Opinião

Galope à beira-mar de Sarney

Benedito Buzar

Atualizada em 11/10/2022 às 12h31
“Este livro, com o nome de Galope à Beira-Mar, foge à regra dos outros da lavra do escritor José Sarney. Se nos anteriores, ele se arrimava no romance, no conto e na crônica, para expressar o seu talento criativo, neste, sustenta-se na realidade factual”Benedito Buzar

Com mais de cinquenta anos de vida pública, José Sarney viveu, viu e acompanhou grande parte de atos, fatos, eventos, acontecimentos e episódios transcorridos neste país, sobretudo no Maranhão, Rio de Janeiro, Brasília e Amapá, espaços físicos nos quais teve atuação e brilhou como representante do povo, no exercício de cargos de deputado federal, governador senador, vice e presidente da República.

Ao longo desse tempo, ele, também, como ator e testemunha da cena política brasileira, teve o cuidado de guardar preciosos documentos históricos e de retê-los em sua privilegiada memória, para quando abandonasse a vida pública, aproveitasse aquele farto e primoroso material e o reunisse sob o formato de livro.

Este livro, com o nome de Galope à Beira-Mar, foge à regra dos outros da lavra do escritor José Sarney. Se nos anteriores, ele se arrimava no romance, no conto e na crônica, para expressar o seu talento criativo, neste, sustenta-se na realidade factual para mostrar, em pinceladas bem vivas, uma miríade de lances e desabafos, alguns pitorescos, outros curiosos, mas, todos interessantes, pois, protagonizados por figuras humanas de variados matizes políticos, partidários e ideológicos.

Eu tive o privilégio de ver este livro ainda na sua forma embrionária, quando Sarney começava a selecionar os casos, acasos e causos armazenados em sua memória. Ao lê-los, não tive nenhuma dúvida de que aquele material, depois de formatado e publicado, resultaria num sucesso editorial, pelo conteúdo do trabalho e pelo talento e sagacidade do autor, cuja arte de escrever está acima de qualquer cogitação intelectual.

Na sua recente vinda a São Luís, Sarney trouxe alguns exemplares do livro Galope à beira-mar. Um deles foi a mim oferecido com esta carinhosa dedicatória: “Ao querido e dedicado amigo Benedito Buzar, com a estima e o agradecimento pela sua constante assistência e minha admiração pela sua criatura, talento e competência, além das virtudes morais e intelectuais. ”

Para o leitor ter noção do conteúdo do livro de Sarney, transcrevo abaixo alguns casos registrados pelo autor, mas de maneira resumida.

Lacerda e Bahury

Na revolta de Aragarças, em 1955, foi sequestrado um avião da Panair, a bordo do qual estava o senador Remy Archer.

Na Câmara dos Deputados, o deputado Carlos Lacerda usa a tribuna para condenar o gesto golpista, cujo alvo era a deposição do presidente Juscelino Kubitscheck por um grupo de oficiais da Aeronáutica.

O deputado Miguel Bahury, por não acreditar na palavra de Lacerda, diz em aparte que se alguma coisa acontecesse a Remy Archer, ele seria responsabilizado criminalmente.

Retomando a palavra, Lacerda, retruca com violência: - Não sabia que Vossa Excelência era menino de recado. Como agora sei, exijo que o seu aparte seja retirado do meu discurso.

Vitorino e Professora

Um chefe político do interior do Maranhão pede ao senador Vitorino Freire um emprego para uma correligionária.

Vitorino diz que só podia arranjar para o cargo de professora. Mas ela não tem curso de professora, adiantou o chefe político.

Imediatamente Vitorino deu a solução para o caso. Mandou nomeá-la professora, mas, no dia seguinte, demitiu-a.

Jânio no Maranhão

Na campanha eleitoral de 1960, com vistas à sucessão presidencial, o candidato do PSD, marechal Henrique Lott disse em São Luís duas impropriedades, que o deixaram em má situação junto ao eleitorado: que no Maranhão não existia Faculdade de Direito e denominou o rio Itapecuru de Itapicuri.

No comício de Jânio Quadros, dias depois, orientado por José Sarney, o candidato da UDN elogiou os maranhenses por contarem com uma das melhores Faculdades de Direito do Brasil e ainda se deu ao luxo de citar corretamente os nomes dos principais rios do Maranhão.

Maroca e Rosa Castro

Maroca, a rainha do meretrício de São Luís, pediu audiência ao governador José Sarney. Sem maiores delongas, explicou o motivo de sua presença no Palácio: - Estou aqui para me queixar dos prejuízos causados pela professora Rosa Castro aos meus negócios. Ela abriu um curso noturno, em São Luís, com o qual não tenho condições de concorrer.

Chateaubriand em Pinheiro

No centenário da cidade de Pinheiro, o senador Assis Chateaubriand marcou presença, inclusive, como representante do presidente da República, Juscelino Kubitscheck.

Ao entrar na cidade, observou que as árvores estavam todas podadas e com os galhos cortados.

Revoltado com aquele crime contra a natureza, Chatô reprovou publicamente o ato do prefeito, que se defendeu assim: - Doutor, não fique preocupado, pois, no inverno, as árvores vão copular e ficarão todas bonitas.

Avô de Sarney

José Sarney tinha 22 anos quando se elegeu para a Academia Maranhense de Letras.

Nessa época, o seu avô, o nordestino Assuéro, que morava na cidade de Lima Campos, mandou comprar várias dúzias de foguete para comemorar a proeza do neto.

Uma vizinha de Assuéro quis saber o motivo daquela comemoração e o que era a Academia Maranhense de Letras. Sem pestanejar, respondeu: - Na verdade, não sei explicar, mas sei que é coisa grande.

Tancredo e a boneca de pano

No auge da tragédia vivida por Tancredo Neves, o vice, José Sarney, no exercício do cargo, é acordado, em plena madrugada, pelo ministro da Justiça, Fernando Lyra, que o comunica da descoberta, pela Polícia Federal, nos arredores de Brasília, de um trabalho de magia negra contra o presidente da República.

Segundo o ministro da Justiça, com a descoberta do despacho – uma boneca de pano cheia de alfinetes – a Polícia Federal, com o auxílio de um pai de santo, acabará o sofrimento de Tancredo Neves.

O comunista de Chateaubriand

Em 1965, na campanha eleitoral para o Governo do Estado, os vitorinistas pediram a Assis Chateaubriand para que o jornal de sua propriedade no Maranhão – O Imparcial – deixasse de dar cobertura política ao candidato das oposições, José Sarney, por ser comunista.

Em resposta aos governistas maranhenses, Chatô disse por que não poderia atendê-los: - No Brasil, todos têm um comunista pessoal e predileto. No Maranhão, o meu comunista é Sarney.”

Leia outras notícias em Imirante.com. Siga, também, o Imirante nas redes sociais Twitter, Instagram, TikTok e canal no Whatsapp. Curta nossa página no Facebook e Youtube. Envie informações à Redação do Portal por meio do Whatsapp pelo telefone (98) 99209-2383.