Criminalidade

Bandidos ditam ordens em bairro de São Luís

Comunidades entregues à própria sorte com ausência da segurança pública que permite, inclusive, que criminosos imponham normas aos moradores e pena de morte a quem não lhes obedecer

Ismael Araújo

Atualizada em 11/10/2022 às 12h31
Bandido punido com tiro no pé por não obedecer rival
Bandido punido com tiro no pé por não obedecer rival

SÃO LUÍS - Os bandidos continuam a ditar as ordens nos bairros da capital maranhense, principalmente na zona rural. Muitos desses criminosos chegaram até mesmo a adotar pena de morte para aqueles moradores que roubam ou furtam em determinada comunidade. Há registro, inclusive, de vídeos circulando na rede social, principalmente no WhatsApp, de pessoas sendo baleadas no pé ou nas mãos como forma de penitência.

Veículos têm normas para circular no bairro Liberdade
Veículos têm normas para circular no bairro Liberdade

Essa onda de violência pode ser constatada no condomínio residencial Jackson Lago, que faz parte do Programa de Aceleração do Crescimento (PAC), no bairro Fé em Deus. Há uma mensagem com letras garrafas na parede de um dos apartamentos “...roubar na comunidade está sujeito a pena de morte”.

“Aqui quem rouba na comunidade a primeira vez leva um tiro no pé, mas na segunda, é morto. Não tem conversa. A pessoa de “língua grande” levar bala na batata da perna”, declarou uma moradores, que não se identificou com receio de sofrer algum tipo de represália.

Em outro condomínio do PAC, na Camboa, conhecido como Carandiru, predomina o medo e a insegurança. No muro da frente do prédio há uma mensagem informando que a “CV está voltando”. Também nas outras paredes as mensagens dizem que os “faccionados” (membros de facções) são fortes.

Nenhum dos moradores se dispôs a falar sobre a presença de facções criminosas no local, mas declararam que até o fim do ano passado a presença dos militares era mais intensa. Havia circulação de viaturas na localidade ou até mesmo permanência de grupos de policiais, inclusive do Batalhão do Choque, durante 24 horas.

Prisões

Em março do ano passado, a polícia realizou um cerco nesse local e conseguiu prender sete pessoas e apreender cinco menores que seriam integrantes de facções criminosas. Uma metralhadora de origem argentina, um revólver calibre 38 e duas pistolas, uma delas roubada da Polícia Civil de São Paulo, também foram apreendidos. No local, em um apartamento, foi encontrada uma fábrica clandestina de detergente líquido, com armazenamento de material com alto poder explosivo como botijão de gás irregular e 1.695 litros de hipoclorito de sódio.

Segundo a polícia, essa área é dominada por Valdirene Pereira, a Val, viúva do traficante Daniel Almeida dos Santos, o Danielzinho, e o homem conhecido como Leo Gordo. Danielzinho foi assassinado a tiros, no dia 15 de dezembro de 2016, no bairro do Renascença. Há informações de que o bando da Val chegou a expulsar várias famílias dessa localidade por não aceitarem as normas impostas pelos criminosos.

[fotolegenda]Ladrões são alertados: se roubar, podem ser mortos|

Na Liberdade, bairro localizado nas proximidades da Camboa, o cenário de violência continua reinando. Os moradores são obrigados a aceitar as “Leis” impostas pelos faccionados. Uma mensagem no muro de uma residência, na Rua Tomé de Souza, foi deixada pelos criminosos, informando que o motorista ao entrar na comunidade deve abaixar o vidro do seu veículo para a sua própria segurança. Na Ilhinha, por exemplo, os criminosos dizem que possuem liberdade e pedem a volta de seus comparsas para o bairro.

Briga de faccionados

Uma briga entre duas facções criminosas acabou instalando o clima de pânico na área da Vila Cascável. As paredes da sede da associação dos moradores do bairro, na Rua da Granja, são pichadas. As mensagens deixam bem clara a rivalidade entre dois grupos criminosos.

Uma das mensagens deixadas por esses bandidos é “...Rato 40 vai morrer”. É possível encontrar logo na entrada o aviso de que é proibido roubar na “quebrada” senão vai morrer. Na principal rua do bairro, os criminosos grafaram uma mensagem bem grande informando que os veículos devem o circular com os faróis em luz baixa.

No dia 16 de janeiro deste ano, Adalton Victor Viana, de 15 anos, foi morto a tiros dentro de sua residência na frente de seus familiares. A polícia informou que os bandidos haviam dado ordem para matar qualquer pessoa encontrada no canto de rua no período da noite ou na madrugada. Na noite anterior ao crime, o adolescente esteve no canto de sua rua, nas proximidades de sua residência. Na última quinta-feira, por exemplo, militares prenderam o foragido da Justiça Rubenilson Meireles Trindade, o Baixinho, de 30 anos, contra quem havia um mandado de prisão pelo crime de roubo majorado.

