Editorial

Futuro possível x ausência de futuro definitiva

A mínima possibilidade de cura – ou apenas de tratamento – já é algo a que se agarrar. Quem pode culpá-los?

Atualizada em 11/10/2022 às 12h37

O bebê britânico Charlie Gard chamou a atenção do mundo nas últimas semanas. O caso do bebê, que sofre de miopatia mitocondrial, uma síndrome genética raríssima e incurável que provoca a perda da força muscular e danos cerebrais, atraiu atenção internacional depois que a Corte Europeia de Direitos Humanos (CEDH) apoiou a decisão de instâncias inferiores no Reino Unido e determinou que os aparelhos que mantêm Charlie vivo deveriam ser desligados, mesmo contra a vontade de seus pais.

O caso ganhou um novo capítulo ontem, desta vez mais triste. O casal Chris Gard e Connie Yates retirou seu apelo às autoridades judiciais britânicas, pois os exames mostram que o dano sofrido pela criança enquanto aguardava a decisão é irreversível. Os pais do bebê britânico vão discutir com o Great Ormond Street Hospital como e quando as máquinas que mantêm a criança viva serão desligadas.

As discursões em torno do caso ganharam as grandes manchetes e envolveram muita gente. O papa Francisco fez apelos sobre o caso, e o presidente dos EUA, Donald Trump, chegou a afirmar que seu país ficaria feliz em ajudar Charlie e sua família.

Questões religiosas à parte, ninguém pode culpar ou criticar um casal de pais por tentar. Mesmo que a ciência diga que não existe garantia de cura e que o tratamento seja apenas experimental não se tem como remover a esperança de um pai, que a única coisa que quer é garantir mesmo que em condições adversas a vida do filho.

O assunto é polêmico, pois envolve muito mais do que dados médicos. A mãe do pequeno Charlie Gard disse no tribunal que ele poderia ter tido uma vida normal, caso o tratamento tivesse sido autorizado antes. Mesmo assim, médicos afirmam que há poucas perspectivas de tratamento para a enfermidade.

Quem é pai ou mãe sabe que as decisões não são tomadas apenas baseadas em variáveis e estimativas. A mínima possibilidade de cura – ou apenas de tratamento – já é algo a que se agarrar. Quem pode culpá-los? Como não saber que algo extraordinário pode acontecer?

A briga judicial acabou levantando outras questões. Principalmente com o pedido direto do papa Francisco, as discussões passaram a ser se era moralmente certo desligar os aparelhos do bebê. Com pessoas apresentando argumentos para todos os lados. No caso de Charlie Gard, a escolha parece ser entre um futuro possível e uma ausência de futuro definitiva.

De acordo com um médico americano que se propôs a tratar Charlie Gard, existia uma chance de cerca de 10% de o tratamento ter sucesso. Número relativamente baixo, mas que não pode ser ignorado.
Fé na cura ou a certeza das estatísticas? Não há como saber mais se o tratamento daria certo, pois os danos tornaram-se irreversíveis para o pequeno. E tão efêmera como a vida será a discussão. Que ficará de lado até que outra situação parecida volte a acontecer.

O físico teórico alemão Albert Einstein, que entre seus principais trabalhos desenvolveu a teoria da relatividade geral, ao lado da mecânica quântica um dos dois pilares da física moderna, disse certa vez que “existem apenas duas maneiras de ver a vida. Uma é pensar que não existem milagres e a outra é que tudo é um milagre”.

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