marido político, veio a sentir tanta falta das festividades e bajulações que acabou se tornando depressiva e amarga quando abandonou o exercício do cargo. O que revela que aos males do poder se agrega mais um, o vício com o mesmo.

Essas reflexões vêm a propósito do que li recentemente em revista científica revelando que alguns ditadores, causadores de grandes atrocidades, foram também capazes de momentos de afeto e bondade, aparentemente inconcebíveis no imaginário construído a respeito de suas biografias. Por exemplo, Hitler não foi sempre o homem que ordenou a morte de milhões. Eduard Bloch, o médico da família do alemão, era judeu. Hitler ficou tão agradecido pelo cuidado que ele teve com sua mãe, que colocou a família do homem sob proteção do governo em 1938 e acelerou sua emigração para os Estados Unidos.

Stálin também, enviava regularmente limões a sua esposa. Fazendeiro, plantou limão toda a sua vida. Seus filhos achavam que ele era “mais suave” que a mãe, e seus sentimentos por sua esposa não eram teatro político. Quando Nadya cometeu suicídio, Stalin ficou tão perturbado que teve que ser vigiado para não fazer o mesmo.

Igualmente, muitas dessas “feras” tinham pendores artísticos. Hitler foi um pintor obstinado embora mal sucedido. Recordo também que na juventude travei conhecimento com a poesia de Mao Tse Tung. Impactado pela descoberta, levei-a ao saudoso Erasmo Dias que, entusiasmado, avalizou como, de fato belos, os poemas do ditador chinês.

Muammar Gaddafi foi outro poeta e escritor que escreveu uma coleção de contos. Outro ditador artista foi Saddam Hussein, com seu romance “Zabiba e o Rei”, uma trama romântica num contexto de aventura. Aliás, os guardas que vigiaram Saddam ficaram muito tristes com a sua morte, tal a empatia com ele estabelecida no convívio final. Tudo indica que estes homens “humanos, demasiadamente humanos” talvez não levassem a pecha de sanguinários caso não tivessem sido guindados ao poder.

Nestes dias de eleições e de caça ao poder, em que tantos se digladiam e o tom de ataques recíprocos atinge níveis de virulência elevados, nunca é demais lembrar que o poder não é um mal em si, o mal é se deixar seduzir pelo mesmo e tornar seu exercício, “desumano, demasiadamente desumano”. Isso acontece com os destruidores de esperanças tão logo assumem o poder, como, por exemplo, na Venezuela, o execrável Nicólas Maduro.


José Ewerton Neto

Autor de O entrevistador de lendas

E-mail: ewerton.neto@hotmail.com

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