Nostalgia e modernidade

Um ano de obras e grande orçamento: revitalização da Rua Grande é realizada

Para facilitar os trabalhos, a reforma está sendo feito por quadra; medida atende a um apelo dos comerciantes da região que temiam prejuízos

Thiago Bastos / O Estado

Atualizada em 11/10/2022 às 12h31

[e-s001]Aproximadamente R$ 31 milhões (ou R$ 31.404.149,59). Este será o valor gasto, de acordo com a Superintendência do Instituto de Patrimônio Histórico e Artístico Nacional (Iphan) no Maranhão, para a revitalização da Rua Grande, além de praças e alamedas que compõem o entorno da via - praças Deodoro e Pantheon e Alameda Gomes de Castro. De acordo com o Iphan, responsável pelo projeto que está em andamento, os serviços deverão ser finalizados em março do próximo ano e prometem reerguer os 800 metros de uma das vias mais marcantes para a história da cidade, repleta de curiosidades.

Segundo a Superintendência do Iphan, as obras na Rua Grande compõem um conjunto de intervenções que são realizadas na cidade, por meio do Programa de Aceleração do Crescimento Cidades Históricas (PAC). De acordo com o órgão, devido às diferentes demandas que necessitam ser atendidas para o andamento dos trabalhos, a revitalização da Rua Grande é analisada como uma das mais complexas já realizadas na cidade, nos últimos anos.

Para facilitar os trabalhos, a reforma está sendo feito por quadra. A medida atende a um apelo dos comerciantes da região, que temiam queda nas vendas a partir do início das intervenções na via. Atualmente, os serviços estão na quadra que se inicia na Rua do Passeio e termina na Rua de Santaninha.

No fim do mês passado, técnicos do Iphan notificaram a Companhia de Saneamento Ambiental do Maranhão (Caema) acerca da necessidade de intervenção da empresa fornecedora dos serviços de água e esgoto no estado. De acordo com o órgão federal, durante as escavações foi constatada a necessidade de implantação de uma nova linha de abastecimento de água. Segundo comprovou O Estado, os trabalhos foram suspensos no dia 21 de abril deste ano e retomados menos de uma semana depois.

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Segundo o projeto original, entre os serviços previstos para acontecer na Rua Grande estão a colocação subterrânea de fiação elétrica, a colocação de bancos e lampiões em estilo colonial e a substituição do piso original. Além disso, com base em projetos observados por técnicos do Iphan em cidades europeias, como Málaga (na Espanha), haverá o nivelamento da passagem dos pedestres, motivo atualmente de reclamação por parte dos transeuntes.

O projeto ainda prevê, de acordo com o Iphan, a colocação de rampas e referências para pessoas com algum tipo de limitação física. No total, a obra da rua Grande está dividida inicialmente em doze etapas.

Indefinições e início da obra
Entre o anúncio da obra e o início dos trabalhos na Rua Grande, houve uma série de reuniões técnicas entre representantes do Iphan e da Câmara dos Dirigentes Lojistas para readequação de termos do projeto apresentado. No dia 29 de janeiro de 2016, em encontro realizado na sede da Associação Comercial do Maranhão (ACM), os presentes definiram que os serviços no principal centro varejista do país começariam em março do mesmo ano e com prazo de execução aproximado de um ano e meio.

Após vários ajustes e readequação do plano orçamentário, os serviços somente começaram para valer em outubro do ano passado. Os trabalhos na Rua Grande envolvem órgãos, como a Companhia Energética do Maranhão (Cemar), CDL, Caema, dentre outros.

Queda no faturamento
Levantamento da Câmara dos Dirigentes Lojistas (CDL) apontou queda no faturamento dos estabelecimentos comerciais da Região Central de São Luís - incluindo a Rua Grande - nos últimos meses, devido aos problemas enfrentados pelos empresários, em especial a insegurança. Nas últimas semanas, não houve qualquer registro de arrombamentos em lojas do principal centro comercial da cidade. Além das ações de segurança da polícia, outro fator que inibiu os ladrões foi a elevação nos níveis de monitoramento. Vários empresários investiram na instalação de câmeras e alarmes para minimizar os riscos de novos casos de violação aos estabelecimentos.

Em março do ano passado, um estabelecimento da Rua Grande foi alvo dos criminosos. De acordo com informações repassadas à época pela polícia, três homens invadiram o local e levaram pertences. Em outubro do ano passado, uma agência bancária da Rua Grande foi arrombada. Na ocasião, não foi informado o valor levado pelos criminosos. A Secretaria de Segurança Pública (SSP) informou que realiza diariamente rondas pela Rua Grande.

Imóveis tombados
Segundo o Iphan, todos os imóveis na extensão da intervenção são tombados. De acordo com o órgão, as primeiras quadras entre o Largo do Carmo e a Rua Antônio Rayol são tombadas pelo Governo Federal e pela Unesco. As demais quadras são tombadas pelo Governo do Estado do Maranhão.

Sem definição
Até o momento, a Prefeitura de São Luís não informou - de forma oficial - o destino dos 380 vendedores ambulantes que atuam na Rua Grande. Na via, aliás, é possível encontrar vários trabalhadores informais que, muitas vezes, perderam seus empregos e encontraram no serviço - no principal centro comercial da cidade - uma forma de ganho de vida.