Terra do medo

Casas fechadas por ordem de bandidos na Vila Funil
Casas fechadas por ordem de bandidos na Vila Funil

“Aqui é a terra do medo” foi desta forma que uma da moradora da Vila Funil denominou o local onde mora. Ela também não se identificou com receio de sofrer de represália por parte de uma facção criminosa, que tem como base o estado do Rio de Janeiro. Esses criminosos são acusados comercializar drogas, extorquir moradores e praticar homicídios.

A maioria dos pontos comerciais está fechada, assim como os templos religiosos. Há várias casas com placas de venda ou de aluguel e ainda é possível encontrar imóveis pichados com mensagens deixadas pelos criminosos. A associação dos moradores está arrombada, cheia de lixo e o matagal toma conta da calçada. “Ninguém quis mais ser presidente da entidade com medo de ter o mesmo destino do ex-presidente, Almir Silva dos Santos”, desabafou um morador.

Almir Silva dos Santos, de 46 anos, foi assassinado a tiros em sua residência, nessa localidade no dia 8 de julho do ano passado. De acordo com as informações da polícia, esse crime foi motivado devido a vítima ter conseguido a construção de uma ponte que ligaria a Vila Funil ao bairro Tibirizinho.

Para os criminosos, essa ponte facilitaria a entrada de policiais na comunidade e dificultaria a realização de suas ações. Até hoje essa ponte está com a obra parada. No local há apenas as bases de concreto, o matagal tomando conta e uma vala, que segundo os moradores, serve de esconderijo para os criminosos.

Outras localidades

A polícia afirmou que ações criminosas como tráfico de droga e assassinatos, ocorridos na zona rural de São Luís, principalmente no bairro do Maracanã, estavam sendo ordenadas de dentro do Complexo Penitenciário de Pedrinhas. O principal mandante desses crimes era o presidiário e líder de facção criminosa, José Raimundo Maramaldo, o Duca ou Gegê.

José Maramaldo foi preso no dia 27 de dezembro de 2010, na capital, acusado de ter assassinado o vigilante José Lino Santos Matos, de 40 anos, no Residencial Magnólia, área do Maracanã. A polícia informou que ele e Alexandre de Azevedo Santos, o Alex, mataram o vigilante e ainda roubaram a quantia de R$ 2 mil.

O delegado Luciano Bastos informou que o delegado titular do 12º Distrito Policial, Luidi Conte, que estava investigando a onda de criminalidade na área, identificou a participação diretamente de Maramaldo e de Sidney Maramaldo Amorim, Darlison Sousa dos Santos e Jefferson Azevedo Vieira, que foram presos no último dia 24 nessa localidade por policiais do 12º Distrito e da Superintendência Estadual de Repressão ao Narcotráfico (Senarc). Na operação foram apreendidas cocaína, crack e maconha.

O clima de terror predomina também no Residencial da Vila Maranhão, área do Maracanã. No muro principal do bairro é possível encontrar frases escritas avisando aos assaltantes que se disponham a praticar crimes no bairro, que serão linchados.

Em outra área do Maracanã, no Residencial Amendoeira, há várias paredes de residências grafadas por bandidos deixando bem claro que a ordem é para matar. Na Vila Colier, segundo os moradores, também existe a presença desses criminosos ditando as ordens.

Tiroteio

Na última quarta-feira, os moradores denunciaram na Rádio Mirante AM a ocorrência de tiroteio diário no Bairro de Fátima. “Aqui não se pode mais ficar em uma praça devido os tiroteios”, desabafou um dos moradores.

Tiroteio, assalto e assassinatos voltaram a ter registro nessa comunidade. No último dia 11, o criminoso Antônio Carlos Mendonça Ferreira, de 18 anos, foi baleado na perna após assaltar uma mulher, na Rua do Peixe. Na noite do dia 8, Josiane Costa Maranhão, de 34 anos, foi morta a tiros dentro de uma casa de show, nas proximidades da Praça do Coxinho, naquele bairro.

No dia 14 ocorreu o assassinato de Felipe Sousa Silva, de 12 anos. Também no Bairro de Fátima ocorreram as mortes de Gerson Ribeiro Costa, de 16 anos, em fevereiro; Ely Marques Caracas, de 36 anos; Wallan Machado Costa, de 35 anos, e Jardson Carvalho Meireles, o Nenezinho, de 20 anos. Os três em janeiro deste ano.

Outro lado

A Secretaria de Segurança Pública do Maranhão (SSP-MA) informou por meio de nota que desenvolve ações preventivas e ostensivas interruptamente em todos bairros que compõem a zona rural de São Luís. No Maracanã houve uma redução de 63% no número de homicídios, lesão corporal seguida de morte e latrocínio, entre 2015 e 2017. Na Vila Colier, essa redução foi de 50%. Na Vila Funil foi registrado apenas um crime desta natureza em 2017.A SSP ressalta que desde 2015vem intensificando as ações de combate à criminalidade, com reforço do combate ao porte ilegal de armas, aumento do policiamento ostensivo e formação de 1.500 novos policiais.

Frase

“Aqui quem rouba na comunidade a primeira vez leva um tiro no pé, mas na segunda, é morto. Não tem conversa. A pessoa de “língua grande” levar bala na batata da perna”.

Moradora do condomínio do PAC, na Fé em Deus

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