13 de maio

A Lei Áurea no Maranhão

A repercussão do documento no estado é pouco conhecida, tendo sido explorada na ficção por autores como Josué Montello e Nascimento Moraes

Pe. João Dias Rezende Filho* / Especial para o Alternativo

Atualizada em 11/10/2022 às 12h31
O fim da escravidão teve resistência no Maranhão
O fim da escravidão teve resistência no Maranhão (Escravidão)

SÃO LUÍS- Com uma pena de ouro, confeccionada por meio de subscrição popular, a Princesa Dona Isabel sancionou, na tarde de 13 de maio de 1888, a Lei nº 3.353 que passou à história com o epíteto de Áurea, tanto pelo nobre metal da caneta usada por Sua Alteza para assinar o diploma legal quanto pela importância e alcance social de que a lei se revestia.

A repercussão imediata no Maranhão da lei mais célebre do Brasil é pouco conhecida, mormente magistralmente explorada na ficção por autores como, por exemplo, Josué Montello em “Os Tambores de São Luís” e “Noite sobre Alcântara” e Nascimento Moraes em “Vencidos e Degenerados”.

Um dos relatos históricos mais interessantes e ricos sobre a repercussão é o do memorialista Dunshee de Abranches. Em seu clássico “O Cativeiro”, o insuspeito historiador republicano, testemunha ocular da abolição, narra o entusiasmo dos maranhenses, sobretudo dos recém-libertos e dos líderes do movimento abolicionista. Eis um pequeno trecho da poética narração do velho Dunshee: “Durante três dias e três noites a população escrava e, com ela, o grupo abolicionista de São Luís não dormiram. As explosões ruidosas dos entusiasmos dos defensores impertérritos da grande causa, escrevia eu logo depois tentando apanhar para a História o flagrante dessa hora memorável, vinham juntar-se as expansões ruidosas da imensa massa dos libertos que, abandonando de chofre as casas dos senhores, se haviam lançado nas ruas em irreprimíveis e tumultuárias manifestações de júbilo.”

Na antiga Igreja de Nossa Senhora das Mercês, ao lado do convento homônimo ainda remanescente, foi celebrado no próprio 13 de maio, à noite, um festivo Te Deum, cerimônia litúrgica na qual é executado o canto solene de antigo hino latino de ação de graças a Deus. A cerimônia promovida pelos padres e alunos do então seminário menor do Maranhão que funcionava naquele antigo convento dos mercedários foi muito concorrida. Estavam presentes o Dr. Moreira Alves, Presidente da Província, Dom Antônio Cândido de Alvarenga, Bispo do Maranhão e muitas outras autoridades, além de grande número de pessoas das mais diversas classes. Pregou, entusiasticamente, o Cônego Francisco José Baptista destacando que aquele Te Deum solene em agradecimento a Deus pelo fim da escravidão tinha lugar, providencialmente, na Igreja da ordem fundada em 1218, por São Pedro Nolasco, para promover a libertação de cristãos que, no norte da África, caíam escravos nas mãos dos mulçumanos.

Houve, infelizmente, quem se opusesse à Lei, como alguns fazendeiros da Vila de São Luís Gonzaga, como noticiou a Pacotilha de 17 de maio. O Presidente da Província, ao tomar conhecimento do fato, através de telegrama vindo de Bacabal, destacou para aquela vila 10 praças do 5º Batalhão de Infantaria sob o comando do Alferes João de Lemos, nomeado no mesmo ato delegado de polícia para aquela localidade com o intuito de garantir o cumprimento da lei. Dentre os fazendeiros, à época chamados de lavradores, que resistiram à Lei Áurea, recolhemos do Jornal maranhense O Paiz de 18 de julho de 1888, os nomes de Victorino José Godinho, do Capitão João Jansen Pereira e do Tenente Coronel Júlio Máximo de Carvalho que no dia 10 de julho de 1888, reunidos na Câmara de São Luís Gonzaga, juntamente com vários outros ex-senhores de escravos, fizeram uma representação à Câmara dos Deputados pedindo indenização pela libertação de seus antigos cativos.

No dia 19 de maio, na Associação Comercial, foi realizada concorrida sessão solene dos empregados do comércio com a presença ilustre do Presidente da Província. Dentre os que usaram da palavra exaltando o 13 de Maio destacamos Hermenegildo Jansen Ferreira, presidente da Associação Comercial, Virgílio Cantanhede, Paula Duarte e Aristides Cunha. Logo após, uma passeata com participação de grande multidão que davam vivas à Regente e à extinção da escravidão desfilou pelas ruas da cidade.

As senhoras também promoveram uma passeata “em regozijo à lei que aboliu a escravidão no Império” conforme noticiou a Pacotilha do dia 21 de maio. Eram conduzidos estandartes com imagens da Regente, dos líderes do movimento abolicionista, como Joaquim Nabuco e os Conselheiros Dantas, João Alfredo e Vieira da Silva, este último, maranhense.

Foram promovidas outras importantes solenidades, como a da Câmara de Vereadores, em que discursaram o Vereador Manuel de Bettencourt e o jovem Dunshee de Abranches, orador oficial do Club Artístico Abolicionista Maranhense, a mais importante sociedade abolicionista do Maranhão, que promoveu no dia 28 de maio, no então Teatro São Luís, hoje, Arthur Azevedo, sua sessão solene em homenagem à Lei Áurea.

Friso que o abolicionismo e todos os personagens que nele tomaram parte, dentre os quais destacamos a Princesa Regente e o nosso conterrâneo Joaquim Serra, devem ser objeto de acurado estudo tendo em vista as questões que estão imbricadas no desfecho de todo esforço pela extinção da escravidão. l

*Pe. João Dias Rezende Filho é pesquisador e sócio efetivo do IHGM e do Instituto Cultural Dona Isabel I a Redentora, sediado em Brasília-DF.

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