De "bico" a fonte de renda

Sorveteiros de São Luís vêm, em sua maioria, do interior do estado

Sonhando com melhor condição de vida, muitos maranhenses largam a vida em cidades do interior, colocam o caixote nos ombros e saem à caça dos clientes

Thiago Bastos / O Estado

Atualizada em 11/10/2022 às 12h33

[e-s001]Quem é sorveteiro não o é somente por “amor à função e à profissão”. Muitos desses homens - de seu Batata, figura conhecida da Magalhães de Almeida e já falecido, a Haroldo - exercem a função na capital maranhense, sem descanso nem feriado. E são, em sua maioria, de cidades do interior do estado.

Seu Djalma ou - conforme o registro de nascimento - Djalma dos Santos Costa é natural do município maranhense de Bequimão (MA) e está há 18 anos na capital, São Luís, vendendo o sorvete “puro de coco”, como ele mesmo define seu produto. Ele circula diariamente pelas ruas Afonso Pena, da Palma e dos Afogados, sempre oferecendo a delícia gelada. “Eu já vendi para criança e para adulto, para a pessoa simples e para gente engravatada. Não falta para ninguém nosso sorvete!”, disse.

Ele negocia o sorvete a R$ 3,00. Se levar dois, sai pelo preço módico de R$ 5,00. “Quem manda é o freguês!”, exclamou o vendedor, que era lavrador no interior maranhense, e passou a ganhar mais dinheiro assim que virou sorveteiro. “Desde que passei a vender sorvete na capital, comecei a ganhar mais dinheiro”, confirmou.

[e-s001]Já Magno Pinheiro Araújo é de São Bento (MA) e era mototaxista. Há alguns anos, veio para São Luís por uma oferta de “bico” como sorveteiro. E desde então não saiu mais da cidade. “Está enganado quem pensa que a gente não ganha mais dinheiro”, disse. Ao contrário dos pregoeiros de antigamente, tanto seu Djalma quanto Magno não têm grito para chamar cliente. "Depois de um certo tempo, a gente nem precisa mais gritar. O cliente espera na hora em que a gente vai passar e compra seu sorvete na nossa mão”, garantiu seu Djalma.

“Quantos?”
Um dos sorveteiros de caixote mais conhecidos da cidade é o “Quantos?”, denominado assim pela forma como aborda os seus clientes, sempre perguntando “quantos” sorvetes cada um quer. Além da forma particular de tratamento dos apreciadores de seu sorvete, “Quantos” também é cantador de toadas e de marchinhas de Carnaval.

Filho de seu “Paulo de Buchiné” e dono do barracão Bate-Papo do município maranhense de São João Batista, seu
“Quantos” tinha dois pontos comuns de comercialização de seu produto: o campus da UFMA em São Luís, nas dependências em especial da Área de Vivência e do entorno da Biblioteca Central da instituição.

E ainda a Praia Grande, nas proximidades da Casa das Tulhas. Atualmente, seu “Quantos” está enfrentando um problema de saúde e, até o fechamento desta edição, tentava restabelecer seu bem-estar físico para voltar à ativa.

[e-s001]Características dos vendedores
Enquanto nos anos de origem do ofício os sorvetes eram feitos artesanalmente, hoje os sorveteiros - em sua maioria - adquirem o produto no atacado e o revendem, em especial na região central da cidade. No bairro Desterro, tradicionalíssimo em São Luís, mais especificamente na Travessa da Lapa, O Estado encontrou histórias de quem ganha a vida vendendo o sorvete artesanal.

Uma das fábricas mais conhecidas é a de seu Gervásio, cujo ofício foi aprendido com o pai. “Eu sou daqui mesmo de São Luís, mas meu pai é da baixada e aprendeu por lá a fazer coco”, disse durante a produção de uma remessa de sorvete, em plena tarde de sexta-feira gorda de Carnaval.

Os cocos de seu Gervásio vêm de Guimarães (MA) e, segundo o dono deles, apresentam vantagens em comparação com os cocos da capital. “Eles [os cocos] do interior têm mais carne e a parte comestível é mais macia. Ou seja, um coco do interior rende praticamente dois da capital”, disse.

Após ralar o coco no ralador, cujo motor foi adaptado de um ar-condicionado, a chamada polpa vai para a panela, misturada a outros ingredientes, como açúcar refinado. No total, a produção de uma bacia de sorvete, levada pelos sorveteiros nos caixotes, dura cerca de uma hora (incluindo o tempo de geladeira). “O que a gente produz é o que a gente vende no dia. Não fica, graças a Deus, nada para o dia seguinte”, garantiu seu Gervásio.

SAIBA MAIS

Apreciadores

[e-s001]Desde os mais jovens aos mais experientes, o sorvete caseiro transportado de forma peculiar é apreciado por quem já o provou ao menos uma vez na vida, seja após aquela pelada na rua entre amigos ou apenas no intervalo do serviço, para minimizar o forte calor da “Cidade dos Azulejos” na maioria do ano. O Estado registrou o consumo da iguaria, em especial no Centro, região em que o produto costuma ser mais consumido pela concentração maior de vendedores.
Em um dia comum na Rua Afonso Pena (ao lado do antigo Ferro de Engomar), mesmo com o clima tendendo mais à chuva do que ao sol, a pequena Ana Clara, de apenas quatro anos, não resistiu e, assim que viu o vendedor (sorveteiro) carregando o famoso caixote, pediu para o pai dela comprar a delícia. “Pai, compra pra mim!”, bradou a jovem. Sem ter como resistir, foi o jeito o pai tirar dois reais da carteira para dar ao sorveteiro, que estava com a caixa térmica praticamente vazia, demonstrando sucesso nas vendas do dia. “Estou muito feliz!”, disse a menina após algumas lambidas no sorvete.
O pai dela, Agnaldo Diniz, morador do Desterro, disse que se criou no Centro Histórico degustando várias vezes o sorvete, em especial o de coco. “Tem aquele sabor caseiro que somente aqui em São Luís a gente encontra. Não tem como não gostar”, disse.

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