Artigo

Os riscos toxicológicos dos alimentos

Atualizada em 11/10/2022 às 12h33

As regras de comércio internacional são cada vez mais restritivas em relação à segurança dos alimentos. Considera-se um alimento seguro quando a presença de contaminantes físicos, químicos ou biológicos situa-se abaixo dos limites fixados em lei. Um limite pode ser a ausência total, se assim determinar a legislação.

O agronegócio brasileiro necessita adaptar-se com rapidez a este novo ambiente mercadológico, porque esta não é apenas uma exigência dos países importadores, ela também está presente no mercado doméstico.

Existem diversas ações destinadas a monitorar a segurança dos alimentos no Brasil. Em dezembro de 2011, a ANVISA divulgou o resultado das análises de resíduos de agrotóxicos, realizadas em 2.488 amostras de frutas e hortaliças, como parte do Programa de Análise de Resíduos de Agrotóxicos em Alimentos (PARA). Foi verificado que 1,6% das amostras apresentavam limites de resíduos acima do permitido pelas normas brasileiras. Os resultados do PARA permitem reflexões sobre a segurança dos alimentos produzidos no Brasil.

Embora não sejam os únicos, três dos principais parâmetros da Ciência da Toxicologia envolvidos na temática de inocuidade química dos alimentos são: 1) Dose Letal 50 (DL50) – dose que mata 50% das cobaias em testes científicos; 2) Limite máximo de resíduos (LMR) - quantidade máxima de agrotóxico legalmente aceita no alimento; 3) Ingestão Diária Aceitável (IDA) – quantidade máxima do agrotóxico que, ingerida diariamente, durante toda a vida, não oferece risco à saúde, à luz dos conhecimentos científicos atuais. Portanto, uma amostra enquadra-se ou não nas disposições legais do país. Por oportuno, no caso do PARA, 1,6% das amostras ultrapassaram o LMR legalmente estabelecido no Brasil.

Parâmetros - Como se estabelece a IDA? Em testes científicos, doses crescentes são administradas a cobaias. Para os cálculos de segurança, considera-se a maior dose que não causou alterações metabólicas perceptíveis, nos organismos em teste. Estabelecida esta dose, ela é dividida pelo fator 100, ou seja, a IDA representa apenas 1% da dose que não causou qualquer problema de saúde em cobaias, nos experimentos científicos. Normalmente a dose que não causou qualquer problema toxicológico equivale a 1-10% da dose que ocasionou alguma alteração. Logo, a IDA representa 0,1-0,01% da dose que poderia, eventualmente, ocasionar algum problema de ordem toxicológica. A lógica de dividir por 100 a dose que não causou qualquer problema objetiva garantir a proteção dos consumidores de alimentos de qualquer risco toxicológico.

Como se estabelece o LMR? É o valor máximo de resíduo de agrotóxico admitido legalmente em um alimento, considerando a aplicação adequada de uma substância química (seguindo todas as Boas Práticas Agronômicas), desde sua produção até o consumo. Levando em consideração a IDA, o LMR não oferece risco à saúde, à luz dos conhecimentos atuais, mesmo se esta dose for ingerida diariamente, durante toda a vida.

Como exemplo ilustrativo, suponhamos um agrotóxico aplicado em maçã, que tenha uma DL50 de 500mg/kg de peso vivo (seja moderadamente tóxico, de acordo com a Portaria Nº 3 de 16/1/92 da Secretaria Nacional de Vigilância Sanitária do Ministério da Saúde), e que o limite máximo de resíduo (LMR) seja de 0,05 mg/kg de maçã. Para que houvesse 50% de probabilidade de intoxicação de uma população de peso médio de 70 kg, seria necessário ingerir 35.000 mg/pessoa (70kg x 500 mg/kg). Supondo que todas as maçãs tivessem o resíduo máximo de 0,05 mg/kg (50 ppb), cada pessoa, pesando 70kg, deverá consumir 700 toneladas de maçã (35.000 mg ÷ 0,05 mg/kg). Se esta população ingerir apenas maçãs, à razão de 2 kg/pessoa/dia, seriam necessários quase 1.000 anos para atingir a dose que, teoricamente, poderia conferir 50% de probabilidade de esta pessoa ser afetada pelo agrotóxico. Lembrando que, após poucos dias, o organismo se encarrega de eliminar a quase totalidade deste resíduo.

Decio Luiz Gazzoni

Membro do Conselho Científico Agro Sustentável (CCAS), angenheiro agrônomo e pesquisador da Embrapa Soja

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