Segundo o Sindicato dos Vendedores Ambulantes de São Luís, diálogos “vêm sendo mantidos” com o poder público há alguns meses. Por enquanto, não há qualquer proposta para envio dos trabalhadores. A Blitz Urbana, por sua vez, está em contato com os ambulantes “de forma constante” para encontrar uma solução adequada para o caso. Pelo projeto de revitalização, não há qualquer garantia de que os vendedores permanecerão na via.

[e-s001]Os imóveis mais importantes na grande via de comércio

A Rua Grande, além de ser conhecida pelos sobrados popularmente conhecidos e que, atualmente, sofrem com o processo de descaracterização arquitetônica, também é famosa por empreendimentos que marcam ou que já marcaram época na sociedade. No total, de acordo com informações da Superintendência do Iphan no Maranhão, a via apresenta 151 imóveis, sendo 15 deles de grande relevância histórica (como o imóvel de “A Exposição”, a casa onde nasceu Catulo da Paixão Cearense, entre outros).

Um dos mais famosos era o Cine Éden, cujas instalações atualmente são ocupadas por uma franquia famosa de roupas. O Éden foi adquirido pela família Tájra e sucedeu ao Cinema São Luís, de Joaquim Dias. Sua fundação, de acordo com o historiador e pesquisador Antônio Guimarães, data de 1949. “O nome originou-se de outro cinema, que pegou fogo, e foi vendido para essa família muito tradicional na cidade”, frisou Guimarães a O Estado.

Projetado inicialmente para ser um teatro, o Éden apresentava dois pavimentos com dois salões, com capacidade máxima de receber até 1.300 pessoas. No período do cinema mudo, enquanto pessoas “bem trajadas” adentravam no local para conferir o conteúdo das películas, outras permaneciam na entrada tocando rabecas (instrumento de cordas que lembra o violino). “O prédio do Éden possui um formato bem emblemático e neoclássico. Era um prédio suntuoso, em que apenas as pessoas mais nobres tinham aces­so”, frisou Guimarães.


[e-s001]Além de receber público para exibição de filmes, o Éden também recebeu festas carnavalescas, onde o público dançava ao som das marchinhas, como “Chiquita Bacana” e “Olha a Cabeleira do Zezé”. A ideia de promover festas de momo era de Moysés Tájra.

Ocupante da Cadeira nº 33 da Academia Maranhense de Letras (AML), o professor José Carlos Sousa Silva lembra de vários momentos marcantes no Éden. “Hou­ve um discurso muito famoso, do então governador José Sarney, que foi realizado por lá. O prédio estava lotado. Fora as exibições de grandes filmes no cinema. Realmente é uma pena que não esteja mais lá”, afirmou.

Da antiga estrutura do Éden, restam apenas algumas referências, como os lustres no piso superior e o teto conservado em seus aspectos originais. A fachada com os dizeres Eden na entrada também é vista por quem passa de maneira mais atenta pela Rua Grande.

Edifício Caiçara
Construído nos anos 1960, o Edifício Caiçara tomou o lugar da Igreja Nossa Senhora da Conceição dos Mulatos, que foi construída na Rua Grande. Com 10 pavimentos e 48 apartamentos, o imóvel - que já ganhou ares de amaldiçoado por terem ocorrido no prédio (conforme publicou em O Estado no dia 26 de julho de 2009 e com base em dados da Fundação Municipal de Patrimônio Histórico de São Luís) três suicídios nos primeiros anos após a inauguração - sofre com a falta de conservação. Chama a atenção de quem passa na Rua Grande o fato de que o prédio foi feito em uma estrutura de concreto armado.

Curiosidades

“Shopping a céu aberto”
A ideia de um centro comercial aberto foi concebida ao final da primeira administração do então prefeito de São Luís, Jackson Lago (1989-1992). Nesse período, foi entregue mais uma “importante obra de revitalização urbanística da Rua Grande”, com feição semelhante à existente hoje, com o alargamento das calçadas e uso de paralelepípedos.

É tombado
Por intermédio do Decreto Estadual nº 10.089, de 1986 – com a criação de Zona Tombada Estadual (englobando uma área de aproximadamente 160 hectares) – a Rua Grande, com seu acervo de casarões, foi incluída na área protegida do Governo.

Bondes
Outra curiosidade da Rua Grande é que a via já recebeu os famosos bondes. O professor José Carlos Sousa Silva lembra da passagem do meio de transporte no antigo “Caminho Grande”. “Ele vinha da Rua da Paz. Daí seguia até outras partes da cidade”, frisou Sousa.

Clientes gostam
Apesar do forte apelo dos centros comerciais mais modernos, muita gente ainda se sente disposta em ir até a Rua Grande, seja para passear ou mesmo fazer compras. O professor aposentado Francisco Dias, de 63 anos, é um dos que mais gostam de estar na Rua Grande. Ele contou a O Estado acerca dos tempos em que ia para a principal via da cidade apenas para olhar as vitrines. “A gente passava por aqui e não comprava nada, muitas vezes. Só olhava o que tinha na vitrine e ia embora. Não me esqueço disso”, afirmou.

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