Movimento

Prostitutas cobram direitos em Encontro Nacional na capital

No encontro, que ocorre até este sábado, elas relatam preconceito e mostram que estão dispostas a lutar por seus direitos e debater temas polêmicos

Robert Willian / O Estado

- Atualizada em 11/10/2022 às 12h35

SÃO LUÍS - Para quem convive de perto, a vida das mulheres profissionais do sexo de fácil não tem nada. Elas relatam que enfrentam preconceito até mesmo na hora de um simples atendimento médico, mas estão dispostas a lutar por seus direitos e também entram no debate de temas polêmicos, como o combate à violência e à prostituição infantil. E é o que estão fazendo no 6º Encontro Nacional das Prostitutas, realizado pela Rede Brasileira de Prostitutas (RBP) até este sábado, 23, no Convento das Mercês.

Profissionais do sexo de todo o Brasil estão reunidas em busca de seus direitos e em comemoração ao “movimento das putas”, organizado há mais de 30 anos. Um dos principais pontos destacados pela classe é a regulamentação da profissão. Há, segundo a organização do encontro, um grande problema na aceitação dessa atuação. Ainda segundo representantes da Rede, a luta se dá também pelo fato de que, além de serem profissionais do sexo, serem, sobretudo, mulheres.

O movimento realizado na capital maranhense contou com uma série de entidades da sociedade civil organizada que estão apoiando a busca por esses direitos. Raiane Reis, acadêmica em Psicologia que esteve no evento, disse como esse tipo de iniciativa se reflete na sociedade. “Acho que a principal questão é a conscientização da população de que elas (as prostitutas) são profissionais como qualquer outro. Muitas, inclusive, escolhem esse ramo de trabalho para sustentarem suas famílias e até mesmo pagar seus estudos, buscando formação para atuarem em outra profissão. Precisamos entender e dar o respeito necessário a essas pessoas”, finalizou a estudante.

Alguns passos estão sendo dados nesse sentido. A Rede Global de Projetos de Trabalho Sexual, entidade internacional de representatividade, reúne hoje mais de 200 entidades de prostitutas de 71 países em prol da regulamentação da atividade e de seu entorno, hoje criminalizado em boa parte do mundo.

Preconceito
Um dos temas tratados no evento foi a dificuldade que as prostitutas encontram em simples afazeres do dia a dia, pelo preconceito que enfrentam. Isso se aplica, segundo algumas participantes do encontro, até quando elas precisam fazer algo como um tratamento médico.

Maria de Jesus Almeida Costa, coordenadora da RBP no Nordeste e presidente da Associação das Profissionais do Sexo do Maranhão (Aposma), fez relatos sobre o problema. “É uma complicação imensa quando precisamos, sobretudo, fazer algum tratamento de saúde. É em busca de atenção que estamos lutando”, disse.

Ela assinalou que elas precisam cuidar da saúde e que não podem ser excluídas. “O preconceito é tão grande que, às vezes, muitos médicos e atendentes do próprio Sistema Único de Saúde (SUS) esquecem que precisamos cuidar da nossa saúde, do nosso corpo, que precisamos de cuidados porque somos cidadãs”, disse Maria de Jesus Almeida Costa.

Violência
A violência contra prostitutas no Brasil está crescendo e grande parte dos agressores são jovens de classe média. Um dos casos de repercussão nacional envolveu o ator Rômulo Arantes Neto. Acusado de agressão e roubo por uma garota de programa no Rio de Janeiro, ele negou o crime.

Outro caso que causou grande comoção nacional aconteceu no estado de São Paulo em 2007, quando um jovem de 24 anos foi preso sob suspeita de atear fogo a uma garota de programa em São José dos Campos, a 91 km da Capital. A vítima, de acordo com a polícia, teve queimaduras de 1º e 2º graus do joelho para baixo.


Prostituição
O tema da prostituição infantil é constantemente debatido entre as organizadoras dos movimentos de profissionais do sexo em todo Brasil. No Maranhão, por exemplo, a Aprosma atua no sentido de buscar os representantes legais pela asseguração de direitos de crianças que entram no mundo da prostituição.

Maria de Jesus Costa, presidente da Aprosma, disse sobre como agem. “Não apenas denunciamos quando há uma adolescente se prostituindo, isso porque não sabemos os motivos pelo qual elas estão fazendo isso, não sabemos os problemas que ela enfrenta na família e na vida. Assim, procuramos sempre as instituições competentes para ajudar e apoiar essas garotas”, frisou.

Já Luelen Gemelli, que é vice-presidente da União Brasileira de Mulheres, assinalou outro forma de tratar o problema. “Não costumo usar o termo ‘prostituição infantil’, porque prostituta é uma pessoa maior de idade. Quanto às crianças e adolescentes, nós consideramos como exploração infantil, e é com isso em mente que atuamos nas bases para evitar esses casos.

E complementou: “Como nossa profissão não é regulamentada, reconhecida, esse tipo de abuso contra as crianças é muito difícil de ser combatido, pois, a profissão das prostitutas maiores de idade também é criminalizada. Acredito que regulamentando nossa profissão seja mais prático, não fácil, agirmos para suprimir essas ações”.

Prostituição LGBT

A recente divulgação da decisão liminar que determinou mudanças na forma como o Conselho Federal de Psicologia deve interpretar a resolução nº 001/1999 – que traz as regras sobre o atendimento a homossexuais e proíbe a oferta de tratamentos de reorientação sexual – que ficou conhecido como 'cura gay', gerou desconforto também no movimento das prostitutas.

Representantes do RPB repudiaram a medida, levando em consideração que muitos gays, lésbicas, travestis e transexuais também são prostitutos. Durante o encontro realizado na capital maranhense, esse tema foi de amplo debate entre as organizações presentes, que contou com apoio das entidades LBBTs que participaram do evento.

SAIBA MAIS

O movimento

O movimento Brasileiro de Prostitutas já realizou outros cinco Encontros Nacionais, além de uma diversidade de eventos da categoria em âmbitos regionais e locais e até mesmo internacionais. O primeiro encontro foi realizado no Rio de Janeiro em julho de 1987.

Em 2017, o movimento completa 30 anos e a fundação da RBP, que é considerada por elas um importante marco das lutas da categoria. São Luís foi a primeira cidade no Nordeste a ter movimento de referência nacional na trajetória de luta das prostitutas.

Neste ano, o encontro homenageou uma das fundadoras RPB, Gabriela Leite. Para a homenagem, participou do evento a co-fundadora da entidade, Lourdes Barreto que conversou com O Estado e destacou a importância da participação do movimento nas discussões políticas e sociais do Brasil.

Segundo Lourdes Barreto, que hoje tem 76 anos e é uma das coordenadoras do movimento nacionalmente e de uma entidade no Pará, as participantes do movimento estão em constante participação nesses debates.

“Nós temos uma participação nos debates regionais e nacionais. Nosso movimento já lutou para criação de conselhos municipais da mulher, de proteção à criança e adolescentes, bem como de repúdio a atitudes de governos que apresentem medidas que são consideradas como retrocesso para as prostitutas que, assim de tudo, são mulheres”, disse.

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