Editorial

Corrente do bem

A vida de labuta de seu Chico não é muito diferente de tantas outras na capital maranhense

Atualizada em 11/10/2022 às 12h37

Uma campanha iniciada por uma jornalista no Facebook viralizou esta semana e tornou “famosa” uma figura popular no cenário de São Luís. No texto, Jacqueline Heluy, jornalista da Assembleia Legislativa do Maranhão, contava quem era seu Chico, um “simpático vendedor de suco de laranja instalado no semáforo do Renascença, próximo ao Hospital Carlos Macieira. Ele trabalha de domingo a domingo e também nos feriados, com um diferencial: um largo sorriso no rosto que nos contagia e ilumina o dia”.

Longe de apenas apresentar o simpático senhor, a jornalista chamava atenção para o fato de que ele, que há 18 anos vende suco de laranja no Renascença e que se orgulha de ter criado os 12 filhos e de sustentar a família com o ofício, estava triste porque sentia dores no estômago e precisava fazer um exame que custa em média R$ 200, os quais não tinha.

Na postagem na rede social, a jornalista sugeria uma corrente do bem: “Se cada pessoa que passar esta semana no semáforo do Renascença comprar três garrafas de suco, no próximo sábado Francisco já terá o dinheiro para pagar o exame”.

Solidárias ao apelo, muitas pessoas compartilharam o texto pelo Facebook, WhatsApp e outras redes sociais. Outros fizeram mais ainda: aderiram à campanha e compraram o suco do vendedor, que terminou mais cedo seu expediente na última semana, dada a grande procura por pessoas dispostas a ajudar.

Mas quem é seu Francisco Sena Rosa? Aos 71 anos, ele mora no bairro da Liberdade e, antes que retorne ao seu local de trabalho e, talvez, também ao anonimato de quem se torna invisível na rotina alheia, o A gente conta desta edição fala mais sobre ele. A vida de labuta do senhor não é muito diferente de tantas outras na capital maranhense.

Pobre, trabalha todos os dias no retorno próximo ao Hospital Carlos Macieira. Permanece no semáforo das 6h às 17h. Segundo a postagem da jornalista, “sua presença compõe a paisagem urbana, misturando-se aos veículos, prédios comerciais e residenciais”. Por isso, tal como uma estátua, ele costuma ser ignorado, com exceção dos clientes e das pessoas mais sensíveis.

Por trás desse ato de solidariedade da jornalista e de toda a movimentação em prol de ajudar seu Chico, se esconde uma triste realidade: a da população que não tem condições de ter um plano de saúde privado e precisa enfrentar filas para ater acesso à saúde pública – muitas vezes, a estrutura precária incorre até na ausência do serviço ou de profissionais de determinadas áreas.

Mais triste é ver políticos e candidatos a cargos públicos posando com seu Chico, usando a situação para se perfazer politicamente e ganhar uns votos a mais posando de bom samaritano, dispostos a dar uma solução a um problema que sequer deveria existir – falamos aqui do acesso dificultado à saúde pública.

Seu Chico fez seu exame, acompanhado de uma caravana de pessoas de órgãos públicos, jornalistas, todos interessados em que a história terminasse bem. Afinal, os holofotes todos estavam voltados para este assunto.

Assim como seu Chico, milhares de pessoas aguardam atendimento de saúde – para não falar de outras áreas. Será que essas mesmas pessoas que posaram em fotos com largos sorrisos e tão boa vontade vão aos Socorrões e filas de marcação de consulta para ajudar?

Leia outras notícias em Imirante.com. Siga, também, o Imirante nas redes sociais Twitter, Instagram, TikTok e canal no Whatsapp. Curta nossa página no Facebook e Youtube. Envie informações à Redação do Portal por meio do Whatsapp pelo telefone (98) 99209-2383.